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1662 I SÉRIE - NÚMERO 47

Sr. Deputado, ao ouvir a sua intervenção, de imediato olhei para uma carta que tenho aqui - e da qual posso, depois, enviar-lhe cópia - de uma doente de Loures que afirma que no Centro de Saúde de Loures, que se situa a 6 km de Lisboa, está há um ano para conseguir uma consulta de planeamento familiar.
Mas recordo-lhe mais: os Srs. Deputados, infelizmente, nas vossas intervenções, esquecem-se de que existe também um meio rural, de que existem também as mulheres do meio rural, onde foram construídas dezenas de centros de saúde, as chamadas extensões, que não funcionam por falta de médicos, que nem sequer têm um enfermeiro, em que as pessoas, para conseguirem uma consulta de planeamento familiar, terão de ir à sede do concelho, onde estão em «bichas» infindáveis. E quando os Srs. Deputados vêm à Assembleia falar de planeamento familiar como uma maravilha, tenho de dizer que não foi uma maravilha no passado, continua a não ser e era bom que se recordassem, de facto, do país real em que os homens e as mulheres que vivem na província também têm direito a consultas de planeamento familiar.
Sr. Deputado, gostava, pois, de lhe colocar a seguinte questão: quando fala nos centros de saúde, lembra-se, por acaso, desta realidade? Se conhece esta realidade, como pode dizer que há uma boa política de planeamento familiar quando estes centros de saúde estão encerrados e quando nos centros de saúde dos concelhos não se conseguem consultas? Pergunto-lhe se esqueceu esta realidade ou se apenas falou da cidade, de dois ou três centros de planeamento familiar que, seguramente, só o Sr. Deputado conhece!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, todos estamos de acordo de que é necessário fazer mais e melhor, de que é possível dar uma melhor capacidade de resposta. Mas ao ouvir a sua pergunta, pareceu-me que não estava, de facto, neste país porque não tenho qualquer dúvida de que existem dificuldades. E as dificuldades que existem não se verificam tanto nas zonas rurais como na Área Metropolitana de Lisboa, nos tais grupos de risco a que faço referência, onde esses problemas são muito mais agravados. E mais: apesar da falta de incentivo que o CDS-PP sempre foi dando a este tipo de política no passado, queria aqui fazer uma clara diferença conceptual da forma como encaramos este problema. Para nós, um médico de família, hoje, tem os instrumentos mínimos para fazer um planeamento familiar adequado; se tem dúvidas, e sempre que existem, nomeadamente as relativas aos problemas de esterilidade, tem a possibilidade de fazer a referência ao centro hospitalar da sua área geográfica.
Mas há uma coisa em que concordo consigo: de facto, aquilo que acontece hoje é que o sub financiamento que existe em relação a este tipo de preocupação não nos permite ter um grande optimismo no sentido da melhoria efectiva da qualidade da prestação de trabalho.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Inércia, Sr. Deputado, inércia!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde: Este debate, para o PCP, não é novo e a urgência não é de agora. Passou a ser urgente para o CDS-PP que, há treze anos, em 1984, quando votava contra um projecto de lei apresentado pelo PCP, anunciou, pela voz do seu Deputado, que ia apresentar um projecto de lei sobre planeamento familiar. Até hoje... !

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Parece ser urgente para o CDS-PP, que já se esqueceu que foi da sua responsabilidade, de um ministro do CDS, um despacho, em 1981, que vedava aos jovens o acesso a consultas de planeamento familiar!

Vozes do PCP: - Bem lembrado!

A Oradora: - Este debate sobre planeamento familiar não pode ser travado nos termos em que está circunscrito pelo CDS-PP. Desde já, não pode alhear-se de um debate sobre educação sexual, de que parece que o CDS-PP tem medo. E preciso, realmente, que se saiba se continuamos a querer manter atitudes culturais obsoletas, de vergonha hipócrita, sobre o funcionamento do aparelho reprodutor, numa sociedade que, dessa maneira, fermenta a própria violência sexual e física contra o sexo feminino. Essa violência esconde posicionamentos que se identificam no fundo com os que, mais ou menos encapotadamente do que outros, entendem que a contracepção servirá a promiscuidade sexual.
Existem, de facto, tabus na sociedade portuguesa que lutas não muito distantes e importantes - as lutas dos anos 60 - ainda não conseguiram arredar de todo da sociedade portuguesa. Tabus inadmissíveis num Estado de direito democrático que a todos - e não só às classes de risco - tem de reconhecer o direito ao planeamento familiar, o direito à sexualidade. Esses tabus servem objectivamente o posicionamento daqueles que, apoiando as políticas económicas neo-liberais que levam à não intervenção do Estado na área dos direitos sociais, impõem a esse mesmo Estado a «vigilância sobre os quartos de dormir», para usar uma feliz expressão de um autor canadiano.
Isso aconteceu por uma maioria de um voto, na recusa da despenalização do aborto até às 12 semanas.
É essa recusa que é o enquadramento deste debate dito de urgência. É um debate proposto por quem quer aliviar a consciência, por quem quer passar para o exterior uma imagem de preocupação com os problemas das mulheres portuguesas.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mas a verdade é que se o planeamento familiar, entendido como um direito de todos, é importante no combate ao aborto clandestino, e se é uma condição necessária, é também verdade que não é condição suficiente para resolver o grave problema de saúde pública das mulheres que é o aborto clandestino. Muitos outros países o entenderam há muito e o encaram como um problema de direitos humanos das mulheres.
Sabemos que, depois da experiência do Dr. Albino Aroso, já no ano de 1976 (tão atacado pelos defensores