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2548 I SÉRIE -NÚMERO 69

A proposta de lei do Governo exige, desde logo, um conjunto de requisitos que nos parecem fundamentais para proteger as situações que merecem ser protegidas, e só elas.
Assim, segundo a proposta de lei, apenas poderão ser beneficiadas da medida as pessoas que tenham sido pessoal* mente afectadas pela situação então vivida, exigindo-se, nesta matéria, um nexo de causalidade, e que, por essa razão, se viram impossibilitadas de praticar actos de natureza processual e de exercer os seus direitos perante qualquer tribunal ou entidade administrativa, mesmo fora dessas ilhas.
Por isso, porque se trata de uma medida excepcional, limita-se a aplicação subjectiva aos residentes nessas três ilhas, e apenas a eles, e estabelece-se uma presunção legal, embora ilidível, claro, a seu favor, pelo que, tratando-se de um facto público notório, como é este, se dispensa a apresentação de prova pela pessoa que pretende praticar o acto fora de prazo.
Parece-nos que, por razões de harmonia e de lógica sistemática, a providência deve ser subsumida ao regime vigente em matéria de impedimentos para a prática de acto fora de prazo, que encontra a sua sede basicamente no artigo 146.º do Código de Processo Civil. Esta solução permitirá, na perspectiva do Governo, conhecer e decidir cada caso na sua individualidade e verificar se a situação reúne os requisitos de excepção que estiveram na base da formulação da proposta de lei.
Relativamente ao texto da l.ª Comissão, permitir-me-ia alertar para a necessidade de ponderar dois aspectos, tendo o primeiro, como disse, a ver com os beneficiários da medida. A nossa proposta consagrava dois requisitos subjectivos: o primeiro era o de se tratar de residentes nas ilhas afectados pela situação; o segundo, terem esses residentes sido impossibilitados de exercer os seus direitos. Queria alertar a Câmara no sentido de que a abolição destes requisitos poderá dar à lei um carácter demasiado amplo e permitir que esta providência seja utilizada de forma oportunista por quem, não tendo nada á ver nem tendo sido minimamente afectado pela crise sísmica, não tenha praticado, como devia ter praticado, o acto dentro do prazo. Penso que este é o ponto que temos que ver.
Relativamente aos tribunais e serviços onde correm os processos judiciais e administrativos, devo dizer que nós não restringimos na nossa proposta de lei a aplicação aos tribunais e serviços das ilhas, mas verifico que a proposta da comissão restringe. Chamaria a atenção que não se deveria limitar aos serviços e tribunais das ilhas, porque pode suceder que residentes das ilhas afectados pela situação tenham sido impossibilitados de praticar actos em tribunais sediados fora das ilhas ou em serviços sediados fora das ilhas. Portanto, julgo que este seria um outro ponto que mereceria uma melhor ponderação em comissão.
Era basicamente isto, Srs. Deputados, que queria especialmente referir.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral para, na qualidade de relator, fazer a síntese do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre as iniciativas em apreciação.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Justiça: A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias foi encarregada de estudar a proposta de lei do Governo, à qual se referiu o Sr. Secretário de Estado na sua intervenção, e também a proposta de lei da Assembleia Legislativa Regional dos Açores. Os dois diplomas foram estudados em conjunto, porque ambos visam dar resposta a problemas concretos
derivados da crise sísmica que se iniciou no dia 8 de Julho do ano passado e que abrangeu as ilhas do Faial, Pico e São Jorge.
A proposta de lei que nos é enviada da Assembleia Legislativa Regional dos Açores diz respeito apenas ao pagamento dos impostos naquele período tão complicado que se seguiu ao terramoto. A vida social ficou extremamente perturbada, em especial na ilha do Faial, mas nas outras duas ilhas também. Não foram apenas as pessoas que perderam as suas casas, mas toda a comunidade se viu afectada e perturbada.
As obrigações de carácter fiscal ficaram por cumprir e a Assembleia Legislativa Regional dos Açores dirige-se à Assembleia da República, no exercício da suas competências constitucionais, pedindo que isente de encargos adicionais aqueles cidadãos que, porventura, não cumpriram as suas obrigações fiscais nessa altura conturbada, o que nos parece perfeitamente razoável.
A posição da l.ª Comissão é favorável à aprovação deste diploma e os termos em que a questão nos é apresentada pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores são curiais, razoáveis, não levantam problemas de maior.
Já o mesmo não se passa com a proposta de lei que o Governo nos enviou. O Sr. Secretário de Estado chamou a atenção para uma série de problemas complexos, que tinham sido abordados no estudo que foi feito a propósito desta matéria pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, e também para outros problemas que não tinham sido considerados, mas pareceu-nos estranho, desde logo, que esse diploma, apresentado pelo Governo, viesse parar ao Parlamento, quando a própria redacção do diploma que nos chegou configura um decreto-lei. O diploma que nos foi remetido é, efectivamente, um decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros, ao abrigo do preceito constitucional que refere as competências legislativas do Governo, e depois, não sei se por uma deficiência de endereçamento do, documento, acabou por nos aparecer na nossa «caixa do correio», na Assembleia da República.
Mas este diploma é também encarável como uma proposta de lei, só que para ser uma lei realmente benéfica para os sinistrados da crise sísmica do ano passado entende a l.ª Comissão que deve ser uma lei simples, facilmente perceptível e facilmente exequível.
Ora, o diploma que nos chegou às mãos, e que foi estudado na l.ª Comissão, afigura-se cheio de complexidades: dificuldades de prova nalgumas matérias, uma prova que pode ser, de facto, terrível - basta cair nas mãos de um responsável administrativo exigente para tornar a aplicação efectiva do preceito legal um «inferno» para os interessados -; exige muitos meios de prova; há presunções para algumas matérias mas não há para outras; restringe-se apenas àquelas pessoas que forem efectivamente sinistradas ou àquelas que colaboraram nas tarefas de apoio aos sinistrados. Mas a realidade - e eu pude testemunhá-la directamente naqueles dias - é que todas as pessoas, mesmo aquelas que ficaram com as suas casas de pé ou aquelas que, pela sua idade, já não podiam de forma alguma andar a ajudar os outros, estiveram num tecido social perturbado, muitas delas até deixaram de dormir nas suas casas e passaram a dormir em tendas e os papéis ficaram em casa... Acho que ninguém pensou nisto, mas este pavor cósmico que todos sofreram naquela noite de 8 de Julho deixou as pessoas extremamente perturbadas durante bastante tempo.
É pena que esta questão não tenha sido resolvida mais cedo, mais em cima da hora. Em todo o caso, e com toda a franqueza, parece-me que se uma lei muito ampla pode permitir actuações oportunísticas, que também não vejo que vê-