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4 DE JUNHO DE 1993 2511

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, cada vez que V. Ex.ª vem aqui - e cada vem mais- e à medida que vou ouvindo os seus discursos, eles lembram-me uma caixa de música vienense, daquelas que tocam valsas. E porquê, Sr. Ministro da Justiça?
Em primeiro lugar, porque sabemos de antemão o que vão tocar, que é o que acontece com os seus discursos.
Em segundo lugar, porque soam a falso - querem ser uma orquestra, mas aquilo, no fundo, são umas rodas de aço que rodam por umas cremalheiras...
Em terceiro lugar, porque, passado um pouco, elas têm sobre o nosso sistema nervoso uma acção que não sei se será tonificante ou não, mas que nos faz embalar e quase dormir.

O Sr. Duarte Lima (PSD). - Porque não dançam?!

O Orador: - Ora bem, vou dizer a V. Ex.ª por que é que o seu discurso me lembra isto.
Quando V. Ex.ª aqui vem, a gente já sabe o que vai dizer: que o seu discurso é um discurso de Estado, que é preciso um grande consenso à volta destas questões, que o Governo tem uma atitude coerente, segura, etc., e que a oposição, na qual mete a Ordem dos Advogados, o Conselho Superior da Magistratura, as representações sindicais da magistratura judicial, da magistratura do Ministério Público e do Procurador-Geral da República - tudo dentro desse saco - são inseguros, andam de um lado para o outro, dizem falácias, deslocam o debate, etc.

O Sr. José Magalhães (PS): - Péssimo estilo!

O Orador: - Mas sobre esta capa vai dizendo que é preciso um grande consenso. Mas à volta de quê? De V. Ex.ª, claro está! Não é da oposição nem das outras representações que cá vieram iniciar o debate, Sr. Ministro da Justiça. Porque o que V. Ex.ª veio cá hoje fazer não foi iniciar qualquer debate, mas terminá-lo, o que é diferente. V. Ex.ª e o Governo foram ultrapassados pelo debate profundo e sério que se fez na sociedade portuguesa sobre esta matéria.
É certo que V. Ex.ª recuou em muitas coisas, veio explicar muitas coisas, mas hoje vem aqui com pezinhos de lã - desculpe-me a expressão -, com uma proposta de lei, e já não com aquela arrogância com que veio num dia de grande acompanhamento, de grande e luzido séquito - estará V. Ex.ª recordado, nada mais nada menos do que o Sr. Primeiro-Ministro -, pedir uma autorização legislativa.
V. Ex.ª vem terminar o debate. O debate está em grande parte feito e ainda bem que foi feito.
Sr. Ministro da Justiça por outro lado, tudo isto soa um pouco a falso. V. Ex.ª vem aqui fazer um discurso sobre o Estado de direito, a democracia representativa, digamos, tudo coisas que ao fim do primeiro ano de qualquer faculdade de direito, privada ou pública, qualquer pessoa já sabe.
Com efeito, escusa de vir para aqui ensinar-nos essas coisas com o ar pretensamente catedrático - desculpe que lhe diga - porque nós sabemo-las... Isso é um dado assente, Sr. Ministro da Justiça.

Protestos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Calma!

O Orador: - V. Ex.ª tem de ter isso como um dado assente entre nós, sob pena de não poder vir fazer apelos ao consenso, ao grande consenso de Estado, começando por dar-nos uma lição sobre o que é o Estado de direito, os mecanismos da democracia representativa como devem funcionar os tribunais, etc.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Às vezes esquecem-se!

O Orador: - Nós sabemos isso, Sr. Ministro da Justiça! V. Ex.ª não pode esquecer que sabemos.
É a partir daí que poderemos discutir as questões de fundo - e que já discutimos - por esta legislação que vem aqui apresentar.
Portanto, mais do que um pedido de esclarecimentos, o que faço é um protesto, pelo tipo de intervenções que V. Ex.ª vem fazendo nesta Casa - desculpe que lhe diga - e que não são, de modo algum, propiciadoras do consenso de Estado que tanto apregoa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, uma vez que fez um protesto e não um pedido de esclarecimento, respondo-lhe de imediato e depois agruparei os outros pedidos de esclarecimento.
V. Ex.ª atribuiu-me a natureza de caixa de música vienense. Isso é discutível! O que é indiscutível é que V. Ex.ª não tem ouvido para a música!
Risos e aplausos do PSD.
Portanto, V. Ex.ª corre o risco de comprar, estereotipadamente, as caixas de música e depois não se dá conta de que, de facto, o ritmo é outro, a partitura é diferente e a execução nada tem a ver com aquilo que V. Ex.ª pensava comprar!
Repare, Sr. Deputado, efectivamente, muitas vezes, nesta Casa, tive ocasião de falar em posições de Estado, muitas vezes também tive ocasião de falar em consenso, mas, curiosamente, hoje não falei nem numa nem noutra. V. Ex.ª não me ouviu ou, então, ouviu-me mal e dançou valsa diferente daquela que eu interpretava.
Por outro lado, também terá, apressadamente, passado as folhas da partitura e terá concluído que acumulei, no mesmo espaço, a oposição politicamente legitimada como tal e o conjunto de outros órgãos legítimos, embora não legitimados como oposição política no sentido formal do termo.
Sr. Deputado, cindi os dois grupos não para retirar legitimidade - e disse-o expressamente. Por isso mesmo, desta vez tomei a liberdade de escrever o que ia dizer, exactamente para que possa ficar como documento comprovativo daquilo que afirmo depois aquilo que disse anteriormente.
Não discuto a legitimidade da intervenção desses outros órgãos. Eu próprio tenho dialogado e discutido largas vezes com eles. O que me parece claro é que o debate político à volta deste diploma escapou, por responsabilidade de todos nós e minha também, do espaço político privilegiado para o debate político institucional. Foi exclusivamente isto que eu disse, e não coisa diferente, ou seja, que viesse a acopular à oposição estes outros órgãos.