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3302 I SÉRIE - NÚMERO 92

Só um Governo desorientado traz para a praça pública os seus conflitos internos e o azedume recíproco entre os membros do Governo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Aqui o Sr. Ministro da Economia lamenta-se de andar sozinho a salvar empresas, ali o Sr. Secretário de Estado da Energia acha um erro a intenção do Ministro das Finanças em mexer na tabela dos combustíveis.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tudo normal! Afinal trata-se do diálogo do Governo consigo próprio e de uma nova cultura democrática que, julga-se, se os portugueses ainda não apreciam devidamente que remédio senão aprender-lhe as virtualidades.
E os portugueses vão aprendendo! Constatam que, no Governo, há quase sempre opiniões para todos os gostos e que há sempre, pelo menos, um membro do Governo que pensa como eles e que gostaria de lhes dar razão.
Mas os portugueses vão também aprendendo a desconfiar desta polifonia política, cujo resultado cruel é este: no essencial, nunca se conhece a opinião e a posição do Governo, enquanto tal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A não ser, como se sabe, quando há forte contestação, de preferência na rua, lendo já sucedido também no mar. Só ainda não aconteceu em pleno ar, porque os pilotos da TAP não ousaram ainda desafiar as leis naturais, entre as quais a da gravidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora, nestes momentos, o Governo apressa-se a ter posição e a decidir e, normalmente, decide ceder.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Cedendo, invariavelmente o Governo vai delapidando a sua autoridade e probidade políticas e desafiando o sentimento dos cidadãos, que esperam, e tem direito, a um Governo de equidade social e de justiça.
Pelo meio, vão ainda fazendo-se graves cedências a princípios fundamentais do Estado de direito. Se todos estão sujeitos à lei e ninguém acima da lei, como pode o Governo convidar ao não respeito pela lei?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porque isso já sucedeu bastantes vezes. Há uma portaria do Ministério da Agricultura e Pescas que não é do agrado dos armadores? Então, o Ministro proclama que fechará os olhos ao seu incumprimento, reiterando que ela continua em vigor.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - Num outro exemplo mais recuado surgiram dúvidas quanto a irregularidades cometidas pelo Presidente da Câmara Municipal de Setúbal? Vem logo o Primeiro-Ministro reiterar a confiança política no autarca e aconselhar a que se mudasse a lei, o que, de resto, ainda não aconteceu.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - Mas, ainda ontem, o Ministro das Finanças, não conseguindo admitir o erro político do seu decreto-lei sobre o IVA e designando como erro da Administração aquilo que não resulta mais do que o seu cumprimento e aplicação,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É um discurso requentadíssimo!

O Orador: - ... na prática, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, convida a Administração, por prudência, a não aplicar a lei para futuro, pelo menos, sem previamente se inteirar de cada interpretação que o Governo faz da própria lei!

Aplausos do PSD.

No meio da desorientação, os membros do Governo nem se aperceberam de que, comprometendo pontualmente a execução da lei, se colocam eles próprios perante a possível exigência de decidirem, apesar da lei, sem regras para se defenderem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, o sinal porventura mais significativo do estado de desorientação política deste Governo é,- seguramente, o das repetidas ameaças de demissão, zurzidas pelo Primeiro-Ministro perante um país atónito.
Não tem o Governo condições para governar? Não terá o Governo Orçamento aprovado? Terá o Governo visto rejeitar na Assembleia da República instrumentos fundamentais para o presente e futuro do País, porventura a reforma da segurança social, a reforma fiscal, a reforma do financiamento da saúde, a reforma das forças armadas?
É que, tanto quanto a minha memória alcança, o Governo apenas viu rejeitado nesta Casa o «totonegócio» - e bem! -, algumas alterações desastradas ao Código Penal e uma proposta injusta do financiamento dos municípios!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pode o Ministro da Presidência vir ameaçar, em pacotes, a intenção de o Governo legislar a prazo certo, que soa fora de prazo a condição imposta para a sua futura aprovação!
A verdade é que se hoje o Governo não tem condições suficientes para exercer o seu mandato é porque já não está ele próprio convencido da autoridade política para o fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compreende-se, assim, melhor o desespero cíclico do Engenheiro António Guterres!