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12 DE MAIO DE 1994 2309

Sr. Deputado. Há, a esse respeito, uma questão que não podemos iludir: o Sr. Secretário de Estado, o Sr. Subsecretário de Estado, o Sr. Primeiro-Ministro ou quem quiser pode, obviamente, vir à Tribuna dizer que tudo isto se resolve rapidamente e que os arquivos estão abertos à consulta pública de investigadores e outras pessoas. É evidente que, como disse na intervenção, afirmações desse género não passarão de declarações de princípio vazias, se entretanto o Governo não assegurar os meios técnicos para o tratamento desses arquivos.
Recordo a V. Ex.ª que os arquivos de que estamos a falar se encontram na Torre do Tombo desde 1992. Até Março do corrente ano, estiveram três técnicos a trabalhar nesses arquivos. Para V. Ex.ª ter uma noção do que isto significa, dir-lhe-ei que um técnico, trabalhando intensamente, trata entre 100 a 150 metros de arquivos por ano. Se considerarmos que os arquivos em causa são compostos por três quilómetros de documentos, a que acrescem 85 metros quadrados de material contido em arquivos metálicos, poderá V. Ex.ª fazer as contas e imaginar os anos que seriam necessários a que os arquivos ficassem disponíveis para uma consulta pública em devidas condições.
É verdade que entretanto, desde Março, essa equipa foi reforçada, existindo actualmente três técnicos e sete tarefeiros. Mas, se não houver um investimento sério em meios técnicos e financeiros no tratamento desses arquivos, é evidente que nos próximos 10 anos eles não estarão devidamente inventariados e catalogados e não existirão as listas descritivas necessárias e tudo aquilo que será necessário a que os investigadores - e não só - os possam consultar.
Há, pois, uma necessidade não só de um investimento a nível técnico e financeiro mas também de um investimento de carácter político.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive já oportunidade de explicar, no longo pedido de esclarecimento que formulei, o que a minha bancada entende sobre o crux deste problema.
Entendemos que a actual lei satisfaz plenamente as exigências dos investigadores e que a iniciativa do PS nasce, como acabou de ser explicado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, da má interpretação que o Sr. Director da Torre do Tombo faz de uma certa disposição, relativa ao decurso do tempo para abrir o arquivo. Ele próprio aceitou já que essa era uma interpretação perversa e que está disposto a aceitar uma interpretação nova.
Quanto à questão dos dados, vemos o problema da consulta de dados sobre as pessoas, quando não haja interesse legítimo e directo nessa consulta, de uma forma preocupante, por entendermos que arquivos deste tipo devem estar sujeitos a um controlo rigoroso e não devem prestar-se a que, a partir daí, se tirem conclusões ou as vidas das pessoas sejam vasculhadas por uma investigação que directamente não lhes diga respeito.
Há uma omissão, a este respeito, no projecto do PS, na medida em que não salvaguarda esse interesse directo e legítimo na consulta de determinados documentos que digam directamente respeito às pessoas, embora se trate de um aspecto que poderá ser limado em sede de especialidade.
Mas o problema fundamental mantém-se. Realmente não vemos necessidade de uma lei interpretativa, como V. Ex.ª acabou de a classificar, em face da lei actual, porque o que desta consta já chega. Não interessa fazer interpretações através do poder legislativo da Assembleia da República, porque tais interpretações podem ter, naturalmente, o mesmo destino da lei interpretada.
Assim sendo, não poderemos, para já, votar globalmente a favor da presente iniciativa.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, o projecto de lei apresentado tem duas vertentes. A primeira é aquela a que aludiu exclusivamente e a segunda a que diz respeito às medidas de preservação da memória histórica da luta contra a ditadura.
O artigo que elenca essas medidas não foi objecto de apreciação pelo Sr. Deputado, que parece não dar qualquer importância a essa matéria, o que me deixa relativamente perplexo, porque contaria com o seu apoio para, designadamente, a aprovação desse artigo.
Quanto à necessidade das medidas de clarificação, creio que parte de uma filosofia que é terrível do ponto de vista da própria concepção do que seja a lei. Diz V. Ex.ª que a lei se arrisca a ser subvertida e mal interpretada e que, assim, o melhor é não o fazer. Depois, algo contraditoriamente, diz que, além disso, a lei não é necessária, porque a lei actual já é excelente. No seu entendimento, o que sucede é que há um crânio na qual ela não penetra; não façamos, então, outra, porque, se essa já não penetra, a segunda também não penetrará, o que dá do legislador uma verdadeira perspectiva de martelo.
Creio que há uma função clanficatória a fazer neste domínio. Repare o Sr. Deputado em que a lei dos arquivos históricos - que o Director da Torre do Tombo invoca maí - tem um artigo verdadeiramente pantagruélico, no qual se diz, quanto ao acesso, o seguinte, que é praticamente intragável: «Não são comunicáveis os documentos que contenham dados pessoais de carácter judicial, policial ou clínico, bem como os que contenham dados pessoais que não sejam públicos ou o de qualquer índole que possa afectar a segurança das pessoas, a sua honra ou a intimidade da sua vida privada e familiar e a sua própria imagem, salvo se os dados pessoais puderem ser expurgados do documento que os contém, sem perigo de falsa identificação, se houver consentimento unânime dos titulares dos interesses legítimos a salvaguardar, ou desde que decorridos 50 anos sobre a data da morte da pessoa a que respeitam os documentos, ou, não sendo essa data conhecida, decorridos 75 anos sobre a data dos documentos». Desde logo, Sr. Deputado, isto não é português.
Em segundo lugar, o que está certo neste preceito - como, por exemplo, os princípios de que deve haver acesso se houver possibilidade de expurgo, de que deve haver acesso se houver autorização, de que deve haver acesso 50 anos após a morte da pessoa a que respeitam os documentos, mesmo independentemente de autorização, e de que, na dúvida, deve haver um prazo geral, tudo isto constituindo regras razoáveis face ao Direito Comparado - está mal expresso. Mais: esta é a