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1460 I SÉRIE - NÚMERO 41

destas bases é um espaço em que começam a ser perigosamente postos em causa direitos e garantias dos cidadãos, que são conquistas civilizacionais históricas.
Ao que actualmente assistimos é à construção de um gigantesco aparelho policial supranacional, à imposição de mecanismos legais destinados a eliminar, na prática, o direito de obter asilo nos países da União Europeia por razões que não sejam meras conveniências de política externa e à adopção de políticas de estigmatização e expulsão de cidadãos originários de países mais pobres.
Aquilo a que, diariamente, assistimos é à imposição de uma verdadeira marcha forçada, no sentido de transferir para o aparelho policial europeu o exercício de poderes soberanos tão inalienáveis como os que dizem respeito à aplicação da justiça e à segurança interna, com todos os perigos que daí decorrem para a garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos.
A Europa que está a ser construída é uma fortaleza egoísta e xenófoba, que finge esconjurar os seus flagelos sociais culpabilizando os estrangeiros e os sectores sociais mais fragilizados, espalhando perigosas sementes de racismo e de intolerância.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação, em 1993, da Lei sobre direito de asilo representou entre nós um exemplo típico da diligência com que os Governos PSD alinharam na construção da fortaleza xenófoba europeia e representou um grave retrocesso na consagração deste direito em Portugal.
Esta evolução negativa acompanhou, lamentavelmente, a tendência verificada em diversos países da União Europeia no sentido de restringir drasticamente as possibilidades de acesso ao estatuto de refugiado.
Os requerentes de asilo, apesar de serem perseguidos em consequência das suas actividades em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, passaram a ser tratados com desconfiança, como se fossem potenciais criminosos. A pretexto da necessidade de conter a imigração ilegal, foram adoptados mecanismos legais e procedimentos práticos de denegação pura e simples da apreciação de pedidos de asilo, restringindo, de forma inadmissível, direitos e garantias fundamentais dos requerentes.
Perante esta evolução, diversas têm sido as organizações de carácter humanitário que, também em Portugal, têm vindo a alertar para a necessidade de serem alterados os aspectos mais negativos do direito vigente e, designadamente, para a urgência de serem adoptadas garantias mínimas dos requerentes no procedimento relativo aos refugiados.
O projecto de lei do PCP sobre direito de asilo, que hoje se encontra em debate, retoma as posições que o PCP defendeu quando exprimiu a sua oposição à aprovação das alterações legislativas introduzidas em 1993 e propõe a correcção dos aspectos mais negativos que marcam a legislação actualmente em vigor, em nove pontos fundamentais.
Primeiro ponto: revogação das disposições referentes ao processo acelerado de decisão.
A adopção desta forma de procedimento constitui o aspecto mais grave da legislação vigente em matéria de direito de asilo. Com este processo, foi conferido ao Ministro da Administração Interna o poder discricionário de, em apenas quatro dias, recusar qualquer pedido de asilo, com preterição de direitos elementares dos requerentes. Este processo tem uma instrução meramente policial, é decidido de forma exclusivamente administrativa e assenta em fundamentos arbitrários e sem possibilidades práticas de recurso.
Basta que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) entenda que as alegações de um requerente são destituídas de fundamento, que o requerente seja proveniente de «país seguro» ou «terceiro de acolhimento» e que o SEF invoque motivos não especificados de «segurança pública» para que o requerente de asilo seja expulso, sem que a sua pretensão seja concretamente analisada. Tal forma de processo é inconstitucional e deve, consequentemente, ser revogada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Segundo ponto: eliminação das referências a «países terceiros de acolhimento» e «países seguros». A denegação automática do estatuto de refugiado, que se opera pelo simples facto de um cidadão requerente ser originário de qualquer país considerado «seguro» ou «terceiro de acolhimento», inviabiliza a apreciação concreta do pedido de asilo e pode conduzir a um repatriamento que ponha em causa a segurança ou mesmo a vida do requerente. Acresce que a determinação por cada Estado dos países «seguros» ou «terceiros de acolhimento» releva de critérios de política externa muitas vezes estranhos a razões humanitárias.
Terceiro ponto: a reposição do regime de concessão de asilo por razões humanitárias.
A legislação portuguesa sobre direito de asilo, aprovada em 1980, concedia este direito aos cidadãos impedidos ou impossibilitados de regressar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual por motivos de insegurança, devida a conflitos armados ou a sistemática violação de direitos humanos que aí se verificassem. Tais razões, a partir de 1993, passaram a ser atendíveis tão-só para efeitos de concessão de um regime especial de autorização de residência distinto do estatuto de refugiado.
Sendo certo que a consagração constitucional do direito de asilo não abrange estes casos, a verdade é que também os não exclui. E se, em 1980, existiam razões para consagrar a concessão do estatuto de refugiado por razões humanitárias, não existem hoje menos razões para a sua reposição.
Quarto ponto: revogação, por inconstitucional, da disposição que possibilita a recusa da concessão de asilo «sempre que a segurança interna ou externa o justifiquem ou quando a protecção da população o exija, designadamente em razão da situação social ou económica do país».
Tendo o direito de asilo o estatuto constitucional de direito fundamental, este só pode ser restringido nos casos em que a própria Constituição o preveja. Ora, a Lei Fundamental não prevê qualquer cláusula de restrição deste direito, nem os fundamentos de recusa constantes desta norma - tão vagos e insindicáveis como «a situação social e económica do país» - podem funcionar, à luz da Constituição, como cláusulas de restrição de direitos fundamentais.
Quinto ponto: consagração do carácter automático - em vez da simples possibilidade - da extensão dos efeitos da concessão de asilo ao cônjuge e aos filhos menores solteiros ou incapazes do requerente ou, sendo este menor de 18 anos, ao pai e à mãe.
Sexto ponto: consagração da natureza independente da entidade competente para analisar os pedidos de asilo e apresentar propostas sobre a sua concessão.