330 I SÉRIE-NÚMERO 10
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Debater as alterações orçamentais de 1994 que o Governo nos apresenta não pode deixar de nos obrigar a um exercício que, seguramente, não agrada ao PSD: é o regresso ao debate orçamental realizado há cerca de um ano, conferindo o que foi então dito pelo Governo e pelo PSD, designadamente no que se refere às projecções macroeconómicas.
O PCP formulou, então, quatro acusações: Orçamento inadequadamente restritivo face à situação recessiva com nefastas consequências sociais, designadamente no aumento do desemprego; Orçamento que, ao contrário da propaganda do Governo sobre os efeitos das alterações do IRS, se iria traduzir na diminuição do rendimento real disponível das famílias; Orçamento que reincidia no sacrifício da educação; Orçamento sem credibilidade no que respeitava ao cenário macroeconomia) que apresentava.
O então Ministro das Finanças e o PSD barafustaram, disseram que não era verdade, acusaram-nos de repetir críticas sem fundamento. Afinal, o PCP "fez bingo", Srs. Deputados, como iremos demonstrar.
Orçamento de crescimento do produto a uma taxa acima da média comunitária, de desagravamento fiscal, de diminuição da evasão fiscal, gritava o agora Deputado Braga de Macedo; Orçamento de crescimento do investimento em 15 % a valores reais, afirmava dolentemente o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território; Orçamento que defende o emprego e que combate o desemprego, prometia solenemente o Dr. Silva Peneda.
Afinal, pelo segundo ano consecutivo, o crescimento do produto, em Portugal, na melhor das hipóteses, será inferior, em cerca de metade, ao da média comunitária; aumentou o peso das receitas fiscais no PIB e diminuiu o rendimento real disponível das famílias; o valor das dívidas ao fisco e à segurança social terá crescido para qualquer coisa como 1000 milhões de contos, o que contradiz a propalada eficiência da máquina fiscal, de que há pouco o Sr. Ministro aqui falava; o crescimento real do investimento, também ele não cresceu os 15 % reais mas, sim e tão-somente, 5 %, isto é, 1/3 do que o Governo insistia, até à exaustão, no debate de Novembro de 1993.
Quanto ao emprego, Srs. Deputados, o panorama aí está a desmentir as promessas e as projecções do Governo: de Janeiro a Setembro deste ano, o número de desempregados inscritos oficialmente aumentou em mais de 25 000. E, mesmo considerando exclusivamente os dados do INE (que tem os condicionamentos que todos conhecemos), comparemos a taxa de desemprego de 5,6 % anunciada no debate do Orçamento do Estado para 1994, pelo Ministro Silva Peneda, com os 6,7 % no final do 1.º semestre deste ano ou com os 6.8 %, salvo erro, no final do terceiro trimestre.
O Sr. Rei Carp (PSD): - Ou com os 10 % do Engenheiro António Guterres!..
O Orador: - Bem podemos dizer, Srs. Deputados, que, tal como afirmámos há um ano, o Orçamento do Estado para 1994 foi um orçamento de propaganda e de ilusão, sem qualquer correspondência com o que já nessa altura era mais do que previsível e que a realidade tem vindo a confirmar.
Aliás, o País e esta Assembleia estão a viver confrontados, cada vez mais, com um problema grave que se vai repercutir no Orçamento do Estado para 1995: os orçamentos que são apresentados pelo Governo têm pouco a ver com a realidade; são cada vez menos transparentes; servem cada vez menos como orientadores das decisões e posições de empresas e sindicatos; e são cada vez mais orçamentos de propaganda para iludir os cidadãos, em particular os trabalhadores, para iludir e satisfazer Bruxelas.
O Sr. Octávio Terceira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - As alterações ao Orçamento que nos são apresentadas têm, pois, este pano de fundo a caracterizá-las e, seguramente, não haveria lugar à sua apresentação ou, então, a haver, seria num quadro completamente diferente, se tivessem sido tomadas em conta as críticas e propostas que o PCP avançou há cerca de um ano.
Tal como então dissemos, estamos perante, de novo, um documento recheado de inverdades.
Redução do défice em 25 milhões de contos, clama o Governo. Não, Sr. Ministro!
Se cotejarmos as alterações propostas, rubrica a rubrica, a conclusão a que chegamos é a de um aumento efectivo do défice em 8,048 milhões de contos, cujo financiamento- e esta é que é a questão-, é assegurado pelo diferencial entre os ganhos - que, a haver, são meramente circunstanciais e incertos e que podem, de um momento para o outro, transformar-se em resultados de sinal contrário -, resultantes da colocação de títulos de dívida pública, e as perdas registadas nos passivos financeiros. É uma operação de engenharia financeira, como já foi aqui verificado, sobre o futuro, que não pode, obviamente, ser contada para efeitos da definição da dimensão do défice.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, como facto novo, temos agora também o Estado a envolver-se em operações de mera especulação financeira, a contribuir para o crescimento da economia de casino.
Não que para nós seja grave algum aumento do défice, se ele resultar de um maior esforço do Estado no relançamento da actividade económica e na melhoria das condições de vida dos portugueses. O que é criticável é que isto não sucedeu e, mais do que isso, vem, nestas alterações, tentar maquilhar, o insucesso da sua política orçamental.
Para além de o reforço agora proposto do orçamento do Ministério da Educação em 23,6 milhões de contos, destinados "ao pagamento do descongelamento dos escalões do pessoal docente" vir confirmar o que dissemos, no ano passado, sobre a insuficiência de verbas no orçamento da educação, vale a pena recordarmos o que o então Ministro da Educação, Couto dos Santos, dizia: "Quando faço essa afirmação (...)" - de que as verbas são suficientes - ,"(...) é porque sei que tenho essas verbas, mas também sei que, necessariamente, na dotação provisional estão incluídos os escalões". Afinal, vê-se agora que não estavam necessariamente incluídos na dotação provisional. Aliás, é curioso verificar que o mesmo membro do Governo, a Sr.ª, então Secretária de Estado do Orçamento, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, que, na altura, dizia, enquanto Secretária de Estado do Orçamento, que as verbas eram suficientes, agora, como Ministra da Educação, chegou, afinal, a uma conclusão contrária.
Mas talvez seja curioso referir por que é que o Governo optou por não ir buscar à dotação provisional o dinheiro que teoricamente lá estaria para o Ministério da Educação e preferiu ir aí buscar o dinheiro para a União Europeia. E porque é muito mais fácil, em termos da opinião pública, justificar um pedido de aumento de despesa para pagar a educação do que explicar o aumento das verbas para a União