2260 I SÉRIE - NÚMERO 64
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Desportos, penso que será comum a todas as bancadas e ao Governo o sentimento de que faz falta legislação no sentido de pôr cobro a um conjunto de situações que, infelizmente, têm ocorrido nos últimos tempos, não
generalizadamente mas numa modalidade desportiva, o futebol profissional. Penso que esse sentimento deve contribuir para que todos os grupos parlamentares e, desde logo, o próprio Governo, que apresenta esta proposta de lei, tenham um espírito de abertura ao aperfeiçoamento de um instrumento legislativo que nos parece de elementar interesse público e de defesa do próprio fenómeno desportivo.
Todavia, a proposta de lei, tal como o Governo a apresentou, nuns casos fica aquém do que deve, noutros vai além do que se devia esperar e deixa de fora várias situações que, estranhamente, na nossa opinião, não encontramos previstas no diploma em apreço.
Sr. Secretário de Estado, qual a razão por que "futebolizou", se assim me é permitido dizer, o segundo grupo de artigos da proposta de lei, nomeadamente a partir do 7.º, esquecendo, obviamente, que em Portugal há desporto profissional e não profissional? É que esta proposta, como eventual lei geral e abstracta, dever-se-á aplicar a todas as situações. Não considera errado que este regime se aplique indiscriminadamente ao desporto amador e ao desporto profissional?
Por outro lado, por que é que o Governo, preocupado com a verdade das arbitragens, como o Sr. Secretário de Estado acabou de dizer, não se lembrou que a verdade desportiva não depende só da verdade das arbitragens mas também da verdade do comportamento dos jogadores, dos dirigentes, dos treinadores? E por que é que, estranhamente, nesta proposta de lei apenas se pensa e se previnem situações que podem afectar a verdade da arbitragem? Por que não legislar preventivamente sobre outros fenómenos? A menos que queiramos que eles aconteçam para depois vir legislar à pressa quando constatamos o vazio legal, como normalmente acontece no sistema português! Quando se legisla, não se faz como deve ser, as situações acontecem e se um comentador descobre que há um vazio legal lamentamos todos esse vazio legal. Entretanto, as situações ficam impunes, o desporto profissional vai-se descredibilizando e passados alguns meses aparece outra proposta de lei! Penso que esta situação é de evitar a todo o custo e que este é
o momento privilegiado para tentarmos fazer uma boa lei.
Na nossa opinião, Sr. Secretário de Estado, esta não é uma boa proposta de lei e, por isso, além das questões que lhe coloquei e que nos preocupam sinceramente, pergunto-lhe também se da parte do Governo há abertura ao aperfeiçoamento, que na nossa opinião deve ser substancial, do articulado que o Governo apresenta. Obviamente, da sua resposta dependerá em grande parte o sentido de voto final que o Grupo Parlamentar do PP adoptará na votação da proposta de lei.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Desportos.
O Sr. Secretário de Estado dos Desportos: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, em relação à primeira questão, quero dizer-lhe que, evidentemente, há todo o espírito de abertura para aperfeiçoarmos o diploma.
Não temos, como é natural, a reivindicação de que tudo o que aqui está neste postulado tem a completa abordagem de todas as questões que se colocam na área desportiva, no caso concreto, em relação às áreas profissionais, mormente através de tudo aquilo que se tem passado nos últimos tempos e que todos nós reconhecemos que necessita de abordagens feitas com sensibilidade e ponderação em relação a toda a problemática que está em causa.
Em Portugal não se adoptou, como aconteceu noutros países, nomeadamente em Espanha e França, quando se criaram e foram aprovados os regimes jurídicos federativos, por agregar um modelo de regulamentação disciplinar.
Em Espanha, por exemplo, seguiu-se um processo desse tipo e fez-se, quase que minuciosamente, um diploma sobre toda a componente de regime disciplinar para as federações respectivas poderem adaptá-la aos seus estatutos internos; em França, seguiu-se uma situação idêntica; em Itália, por acaso, já não foi esse o caminho e até se fez legislação específica em relação às questões da ética e do combate à corrupção a nível do fenómeno desportivo.
Na verdade, houve abordagens diversas e em Portugal, tanto quanto foi aprovado no regime jurídico das federações, não se optou por esse caminho e deixou-se em aberto essa situação - aliás, gomo se sabe, há actualizações em termos de regulamentos disciplinares que estão por fazer, mormente na principal federação profissional que conhecemos, e há abordagens segundo temas, que o regime jurídico das federações aponta, nomeadamente as áreas da violência, do doping e da corrupção, porque toda esta matéria, no fundo, poderia estar contida em termos da própria capacidade de auto-regulamentação federativa ou num diploma completo sobre as questões do regime .disciplinar.
Não foi essa a situação e nesta matéria a nossa intervenção vai no sentido de apontar para as questões que, neste momento, estão mais claras e em aberto, embora isso também esteja considerado em termos globais. Aliás, já tive oportunidade de anunciar que, dentro em breve, chegará à Assembleia da República uma proposta de lei sobre o combate à violência e também já está a seguir o seu percurso normal e será, certamente, tratado em breve uma nova legislação sobre doping, fazendo-se a cobertura das questões essenciais que têm a. ver com esta matéria.
É este o ponto da situação. A propósito, devo dizer que o relatório, o que foi feito na Assembleia da República sobre esta matéria, contém algumas imprecisões quando fala da legislação espanhola, porque cita legislação diferente daquela que contempla o regime disciplinar das federações.
O diploma aponta essencialmente para as matérias do âmbito das federações que se adquiriu serem profissionais e que têm a sua componente profissional perfeitamente clarificada, concretamente o futebol e o basquetebol.
É evidente que podemos dizer que se trata de um problema global, mas não há dúvida alguma de que todas as envolvências que se colocam à volta desta matéria, por tudo aquilo que implicam - mas não só económica e financeiramente, em relação à actividade desportiva nestas modalidades, especialmente na do futebol - levaram a que prioritariamente se apontasse para as que têm a componente profissional, deixando àquelas que são consideradas como amadoras a possibilidade de elas próprias procurarem o seu caminho em termos de auto-regulamentação.
São estes os princípios que estão no diploma e estamos perfeitamente abertos para que com o contributo de todos se possa fazer uma legislação melhor em relação a este assunto.