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4 DE NOVEMBRO DE 1994 239

em termos de língua, todos desejamos construir por esse mundo fora.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado José Eduardo Reis, que foi aquela que trouxe aqui mais elementos de contestação, direi, para começar, o quanto subscrevo a normalidade que aqui referiu no processo eleitoral. Aliás, a amizade pessoal que mantenho com o líder do partido mais votado da oposição não me impediu de reconhecer, na altura e desde logo, essa normalidade.
Se querem que vos diga, Sr. Presidente e Srs. Deputados, foi com um misto de orgulho e de prazer que descobrimos que é possível em países que não tinham qualquer vivência democrática saber que aí a democracia é possível, ganhando os que tiveram o poder durante 20 anos, sendo contestados politicamente, atacados, mas que, após o processo eleitoral, todos estavam de acordo em dar as mãos no sentido de um maior empenhamento no futuro da Guiné-Bissau, por forma a verem cumpridas as ambições de todos os guineenses.
Uma única nota, Sr. Deputado José Eduardo Reis, relativamente ao que disse sobre a política do Governo português não ser a mais desejada e sobre a influência francesa.
Recordo à Câmara que a Guiné-Bissau é uma «ilha» num imenso mar de francofonia. É, pois, difícil resistir a isto! No entanto, entre tantas questões, quero realçar o esforço feito por Portugal em lançar a televisão experimental da Guiné-Bissau, atendendo aos montantes envolvidos nessa operação.
Recordo também a possibilidade de, conforme foi solicitado pelo Parlamento da Guiné-Bissau, o Parlamento português vir a responder afirmativamente - e faço um apelo a todas as bancadas para que em conferência dos representantes dos grupos parlamentares este assunto seja decidido rapidamente - e ajudar materialmente a formação de técnicos e apoiar o funcionamento do plenário do Parlamento da Guiné-Bissau.
Por último, Sr. Deputado José Eduardo Reis, apesar de a França ser um imenso país, uma das grandes potências do mundo e de Portugal ser aquilo que nós, com muito orgulho mas, apesar de tudo, com muitas limitações, sabemos que é, a cooperação portuguesa na Guiné-Bissau, ê três vezes superior à cooperação francesa. Há outros países cooperantes, mas Portugal está a fazer um grande esforço, pelo que não será por aí que poderemos atacar a política de cooperação. De qualquer forma, o que é importante reter - e sublinhá-lo-ia - é a normalidade com que decorreu o processo eleitoral na Guiné-Bissau e a amizade do povo guineense para com Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem com a discussão da proposta de resolução n.º 70/VI - Aprova, para adesão, as Emendas ao artigo 17 º e ao artigo 18.º da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Para fazer a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tem a palavra o Sr. Deputado António Maria Pereira.

O Sr. António Maria Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de resolução que ora se submete a aprovação desta Assembleia diz respeito a certas e limitadas emendas aos artigos 17.º e 18.º da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, já ratificada por Portugal, tendo como objectivo que as despesas do Comité contra a Tortura, nela previstas, passem a ser custeadas pelas Nações Unidas, em vez de pelos Estados membros.
Este Comité contra a Tortura é o órgão dinamizador da Convenção. É constituído por 10 peritos, eleitos pelos Estados partes e compete-lhe desempenhar, sobretudo, duas ordens de funções: por um lado, examinar os relatórios que os Estados membros da Convenção se comprometem a remeter ao Secretário-Geral das Nações Unidas, todos os quatro anos, sobre as medidas por eles tomadas no sentido de abolirem a tortura nos seus territórios; por outro lado, examinar quaisquer queixas que lhe cheguem sobre a prática da tortura, desencadeando, se for caso disso, processos de inquérito contra os Estados responsáveis.
O objectivo destas emendas é o de evitar atrasos e obstáculos aos inquéritos e outras diligências, resultantes de certos Estados membros, objecto de denúncia da prática de tortura, poderem ser tentados a dificultar este trabalho através do não pagamento dos custos respectivos. Uma vez que, após aprovação das emendas agora propostas, essas despesas passam a ficar a cargo das Nações Unidas, esse risco é anulado, na medida em que o pagamento destes custos fica assegurado. Para além desse resultado concreto, as emendas agora propostas revelam que as Nações Unidas continuam empenhadas em reforçar a eficácia dos instrumentos de combate à tortura.
A tortura sempre existiu ao longo dos séculos e, tal como a escravatura, era pacificamente considerada um meio normal para se conseguirem designados objectivos, nomeadamente políticos ou mesmo religiosos. A Inquisição utilizou-a em larga escala em Portugal e Espanha. A tortura era, numa palavra, um dado cultural adquirido.
O verdadeiro combate contra a tortura só foi iniciado já nos tempos modernos, no século das Luzes, por homens generosos e cultos, entre os quais cumpre destacar o vulto grandioso de Voltaire - cujo tricentenário do nascimento se comemora este ano - e conduziu, finalmente, à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da Revolução Francesa, em que expressamente se declarou que a tortura era abolida «para sempre».
Muito embora este objectivo idealista nunca se tivesse concretizado e aqui e acolá a tortura continuasse a ser utilizada, o certo é que, no decurso do século XIX, a tortura foi efectivamente proscrita e punida como crime nas legislações dos países europeus. O século XIX foi, quanto à tortura, um século abolicionista.
No século XX, com o advento dos regimes totalitários, a tortura voltou a ser utilizada em larga escala, designadamente como método para alcançar resultados políticos, o que significa que houve um retrocesso nítido em relação às concepções generosas do século precedente. Os campos de concentração e os fornos crematórios nazis, tal como os goulags e as clínicas psiquiátricas soviéticas, são o paradigma dessa utilização de tortura em larga escala como método para atingir objectivos políticos.
Após a última guerra, chegou-se a uma situação paradoxal: por um lado, atingiu-se um fortíssimo consenso, praticamente universal, quanto à inadmissibilidade da tortura, do que é índice a proclamação, em 1948, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que formalmente proíbe a