28 DE OUTUBRO DE 1992 141
É por isso que o PS não se resigna com as estatísticas do emprego/desemprego, aparentes indicadores positivos que escondem a qualidade do emprego e do equipamento instalado, factores que também são determinantes para que tenhamos os mais elevados índices de sinistralidade da Europa.
Frederico Edelman, escrevia, há dias, no Le Monde um interessante artigo sobre a imagem das empresas de ponta francesas, segundo ele verdadeiros monumentos à realização humana assinados pelos melhores arquitectos do mundo - refere a IBM e a Bull -, e destaca a sede do Canal Plus, um edifício magnífico sobre o Sena, que classifica de «Diamante na Noite» e no plano estético, pela sua ousadia, elegância e até insolência, compara-o a um Picasso ou a um Matisse.
Fez-me reflectir no caso português - e também temos bons arquitectos, como é sabido -, onde as empresas industriais são, regra geral, espartanas e pobres, com raras excepções de novo-riquismo, curiosamente nos sectores de mais baixos salários; assiste-se ao crescimento de opulentos monstros de betão das grandes superfícies de distribuição; alguns estabelecimentos comerciais começam a modernizar fachadas e vitrinas. Todavia, nos bastidores, as condições de trabalho tocam os limites da decência. Mas verdadeiramente indecentes são os locais de trabalho e as condições dos empreiteiros e sub-empreiteiros de empreiteiros, que, em autênticos tugúrios, fabricam subprodutos e componentes, fazem manutenção e prestam serviços indiferenciados, garantindo a funcionalidade das maiores empresas a menores custos.
É significativo que, em Portugal, só os bancos ergam as catedrais do século XXI, se multipliquem, se ampliem, proliferem, se imponham e esmaguem. São símbolos não do engenho humano mas de poder e pretendem transmitir segurança e prosperidade à custa do endividamento do sector produtivo.
Nas últimas décadas, 90 %, das empresas portuguesas mudaram pouco, em matéria de ergonomia do posto de trabalho; degrada-se a relação entre o habitat e a empresa e muitos acidentes ocorrem em trânsito para o trabalho; piora a situação ambiental e ecológica em consequência da escassez de instalação de tecnologias não poluentes.
O Ano Europeu contribuiu muito para o despertar da sociedade portuguesa para as suas carências e realidades, tornando também mais evidentes a incapacidade do Governo para animar parceiros sociais, técnicos e universidades, no sentido de dar corpo aos acordos estabelecidos, cujo balanço farei sucintamente: constituição do instituto tripartido de higiene e segurança, até 31 de Dezembro de 1991 - esta é uma questão central, sem a qual o acordo é letra-morta, que aguarda melhores dias orçamentais; a Lei Quadro n.º 44l/91 carece de regulamentação, mas, sem a existência do instituto, mesmo regulamentada, não terá eficácia, avolumar-se-ão os conflitos e os desencantos. As propostas em debate no CPCS são inaceitáveis, não correspondendo à filosofia do acordo.
Em matéria de reparação do acidente e de doença profissional, tudo está por fazer: nova tabela de incapacidades; lista actualizada de doenças profissionais; quadro regulamentar adequado à evolução da ciência e da tecnologia; revisão da fórmula de cálculo das pensões, por incapacidade ou invalidez, em consequência de acidente ou de doença profissional, que, nos termos estritos do acordo - pasme-se! -, pretendia a equiparação ao regime geral da segurança social.
O Governo devia tomar para si a responsabilidade exemplar de implementar na função pública o normativo que publicou, mas usou o álibi das situações de excepção, devidas à segurança do Estado, para nada fazer.
O Ministério do Emprego e da Segurança Social e a Inspecção-Geral do Trabalho procuraram cumprir com os indicadores estatísticos, que, esperamos, sejam fiáveis, mas que são já contraditórios com os registos hospitalares, dos tribunais e das seguradoras.
O relatório do 2.º trimestre de 1992 da Inspecção-Geral do Trabalho é revelador do dramatismo e da incapacidade da administração do trabalho controlar a situação. Apesar dos escassos recursos humanos, constata-se um aumento significativo das visitas às empresas e um acréscimo de relatórios e pareceres. Factores culturais e o medo inibem sindicatos e trabalhadores de apresentar queixas, mas verdadeiramente desencorajador é o facto de o valor médio dos autos ser de 14 790$.
As infracções mais frequentes são ao nível primário: 42,6% de falta de seguro; 27% de falta de comunicação
do acidente; 14,5% de incumprimento da regulamentação;8%, de falta de material de protecção e 3% de relatório médico.
No mesmo período, apenas três meses, no Porto e em Setúbal registaram-se seis acidentes mortais; em Lisboa e em Braga, cinco, e em Leiria, quatro. Se tivermos em conta a proporcionalidade da população activa, Braga, Setúbal e particularmente Leiria carecem de medidas especiais e urgentes.
Permitam-me que foque o caso de Leiria. Os inspectores efectuaram 108 visitas; detectaram 2853 contratos a prazo - o mais elevado número do País -, o dobro de Lisboa e mas 1000 que no Porto; foram levantados apenas sete autos; em matéria de higiene e segurança, as visitas foram zero, as queixas zero e os autos zero.
A primeira investigação da Fundação Dublim sobre ambiente de trabalho fornece-nos elementos interessantes de reflexão: 25% dos trabalhadores manuais europeus e 33% dos trabalhadores agrícolas queixam-se de posições cansativas e dolorosas. Em Portugal, estas percentagens duplicam.
Portugal e a Itália são os países em que os trabalhadores mais se queixam de falta de ferramentas e equipamentos adequados.
Os trabalhadores portugueses, os da antiga RDA e os de Espanha são os mais incapazes de mudar ou escolher as suas tarefas, funções e métodos de trabalho.
Nas grandes empresas, os constrangimentos físicos são menores que os organizacionais e a jornada de trabalho é mais curta, mas, sujeitos a maiores ritmos e pressões, os ciclos de tarefas repetitivas são mais comuns.
Nas pequenas empresas, os constrangimentos são físicos, com muitos problemas musculares, ósseos, intoxicações, riscos de acidentes graves, mais frequentes devido a deficiente concepção do local de trabalho, manipulação de cargas e produtos perigosos e menor protecção e vigilância médica.
Entre países, há uma clara divisão Norte/Sul em matéria de condições de trabalho, concluindo-se que, mesmo que os países eliminassem as barreiras de estrutura económica, subsistiriam problemas culturais relacionados com as políticas empresariais, os parceiros sociais e as autoridades públicas, que só um grande esforço de formação pode atenuar.
Os investigadores caracterizam três grupos de países. No primeiro incluem-se a Bélgica, a Dinamarca, a Alemanha,