950 I SÉRIE - NÚMERO 25
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na época em que se fala na «crise da representação» ou da «crise do Parlamento» e na altura em que, em Portugal, existe alguma ansiedade sobre o tema, os Deputados não podem queixar-se de que as modificações das regras sobre o seu estatuto e sobre o funcionamento do Parlamento sejam analisadas com especial rigor.
Após um longo e bem publicitado trabalho sobre a chamada «reforma do Parlamento», que teria por objectivo a dignificação da Assembleia da República, do Estatuto dos seus Deputados, a reabilitação do instituto de inquérito, que caíra em quase total descrédito, e a aclaração, com modificações substantivas, do exercício do direito de petição, sobem, hoje, a uma rápida e quase simbólica discussão no Plenário - com a óbvia alegação de que tudo foi minuciosamente tratado na comissão criada para o efeito- um lote de diplomas que, embora formalmente se apresentem como textos que mereceram consenso entre todos os partidos presentes neste Hemiciclo, em bom rigor não passam de uma operação de cosmética empreendida com sucesso pela maioria social-democrata, acompanhada, como vem sendo hábito em certas alturas, pelo maior partido da oposição - o Partido Socialista; o mesmo Partido Socialista que deixou ficar pelo caminho algumas das propostas que o Sr. Deputado Jaime Gama entendia tão indispensáveis que por elas chegou mesmo, sem sucesso, como é conhecido, a pôr em causa a revisão constitucional mínima para efeitos de ratificação do Tratado de Maastricht.
Matérias como a regulamentação do direito, agora consagrado na Constituição, de o Parlamento ser previamente informado da actuação do Governo na esfera da construção da União Europeia, as normas sobre o regime das imunidades e incompatibilidades, a declaração dos interesses dos Deputados, a modificação da própria legislação sobre a declaração de riqueza e rendimentos dos titulares de cargos políticos não viram ainda desta vez a luz do dia. A questão, hoje candente, sobre a revisão do regime de subsídios vitalícios e de reintegração após o termo das funções de Deputado, cuja iniciativa foi tomada pelo CDS, ficará, assim, a aguardar uma nova fase de revisão. Outro tanto sucede com a revisão da Lei Orgânica da Assembleia e com o estatuto do pessoal administrativo desta Casa, para apenas indicar as lacunas mais importantes.
As modificações que hoje vão aqui ser votadas não representam mais que algumas adaptações do Regimento às sempre crescentes preocupações de hegemonia da maioria e, em particular, de hegemonizar o Parlamento. Algumas introduções de matéria nova quanto aos poderes do Governo, que são aumentados, quanto à sua presença no Hemiciclo, mesmo que facultativa, não têm contrapartida nas competências das oposições, ficando tudo na mesma quanto à própria aplicação dessas normas, que ficam dependentes do exclusivo critério da maioria parlamentar.
Mesmo os institutos, que por todo lado são considerados em primeira linha como armas da oposição contra os abusos e ilegalidades do Governo ou as formas de fiscalização política dos membros do Executivo e dos actos da Administração ficam, em Portugal, na dependência do favor da maioria. No próprio caso do inquérito parlamentar, é a maioria que comanda o seu andamento, lhe fixa os contornos substantivos e adjectivos, o que impede o princípio de livre descoberta dos elementos probatórios por parte de qualquer membro da comissão, limita os espaços de investigação, deixando para o seu exclusivo juízo a conclusão final. De pouco valerá contra isto dizer que o debate do relatório final ocorre no Plenário, sabendo-se que a decisão de realizá-lo e o tempo de intervenção da oposição dependem do voto da maioria. Ao fim e ao cabo, o poder governamental é fiscalizado politicamente pelo poder parlamentar da maioria - e sempre o anverso e reverso da mesma moeda cunhada pelo Governo.
Quanto ao magno problema, que no princípio pareceu dividir o PSD e os restantes partidos da oposição, sobre a frequência da realização de sessões plenárias, verifica-se que, após conversas de bastidores, o partido interessado em reduzi-las levou a melhor, com a aquiescência do Partido Socialista, pois é claro e líquido que a fixação na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares dos tempos de Plenário está sujeita aos humores da maioria.
Quanto ao Estatuto dos Deputados, verifica-se que cada Deputado pode suspender o seu mandato por mais de um terço do tempo da legislatura e, se souber coadunar as férias parlamentares com as suspensões, é-lhe possível estar apenas presente durante a metade do tempo por que foi eleito. Se se juntar a esta circunstância a generosidade do elenco das causas de justificação das faltas - lembro as dificuldades de transportes, a objecção de consciência, «a vida e interesses dos Deputados» e o apoio dado ao Deputado-estudante -, o absentismo justificado (passe a expressão) é a fonte maior do laxismo no exercício das funções de Deputado eleito pelo povo para, em permanência, representar e defender os seus interesses.
O artigo 12.º do projecto de lei n.º 55/VI, que estabelece as condições de exercício da função de Deputado, mantém intacto o problema várias vezes levantado pelas oposições. O n.º 4 impõe o dever aos serviços da administração central de facultarem aos Deputados os elementos e as informações, mas permanece sem resposta a questão de saber se o agente da Administração deve estar munido de prévia autorização do seu ministro ou, mesmo, se o Deputado, antes de se dirigir ao agente administrativo, deve informar o membro do Governo respectivo.
Quanto à indemnização por danos previstos no artigo 12.º-A, não se prevê o direito de regresso do Estado contra o autor da ofensa. Se houvesse lugar a este regresso, não se fixaria este montante sem a intervenção do Ministério Público e do princípio do contraditório e da defesa do eventual ofensor.
Felizmente, à última hora, o regime do protocolo previsto no artigo 21.º-A, já objecto de longa discussão, foi substituído, mas as propostas denotavam uma atracção pelo bipartidarismo que esforçadamente os dois maiores partidos procuram introduzir no nosso sistema político.
Quanto aos agendamentos, a maioria e o Governo passam a somar 81 iniciativas a seu favor, contra 19 dadas a todas as oposições, não se fazendo qualquer distinção entre partidos que têm um Deputado eleito e um grupo parlamentar com mais membros.
Finalmente, quanto às petições, além de a Assembleia da República funcionar em muitos casos como uma simples caixa do correio, o novo procedimento diminui os poderes da Assembleia, pois, nos casos em que o Parlamento não tem competência para lhes dar seguimento, a solução normal seria o seu arquivamento, com a comunicação ao peticionário das razões da incompetência material. Por outro lado, a diligência conciliadora, que parece