406 I SÉRIE - NÚMERO 14
dente do PSD - e esse é um problema que vos preocupa. Ele responde perante o povo, perante o País, não responde sequer perante esta Assembleia e, muito menos, perante o vosso Congresso ou perante o presidente do vosso partido.
Não fiz qualquer confusão, pois o artigo 114.º da Constituição da República Portuguesa - leia-o, Sr. Deputado - diz que os órgãos de soberania devem observar a separação e a interdependência estabelecidas na Constituição. Ora, falei de partilha de responsabilidade, é esse o princípio constitucional.
Quanto ao jogo da sueca, esse problema não é nosso mas sim do PSD, é um problema da Maia, é um problema do Porto. O que entendemos é que os senhores não propõem uma reflexão séria e que, maus uma vez, criam factos políticos artificiais para desviar a atenção dos problemas reais, do oásis que está a esfumar-se. Aliás, quando os senhores falam nessas questões institucionais não o fazem no sentido de aperfeiçoar o funcionamento das instituições democráticas, mas sim no de reforçar a concentração de poderes. Isso é o discurso do arcaísmo!
Aliás - e essa é uma contradição curiosa -, no momento em que se verifica a universalização dos princípios democráticos há uma crise de credibilidade nas instituições e no funcionamento da democracia, e isso acontece mesmo em certos países ocidentais. Dir-se-ia que a democracia está doente da sua própria vitória, doente da dificuldade de se criarem alternativas.
Ora, o discurso da modernidade é aquele que aponta para uma renovação e revitalização da democracia, para uma reaproximação das instituições com os cidadãos e com os eleitores, para o reforço da participação democrática e também para o reforço dos órgãos de controlo e de fiscalização.
Sr. Deputado, é esse o discurso da modernidade, aquele que separa as águas. No entanto, no Congresso do PSD foi feito um discurso velho, arcaico, caduco, conservador, com um pendor que aponta não para a tal separação, não para a tal partilha, não para a participação, mas sim para a concentração de poderes, para o primado de um partido, para o primado do Governo e para o primado de um só homem. Ora esse é um discurso arcaico, é o discurso do passado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção politica, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Peixoto.
O Sr. Luís Peixoto (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A demissão do Prof. Machado Caetano da Comissão Nacional de Luta contra a Sida foi a gota de água que faltava para que se tomasse evidente o cariz economicista da política do Ministério da Saúde.
Ainda não decorreram 15 dias desde que o PCP, em declaração política, nesta Assembleia, denunciou as medidas anti-sociais que se preparam no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e já a gravidade das factos relacionados com o Ministério da Saúde e a luta contra a sida impõem que, novamente, se volte ao tema.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solução de qualquer mistério segue-se, ern geral, à acumulação de factos/provas e à reconstrução do acontecimento, criando um quadro coerente de elementos aparentemente não relacionados. Não é que, para o PCP e para a grande maioria dos portugueses, constitua um mistério o mecanismo complexo que o Ministério da Saúde usa para impor ao País a sua política de saúde, baseada numa economia de pretenso sucesso que, nesta área, tem conduzido a profundas injustiças de carácter social, mas porque convém não deixar passar em claro tal política. Quem cala consente.
Foi alegando razões hipócritas que o Ministério da Saúde pretendeu, há um ano, racionar a administração de hormona de crescimento a crianças dele necessitadas em hospitais portugueses. Foi enjeitando factos cientificamente comprovados que pretendeu manter a administração de algumas vacinas do Plano Nacional de Vacinação, quando o próprio fabricante reconheceu existirem problemas no produto fabricado. Alegou má gestão para justificar a indisponibilidade de eritropoetina nalguns centros de hemodiálise, para administrar a insuficientes renais. Pretendeu, agora, limitar os critérios de administração de AZT a doentes imunodeprimidos, baseando-se, exclusivamente, em critérios económicos.
Não é inovadora esta política do PSD, que, já no caso do alerta para a necessidade de aplicar um plano nacional de prevenção da hepatite B, desviou a atenção da opinião pública para conspirações diabólicas de empresas multinacionais, às quais, aliás, se prepara para fazer a entrega da saúde dos Portugueses. Ao problema disse nada, como aliás vem fazendo em relação a um outro facto que contribui, decididamente, para o esclarecimento de toda esta encenação, que com ela se relaciona directamente e cuja dimensão ainda não é conhecida na sua totalidade. O Governo/PSD importou derivados de sangue que não foram previamente despistados nem aquecidos contra a sida. Quando foi alertado para o facto, não os despejou directamente no lixo e continuou a introduzi-los nas veias de hemofílicos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O investimento tinha sido grande e os dinheiros públicos, dizem, não são para desperdiçar. Embora resultando em consequências diferentes, todos os casos descritos têm um factor comum: resultam da mesma política economicista, fria, desumanizada, a política «laranja» de que tanto se fala e com a qual nem todos conseguem coabitar.
Foi essa política que conduziu à demissão do Prof. Machado Caetano, responsável máximo pela Comissão Nacional de Luta contra a Sida. Não quis esse técnico de saúde manter-se à frente de mais uma obra de fachada. Assim, acusou o Ministério da Saúde de factos graves que, até hoje, continuam a não ser desmentidos com coerência, o que confirma a cumplicidade do Ministro da Saúde em mais este escândalo. Disse que não eram desbloqueadas as verbas necessárias para fazer funcionar a Comissão, dando exemplo o caso do Projecto Piloto de Prevenção da Sida para os Toxicodependentes de Coimbra, que nunca avançou, e discordou do encerramento da Linha Sida. Isto para referir só as questões mais conhecidas e que merecem resposta da Administração, através da voz da responsável da ARS de Lisboa, que, pasme-se-e passo a citar -, disse: «A dinâmica do Prof. Machado Caetano fazia que ele pensasse hoje uma coisa e quisesse a coisa feita amanhã. Mas a função pública não se compadece com isso.»
Relativamente às outras questões justificou-se dizendo que, em Coimbra, o Projecto Piloto não avançou por falta de duas assinaturas, que a Linha Sida encerrou apenas temporariamente, acrescentando - e cito novamente - que «a Comissão tem de começar a adaptar-se à realidade da função pública». É com esta naturalidade que a responsável da ARS de Lisboa encara tais factos.