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1956 - I SÉRIE - NÚMERO 59

por ela proposta. Os juízes não podem ignorar os objectivos sociais colectivos, nem renunciar à sua responsabilidade de decidir tendo-os em conta.
A única porta que verdadeiramente se abre à legitimação democrática da sua função é a do diálogo com os órgãos de soberania eleitos.
E isto mesmo aceitou a Constituição da República no seu artigo 220.º, ao estruturar o Conselho Superior da Magistratura como um órgão constitucional autónomo, cuja função principal é a disciplina e a gestão da magistratura dos tribunais judiciais. A sua composição garante, de facto, a autonomia dos juízes, por isso toma-os independentes do Governo e da Administração, mas atenua igualmente a ausência de legitimidade democrática, ao envolver os órgãos directamente eleitos, o Presidente da República e a Assembleia da República, na sua composição.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei hoje em discussão, cujo objectivo é o de alterar as normas que regem o Estatuto dos Tribunais Judiciais, tem presente os temas levantados e assume a obrigação legislativa de articular os propósitos de diálogo e acompanhamento do exercício da função judicial.
Para além de regras cuja finalidade é promover a dignificação dos magistrados, por via de um melhor acesso à formação, do estímulo ao mérito e ao reforço da dignidade no exercício das funções, ela contém outras relativas ao Conselho Superior da Magistratura que merecem reflexão particular.
A primeira respeita ao processo de designação dos magistrados que o integram. Afastando o sistema até agora vigente de lista única, opta-se por uma forma eleitoral que viabiliza uma ligação mais estreita entre representados e representantes, uma vez que é mais forte o «cordão umbilical» entre os eleitores e os eleitos e bem assim a representação da interioridade deste orgão de soberania a quem compete gerir os interesses do Estado.
Contrariamente a tese que tem sido defendida, é entendimento do meu grupo parlamentar que esta nova regra não enferma de inconstitucionalidade. O Conselho Superior da Magistratura é um órgão constitucional, mas excluído do acervo dos órgãos políticos, pelo que se nos afiguram destituídas de sentido as teses que sustentam a aplicabilidade dos princípios do sufrágio universal referidos nos artigos 10.º e 117.º da Constituição da República Portuguesa.
Em segundo lugar, a aplicação do princípio da eleição proporcional, que o artigo 220.º de facto reclama.
Verifica-se esta, com toda a segurança, no que à eleição dos juízes e dos desembargadores se refere. O ponto complexo é saber se a designação uninominal, a de um único conselheiro pelos seus pares, se integra igualmente no espírito da proporcionalidade.
A doutrina dos sistemas eleitorais não é unívoca a esse respeito. É certo que a diminuição de qualquer circunscrição desfavorece os objectivos da representação proporcional, mas é também verdade ter já sido sustentada a tese de que a própria eleição por maioria relativa consubstancia uma eleição proporcional se for uninominal a circunscrição- afirmam-nos autores tão insuspeitos como Wildenmann ou Kaltenfleiter e inclina-se nesse sentido o meu grupo parlamentar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Diz-se que a decisão judicial é silogística e o inverso da decisão salomónica. Mas, em situações limite, diz-se isto cada vez menos! Bertold Brecht legitimou a justiça salomónica num texto de beleza e significado ímpares. Tratou-se da história da criança abandonada pela mãe natural e devolvida à mulher que a criou quando, deixando de lado o processo jurídico positivo e olhando o caso de um ponto de vista estritamente humano, reconheceu-se que era esta outra a que mais a amava e protegia.
O juiz que assim procede não abandona a sua posição de autoridade. E, mim Estado de direito, nem tão-pouco abandona os autênticos critérios jurídicos: limita-se a impregná-los de princípios de justiça e equidade.
O ponto está, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em que assim possa agir sem desvirtuar o sentido democrático da decisão judicial.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, utilizando tempo cedido pelo PSD.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de referir um ponto, com alguma dificuldade é certo, porque estes novos inspiradores em direito eleitoral do PSD - nomeadamente, o Kaltenfleiter, que não conhecia - entendem que a eleição por maioria relativa cumpre o princípio da proporcionalidade, mas, enfim.
Bom, suponho que a Sr.ª Deputada e o Kaltenfleiter vão ficar isolados nesta matéria, sendo certo que ele não pode vir aqui apoiá-la e portanto a senhora não vai ter grande sorte neste domínio...
Sr.ª Deputada, gostaria que esclarecesse o problema da lista única. Sei que V. Ex.ª falou dela querendo referir-se aos três estratos profissionais...

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Claro!

O Orador:... - mas a existência da lista única pode criar nos ouvintes a ideia de que o actual sistema é de uma só lista, o que não é verdade. Por isso, convinha que V. Ex.ª esclarecesse perante a Câmara o que quer dizer quando fala em sistema de lista única e em substituir este sistema, porque esta palavra tem conotações que podem levar as pessoas a pensar de forma negativa.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.
A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, em primeiro lugar, gostaria de dizer-lhe que fiquei sensibilizadíssima com a questão que me colocou, sobretudo com a forma como o fez e, mais ainda do que qualquer outra coisa, com o acompanhamento extremamente honroso relativamente à doutrina alemã de que me fiz acompanhar nesta matéria.
Devo dizer-lhe que não tenho qualquer dificuldade em assumir que o ponto é seguramente duvidoso, e nós assumimo-lo enquanto tal. Agora o que também gostaria de dizer é que assumimos esse ponto como duvidoso, mas não damos por apolítico que isto tenha de ser de outra forma, ao contrário daquilo que os senhores fizeram.