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2 DE NOVEMBRO DE 1996 247

Ora, é para evitar essa situação, que é das situações mais corrosivas para o Estado de direito, que o Governo elaborou esta proposta e a apresenta a esta Câmara, com determinação, mas, naturalmente, sempre em espírito de diálogo.
Reconhecemos algumas das dificuldades que tivemos desde o início. As dúvidas expressas eram legítimas, mas nem sempre inocentes e a tentativa de confundir estas situações com as situações conhecidas por «crimes de facturas falsas», para tentar obter providências que a todas misturassem num mesmo saco de amnistia ou perdão foi por demasiado evidente. Não caímos nessa tentação!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, era também evidente a inadequação para qualquer situação de regularização do regime processual penal, elaborado à pressa em 1993. Na verdade, um anterior modelo de recuperação e regularização de atrasados, que teve aspectos positivos semelhantes ao actual e teve outros negativos, foi elaborado e aplicado a situações em que não havia verdadeiramente crimes fiscais - em que havia apenas ilícitos não criminais.
Perante esta situação, as deficiências do actual regime legal tornavam impossível um modelo de regularização conjugado articuladamente com um modelo de justiça fiscal e de procedimento penal fiscal, que permitisse que os criminosos que lesam interesses graves fossem efectivamente punidos, mas, que, ao mesmo tempo, possibilitasse que aqueles que, de boa fé e em plenitude, quisessem regularizar a sua situação, satisfazendo integralmente os interesses da Fazenda Nacional e cobrindo na totalidade o seu dever de assegurar a cobertura dos encargos públicos em condições de igualdade, valorizando assim o Estado de direito, esses, vissem reconhecido o seu esforço e não entrassem naquela zona cinzenta em que ninguém sabe se está numa situação legal, se ilegal, e em que os mecanismos de aplicação da lei são sempre necessariamente insuficientes, porque os possíveis infractores se medem por dezenas ou por centenas de milhar. Por que é essa a situação que decorre, da aplicação estrita dos preceitos que temos em vigor e que, por isso mesmo, não servem.
A apresentação de uma proposta de lei como esta que agora apresentamos ao Parlamento exige que se tente fazer algum enquadramento histórico do direito penal fiscal em Portugal, pois é sobretudo disso que se trata, e não de estabelecer uns remendos para fazer passar o plano de regularização, ou seja, de criar um enquadramento justo, igualitário e permanente no plano do direito penal fiscal português.
Esse enquadramento histórico, especialmente no que toca à opção pela criminalização dos comportamentos de fraude fiscal, abuso de confiança fiscal e frustração de créditos fiscais, revela-nos que, á este domínio, temos de ter a coragem suficiente para lutar contra uma tradição demasiado permissiva ou contra um certo justiceirismo abstracto que inspirou a revisão legislativa de 1993 e que, se não formos capazes de atalhar a tempo o mal deste sistema legislativo, nos arrisca a cairmos numa situação em que todos cometem ilícitos e ninguém, nomeadamente o aparelho judiciário e o aparelho administrativo, tem meio para impor a lei.

Aplausos do PS.

A opção pela criminalização de comportamentos graves de natureza tributária não ocorreu pela primeira vez:

ocorreu pela segunda vez em 1993, mas, antes, já tinha sido objecto, para além, naturalmente, da simples punição contraordinacional com multa, das soluções do Decreto-Lei n.º 619/76, de 27 de Julho, que previa, pela primeira vez, penas de prisão para delitos especificamente fiscais.
No entanto, este decreto-lei acabou por não ter nenhuma aplicação prática, para além das dúvidas sobre a sua constitucionalidade e da sua revogação sucessiva pelos tipos penais que viriam a ser previstos em diversa legislação avulsa. Podemos dizer, pois, que a experiência de 1993 é nova. Tem o aspecto positivo de criminalizar comportamentos graves de natureza fiscal e tem o aspecto negativo de ter criado um regime processual perfeitamente incongruente e que produz os resultados que agora tentamos remediar.
Com efeito, podemos dizer que a criminalização de infracções fiscais, apesar de, como disse, não ser nova entre nós, apenas revestiu carácter mais grave no plano da reprovação e prevenção das condutas lesivas dos interesses da Fazenda Publica, com a previsão de penas privativas da liberdade, nalguns casos exclusivas, para certo tipo de comportamentos especialmente lesivos do interesse público e em relação aos quais se manifesta, de forma clara, um sentimento ético de repulsa ou desaprovação pela comunidade.
Na verdade, até 1993, o nosso direito penal fiscal apenas punia com pena de multa até 1000 dias (com prisão alternativa em caso de não pagamento da multa) a prática de crimes fiscais, os quais eram, como continuam a ser, os crimes de fraude fiscal, abuso de confiança fiscal e frustração de créditos fiscais.
A opção, a um tempo, pela criminalização destas condutas e, a outro tempo, pela sua punição com penas de prisão, insere-se numa lógica e numa teologia de política criminal fiscal que importa referenciar para melhor se poder compreender o alcance da proposta de lei agora apresentada pelo Governo. Na verdade, em 1990 - em 1990 e não em 1993 -, aquando da aprovação do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras - o RIJONA, no calão, dos juristas -, o legislador afirmava com clareza que, e cito: «A criminalização não implica, necessariamente, a adopção, pura e simples, da pena de prisão como sanção primacialmente adequada às exigências de reprovação e prevenção dos crimes».
Todavia, decorridos mais de três anos sobre a entrada em vigor desse regime jurídico, a sua aplicação prática viria a evidenciar, como o próprio legislador afirmava no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 394/93, de 24 de Novembro - e cito de novo: «A necessidade de se proceder a um significativo reajustamento dos seus preceitos».
As alterações então introduzidas, como o legislador de 1993 também explicitava, «utilizam a experiência proporcionada pelo actual sistema, tendo em conta, no entanto, os novos contornos da fraude e a evasão fiscais, que obrigam a uma intervenção legislativa com outras repercussões práticas». E logo de seguida, o legislador de 1993, procurando justificar as soluções a que chegou, apontava que, por várias razões, a danos idade criminal se tinha agravado ao ponto de o RJIFNA passar a prever a pena de prisão a título principal até cinco anos.
O preâmbulo do Decreto-Lei n.º 394/93 tem uma grande importância para o enquadramento da presente proposta de lei, pois, se bem o lerem - e penso que os Srs. Deputados assim o farão, se não fizeram já -, verificarão que não vem alterar em nada o essencial das opções de política criminal subjacentes ao RJIFA. Bem pelo