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27 DE ABRIL DE 1995 2211

pessoas a quem eu pouco ou nada adiantarei ao falar das modificações dessa sociedade. Modificações que são hoje conhecidas numa leitura sociológica e antropológica mas que têm, felizmente, atrás de si todo um conjunto de previsões no plano da ciência social e da ciência política que fazem com que as alterações nos não surpreendam, particularmente, apenas nos imponham que estejamos atentos à constatação das mudanças que são antecipáveis ô que são previsíveis.
Não é agora que se fala pela primeira vez de complexidade social, não é agora que, pela primeira vez, se introduz no discurso não a ideia clássica da ordem e da desordem mas uma ideia nova da ordem, da não ordem e da desordem, fazendo integrar a própria não ordem já não no kaos, que justificava o normativo, mas numa concepção mais aberta da própria lei e da própria norma. Por isso, o continuar-se, hoje, a defender o direito à diferença que ainda há relativamente pouco tempo remetia, o cidadão para o plano da marginalidade por o excluir da própria norma.
E toda esta realidade que muda, não apenas através da leitura cultural que nos suscita mas através de uma capacidade de vida concreta e, portanto, de atitude concreta perante o mundo e perante a vida.
Fala V. Ex.ª do regresso, no fundo, às instituições, à família, à escola, a um determinado tipo de comportamento marcado por baias que nos são dadas anteriormente e que, do ponto de vista institucional, nos comandam o comportamento. Porém, a realidade é uma e o desejo de a fazer funcionar é outro.
Ora, é justamente por isso que vamos cair naquilo que têm sido as opções de política legislativa do Governo nesta matéria. É justamente por isso que as molduras abstractas das penas são hoje maiores do que eram há tempos atrás e é exactamente por isso também que o próprio direito penal convive hoje mais com normas em branco e com conceitos indeterminados do que convivia há alguns tempos atrás, porque é fundamental confiar cada vez mais na capacidade do aplicador do direito, isto é, dos tribunais e dos juizes, para que cada decisão possa ser a decisão justa no caso concreto.
Não somos nós que temos de definir a evolução social; podemos definir caminhos para essa evolução, marcar objectivos no sentido de a atingir, mas a evolução social é mais rica do que a nossa própria previsão. Assim, temos é que ter leis, democraticamente elaboradas, que tenham efectivamente uma conformação de humanismo aplicável. Portanto, não são as leis que definem o que é o humanismo mas permitem que, na sua aplicação, se garanta o humanismo em concreto. É tendo códigos desta natureza que somos capazes de fazer integrar na lei a sociedade e a sua própria evolução.
Permita-me apenas dizer, para terminar, que estou perfeitamente de acordo com V. Ex.ª quando diz que a injustiça feita a um homem é sempre uma injustiça t que a morte de uma pessoa corresponde a uma calamidade. Isto é verdade mas o Sr. Deputado sabe tão bem como eu que, sendo isto verdade, é extraordinariamente perigoso num debate político sobre segurança. Na boca de outra pessoa, isso podia ser uma demagogia, sendo, todavia, uma verdade. Temos de saber é se uma afirmação dessa natureza conduz à ideia de que a morte de uma pessoa constitui o absoluto da acção política. A morte de uma pessoa constitui um absoluto de vida, que é uma coisa diferente do absoluto da acção política. Se assim não fosse, e utilizando uma linguagem demagógica, poderíamos dizer que a morte de muitos, no fundo, acaba por reconduzir-se à morte de cada um. Seja um ou sejam muitos, é sempre a morte de uma pessoa que está em causa.
É este tipo de atitude, Sr. Deputado, que julgo que devemos ter; é este tipo de atitude - e V. Ex.ª reconheceu-a no Director do Centro de Estudos Judiciários - que gostaria que reconhecesse no Ministro da Justiça, na medida em que nunca me habituei a não a reconhecer no Deputado e no Professor Adriano Moreira.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, à medida que o tempo ia passando comecei a recear que V. Ex.ª centrasse a sua intervenção na questão do Código Penal, reduzindo a política criminal a uma política penal. Foi quase isso que fez, porque V. Ex.ª deixou em branco muitas áreas que têm a ver com a segurança dos cidadãos e com a prevenção da criminalidade. Neste sentido, gostava que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre essa matéria.
Em relação às alterações ao Código Penal, devo dizer-lhe que, pelas razões que são de todos conhecidas, votámos contra, porque as alterações propostas assentavam em dados não científicos, porque não houve um consenso social alargado e porque as propostas de alteração continham alguns elementos que contrariavam as afirmações feitas pelo Sr. Ministro, no sentido de que os crimes contra as pessoas tinham sido todos agravados, o que não correspondia à verdade. Crimes como o rapto e o sequestro de menores conheceram um abrandamento das suas penas e não vale a pena, Sr. Ministro, vir tentar convencer a Assembleia da República e a população em geral que aqui estão incluídos os casos em que o pai ou a mãe separados levam o menor fora dos dias previstos, porque isso não é um crime de rapto nem de sequestro e porque as próprias estatísticas do relatório da administração interna têm uma rubrica respeitante precisamente à subtracção de menores. É aí, pois, que isso se inclui.
O crime de utilização de menores para fins pornográficos também sofreu um abrandamento muito grande; o tráfico de maiores sofreu em alguns casos uma despenalização, apesar de todos conhecermos o quanto grave é a situação das redes de prostituição organizada.
Não colocamos a questão do direito penal no centro da política criminal que é, sem dúvida, importante - e também não estamos de acordo com certas vozes que fazem incidir a tónica na questão do agravamento das penas. Penso que isso deve ser ponderado e equilibrado, não sendo, de facto, esse o único dado a ter em conta numa política criminal.
V. Ex.ª não se pronunciou sobre a questão da prevenção criminal. Uma norma tem de ter um sentido de prevenção geral positiva, isto é, o cidadão tem de sentir que aquela norma não é posta em causa, podendo, pois, confiar nela. Ora, o relatório de segurança interna que o Sr. Ministro da Administração Interna apresentou à Assembleia da República vai no sentido de dizer que as normas punitivas estão em crise, porque os tribunais absolvem demasiado, porque a medida de coacção aplicada pelos tribunais não é a prisão preventiva, pois quando as pessoas são presentes aos tribunais os juizes mandam-nas