162 I SÉRIE - NÚMERO 5
Sendo, pois, esta uma matéria bastante complexa, humildemente reconheço que tem de ser muito analisada e aperfeiçoada. Portanto, em relação à questão que V. Ex.ª colocou, dos cinco anos e da liberdade contratual, podemos discutir isso na especialidade - se calhar, cinco anos é tempo demais. Penso que V. Ex.ª acha preferível que um trabalhador fique eternamente na situação de cedência ocasional, mas os trabalhadores nessa situação não o sentem assim e, de facto, talvez fosse melhor baixar um pouco esse limite.
Este projecto foi feito tendo em conta uma recolha de dados de situações reais, de opiniões de trabalhadores de muitos sectores que estiveram de acordo com este prazo. Se calhar, se lhes propuserem contratos a prazo de quatro anos, não estão de acordo. De qualquer maneira, esta é uma situação que pode ser vista na especialidade.
Em relação à questão da sistemática, o PCP colocou num único diploma uma matéria que tem a ver, ao fim e ao cabo, com a mobilidade externa dos trabalhadores, ora com cedências ocasionais, ora com as transmissões de empresas ou de estabelecimentos. E não alterámos todos os artigos do tal Decreto-Lei n.º 358/89, deixámos um remanescentezinho, pequenino, de facto, porque achamos que o regime deve ser muito, muito melhorado!
Sem dúvida que estas questões de sistemática são extraordinariamente importantes, mas devo dizer que, nesta matéria, a substância me interessa muito mais.
Interessa-me muito mais discutir o seu conceito de liberdade contratual, que não tem nada a ver com direito laboral até citei o acórdão do Tribunal Constitucional.
De resto, queria registar aqui a oportunidade da iniciativa: três dias depois de a termos apresentado, saiu uma famosa directiva sobre uma parte a que este projecto de lei também se refere e que é muito, muito melhor abordada no nosso projecto.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.
O Sr. António Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que hoje aqui travamos é anunciado como uma forma de reforço dos direitos dos trabalhadores que possam estar envolvidos em situações de cedência ocasional ou de transferência de empresa ou estabelecimento. Trata-se de matéria que dispõe já de regulamentação desde 1969 na Lei de Contrato de Trabalho e de um Decreto-Lei, o n.º 358/89, relativo ao trabalho temporário e à cedência ocasional de trabalhadores.
O PCP apresenta um diploma com um conjunto de normativos, uns, que repetem as disposições legais já existentes, e outros, que introduzem mecanismos de rigidez e de dificuldade que, ao invés de serem inovadores no sistema juslaboral português, cerceiam a mobilidade dos trabalhadores e a flexibilidade no emprego, tendência que se verifica no mundo inteiro e a que Portugal não é alheio, atentas as novas formas de organização de trabalho e as novas modalidades de organização empresarial. Ao contrário daquilo que o projecto de lei em análise faz crer, não se trata aqui de defender particularmente os direitos dos trabalhadores, cujos princípios fundamentais nesta matéria já encontram consagração legal, mas resulta a criação de dificuldades acrescidas ao funcionamento das empresas e, por consequência, dificuldades na criação de novos empregos.
O regime actual, quer no que respeita à transmissão de estabelecimento, quer à cedência ocasional de trabalhadores, é já em si um elemento de tutela e de defesa dos direitos dos trabalhadores. No caso de transferência de estabelecimento, assegura-se a manutenção da relação laboral, quer a montante, quer a jusante; isto é, quando se verifica a transferência do trabalhador para outra entidade patronal ou no caso em que os trabalhadores se mantêm com o empregador original - aliás, como se reconhece no próprio projecto de lei hoje em análise. No que respeita à cedência ocasional, o regime em vigor já estabelece fortes restrições às situações que tornam lícita a cedência de trabalhadores, estabelecendo-se como princípio geral a proibição de cedência ocasional. Acrescente-se que o actual enquadramento legal destas situações já configura uma defesa da vontade do trabalhador, nomeadamente, exigindo a sua concordância para que a alteração da sua entidade patronal se venha a verificar. No que não é inovador, isto é, o conjunto de disposições que constam do projecto de lei e que remetem para o regime já existente, é consensual. Onde o projecto inova, as regras propostas constituem efectivamente uma limitação quanto à gestão de recursos humanos e à capacidade que as empresas devem dispor de se poderem organizar ou reorganizar assegurando a sua maior competitividade sem pôr em causa os direitos dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A legislação laboral constitui um poderoso instrumento para regular as relações entre trabalhadores e empresas mas também uma forma de se realizar uma adequada gestão de recursos humanos e não um espartilho que não permite a desejável flexibilidade no funcionamento das empresas e da organização do mercado de trabalho. O presente projecto de lei, perspectivado apenas na óptica da defesa dos direitos dos trabalhadores, esquece a realidade económica e as necessidades das empresas. Não estão em causa os direitos dos trabalhadores esses já se encontram devidamente protegidos; o que está em causa aqui, é a criação de um conjunto de obrigações acrescidas para as empresas, que apenas vai ter como consequência maiores dificuldades na criação de novos postos de trabalho. A pretexto da invocação do reforço dos direitos dos trabalhadores, criam-se mecanismos de dificuldade acrescida para que estes possam encontrar empregos para aí trabalharem. É quase como se se quisesse ganhar na secretaria o que não resulta da negociação entre as partes, com a já existente tutela da lei e do Estado. Na generalidade dos casos, não é a falta de informação e de enquadramento legal que está em causa, mas sim a sua efectiva fiscalização.
Somos favoráveis à regulamentação deste tipo de situações, ou seja, que se acautele através da lei as condições de cedência ocasional de trabalhadores ou os casos em que se verifique a transferência de empresa ou de estabelecimento. Mas consideramos que, na generalidade, as situações já se encontram enquadradas e devidamente reguladas pela lei. Necessário é, nestas circunstâncias, que a mesma lei seja efectivamente cumprida, não criando novas expectativas aos trabalhadores de maior defesa dos seus direitos e novos entraves às diversas formas de organização empresarial. As soluções preconizadas neste projecto de lei, partindo de pressupostos que podem ser louváveis, acabam por introduzir no ordenamento jurídico laboral português um conjunto de normas de relevância menor para os trabalhadores mas de dificuldade acrescida para as empresas. A ser aprovado o presente projecto, com os contornos com que é apresentado, teríamos provavelmen-