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1482 I SÉRIE-NÚMERO 40

que, depois de levantados esses problemas, pude ainda consultar alguma legislação comparada, nomeadamente a legislação espanhola, parte da qual referi na minha intervenção inicial. Ora, de facto, pode acontecer - e é um assunto a estudar - que não haja perigo dessa sobreposição.
É que referi um exemplo, o da legislação espanhola, relativamente ao direito à honra, que prevê três espécies de procedimento para o mesmo direito e, portanto, tal pode justificar-se mesmo em relação à questão da liberdade de expressão. Repare que a liberdade de expressão em relação a um meio de comunicação social tem de ser garantida, mas também tem de sê-lo, por exemplo, em relação aos trabalhadores de um jornal e esses não têm o direito de resposta. Estas são apenas questões que estou a lançar.
Embora o direito à honra também tenha protecção no nosso Direito em sede de Código Penal, e até, nomeadamente, na Lei de Imprensa, o actual Código de Processo Civil contém uma providência - não é providência cautelar! -, um processo de jurisdição voluntária também para tutela desse direito à honra em sede de processo civil. Portanto, creio que é necessário não caminharmos assim tão depressa e não entrarmos no "facilitismo" de dizer que há sobreposição porque, na vida prática dos tribunais, muitas vezes verificamos que o facto de haver dois instrumentos não prejudica os direitos dos cidadãos, pelo contrário, garante-os duplamente. No entanto, é, de facto, uma questão a ponderar.
Aliás, penso que, no relatório da comissão, há um elenco bastante pormenorizado, feito pelo Sr. Relator, de alguns mecanismos já existentes na legislação portuguesa para garantir alguns direitos e, nesse aspecto, temos o trabalho facilitado.
Quanto à outra questão de a enunciação não ser taxativa, penso que não havia outra hipótese porque o que propomos não se refere apenas à Administração mas, também, às entidades privadas. Ora, se em relação à Administração é fácil ir ao Direito Administrativo e extrair o elenco dos vícios, em relação às entidades privadas pode haver múltiplas formas de violação de direitos e, portanto, não era possível fazer o enunciado que referiu.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra, também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, também eu quero registar com apreço a preocupação manifestada pelo PCP que, como sabemos, não é uma preocupação de agora, antes tem vindo a suscitá-la em vários momentos de discussão relevante, designadamente mesmo em processo de revisão constitucional. Trata-se da questão da adequada tutela dos direitos, liberdades e garantias, e o projecto de lei que agora estamos a apreciar é disso uma natural emanação.
Na questão que colocou à Sr.ª Deputada, o Sr. Deputado Francisco Peixoto suscitou uma preocupação que, a meu ver, subsiste. Esta é a de evitar que se criem regimes de sobreposição, designadamente quanto a outros institutos que já regulam, em termos adequados, domínios de acção processual atinentes às liberdades e garantias fundamentais de natureza pessoal, porque não se trataria, no plano da técnica legislativa, de criar instrumentos em sobreposição.
É que é preciso vermos a natureza formal dos instrumentos jurídicos. Eles não são, uns relativamente aos outros, hierarquicamente colocados em plano diferenciado, de tal maneira que pudesse dizer-se, por exemplo, que a lei do processo penal ou a Lei de Imprensa tivessem um valor de lei reforçada relativamente ao diploma que agora é proposto e, como tal, permitissem jogar com os vários mecanismos processuais que, entretanto, fossem aprovados. Não, a lei mais recente, esta, derrogaria, inevitavelmente, disposições das outras leis em caso de estar em colisão, juridicamente, com disposições desses institutos jurídicos e, portanto, não podemos correr esse risco. Assim, há um grande trabalho de meditação a fazer em termos de delimitação material adequada dos direitos que podem vir a figurar neste âmbito de protecção que o PCP hoje propõe.
Mas há um outro problema, Sr.ª Deputada, para o qual, de uma maneira muito construtiva, queria suscitar a meditação. Esse problema tem a ver com a competência dos tribunais.
É que podemos comparar as soluções da ordem jurídica portuguesa, existentes ou a criar, designadamente com a espanhola, que já aqui citou, mas há um problema essencial para nós. Temos de partir da nossa ordem constitucional para construirmos soluções constitucionalmente compatíveis.
Ora, o problema que temos é o de que a definição de competências dos tribunais tem sede constitucional. É a nossa Constituição que, no domínio da repartição de competências, nos faz a distinção de competências entre os tribunais judiciais e, no caso concreto que nos interessa, os tribunais administrativos. Na verdade, a Constituição, no seu artigo 212.º, n.º 3, diz que "Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas (...)". Ou seja, está definida, em sede de Constituição, uma competência do tribunal administrativo, a qual, depois, não pode ser retirada a esse mesmo tribunal por via de legislação ordinária.
Quando, no projecto de lei do PCP, se coloca toda a competência, de forma exclusiva, no domínio do instituto que estão a propor, tendo como tribunal competente, exclusivamente, o tribunal judicial da comarca respectiva, é evidente que se está a criar, para alguns aspectos do problema, um desaforamento relativamente às competências do tribunal administrativo.
A minha preocupação é a de que esta solução esteja ferida de inconstitucionalidade. Do ponto de vista da sua solução prática até admito que pudesse ser a melhor porque os tribunais judiciais, pela sua distribuição territorial, estão mais perto das comunidades e - até admito - estão mais perto dos cidadãos e da emergência de muitos dos problemas que, neste projecto de lei, visam tutelar. Mas uma coisa é a nossa intenção subjectiva, de legislador, perante um problema, outra coisa é o parâmetro constitucional nos termos do qual temos de encontrar a solução jurídica adequada à Constituição.
Nesse sentido, peço à Sr.ª Deputada que reflicta sobre esta observação que lhe fiz, exactamente para que o PCP não esteja fechado à dificuldade que apontei e para que, em função dela, possamos conhecer, em segunda reflexão, a posição do PCP quanto a este aspecto.