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1047 | I Série - Número 27 | 07 de Dezembro de 2000

 

O Orador: - Pretende-se, em segundo lugar, alterar a actual relação de votos no Conselho, concretizando uma reponderação que pode desvirtuar a natureza intergovernamental da União Europeia, que pode acentuar a sua componente meramente demográfica e populacional e que visa promover a recuperação de algum poder perdido por certos países mais fortes.
O PCP considera não ser admissível que Portugal possa vir a perder, por esta via, capacidade de intervenção no processo decisório da União Europeia.
Pretende-se, em terceiro lugar, que todas as matérias legislativas decididas por maioria qualificada passem a ser objecto de co-decisão parlamentar, promovendo-se, assim, não apenas uma reponderação acentuada de votos no Conselho como também uma dupla reponderação de votos, através do Parlamento Europeu onde, para compor o ramalhete final, parece que a representação parlamentar portuguesa poderá vir a ser significativamente diminuída dos actuais 25 lugares, num universo de 626. Há quem advogue e aceite a passagem para 16 lugares, num Hemiciclo de 700 assentos, sendo certo que, neste contexto, a Alemanha, por exemplo, passaria para 104 lugares.
Em quarto lugar, deseja-se limitar o número de membros no Colégio de Comissários que, de uma forma imediata ou a prazo, não assegure o princípio fundamental da existência de um comissário por cada Estado membro. Pode, assim, provocar-se que, na única instituição comunitária dotada de iniciativa legislativa, possam não estar representados todos os países, culturas e interesses nacionais que constituem a União Europeia. Simplesmente inaceitável, seja qual for a camuflagem com que, em Nice, se esteja a pensar adoçar uma tal decisão.
Por último, pretende-se viabilizar a criação das chamadas «cooperações reforçadas» com a participação de apenas um número limitado de membros da União Europeia.
As cooperações reforçadas visam a criação de uma Europa a várias velocidades, de onde ficará para sempre arredado o velho princípio fundacional do Tratado de Roma de aprofundamento da integração através do estabelecimento de consensos.
As cooperações reforçadas poderão dar origem a grupos diversificados, funcionando ao sabor e a reboque dos mais poderosos. Mas o seu objectivo imediato e substancial é, incontornavelmente, através deste expediente, gerar as bases para permitir, em torno das questões da defesa e da segurança, a criação de um corpo militar comum que se arrogue o direito de actuar e agir em nome de todos e da União Europeia.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Importaria que, no quadro da CIG e do Conselho Europeu de Nice, o Governo assumisse de forma clara a recusa das alterações institucionais que mais negativamente possam atingir Portugal.
Dentro de dias, poderemos avaliar os resultados de Nice e confrontar novamente o Governo com as consequências, para Portugal, do conteúdo concreto dos acordos que entender subscrever no próximo fim-de-semana.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Neves, para uma intervenção.

A Sr.ª Helena Neves (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Europa que os Chefes de Estado da União Europeia começam a discutir amanhã, em Nice, está transformada num puzzle onde se põem e repõem jogos e estratégias de poder dos grandes países na procura de acordos institucionais imediatos e reducionistas, sem definir estratégias de construção europeia. A União está em crise, Sr.as e Srs. Deputados.
É necessária a reformulação institucional de uma União que está em colapso de credibilidade e que tem sido paralisada na sua decisão. É mais do que nunca necessário o relançamento democrático de uma União que se rege pelo abstencionismo da maioria da população. E é por aí que a reforma deve começar e é por isso que tem fracassado ao longo dos últimos anos.
Ora, em contrapartida, o que tem vindo a predominar recentemente, em particular com a presidência francesa, é a escolha dos caminhos mais fáceis, nomeadamente a escolha de um autoritarismo ignorante dos problemas sociais e de um autismo político institucionalizado.
Com a preparação conduzida por Chirac e Jospin, a Cimeira de Nice pode não chegar a nenhuma conclusão para encerrar a Conferência Intergovernamental, mas dará certamente novos passos na constituição de um corpo europeu de ataque, de um embrião de exército.
Privilegiando as armas logo depois da moeda e antes da cidadania, os governantes europeus mostram, assim, por que é que uma maioria socialista e uma minoria de direita se entendem tão facilmente: os estados-maiores, no exército como na banca, são irredutíveis, secretos e incontroláveis, e são os motores de uma União que desconfia do voto, do debate, da prioridade da acção social.
Esta União que se reúne em Nice é uma Europa pequena e mesquinha, não é um projecto de casa comum, de um continente solidário e aberto num mundo em mudança.
Na Europa de hoje intensificam-se as assimetrias e as tensões sociais e, em particular, o desemprego, que atinge já 9% da população europeia - mais de 20 milhões de pessoas, Sr.as e Srs. Deputados! -, enquanto que a pobreza extrema abrange 18% dos europeus, mais de 40 milhões. Este é o problema da Europa, mesmo que Chirac pense que tudo se resume a uns mísseis e a umas paradas.
Por isso, esta Cimeira fica presa, nas suas contradições, entre a inevitabilidade do alargamento e a reponderação de votos, tentando uma coesão política que a concorrência e a disputa de poder fragiliza. O que está em discussão nesta Cimeira não é somente um desequilíbrio de poderes, no qual os pequenos países são potencialmente perdedores. Está, também, em evidência a representação que os chefes de Estado têm das cidadãs e dos cidadãos, representação bem patente no projecto de uma Carta dos Direitos que se fica pelas declarações de intenções, ficando atrás dos direitos sociais consagrados em vários países e mesmo no direito internacional.
A Cimeira de Nice discutirá igualmente, com algum formalismo e pouca coragem, o alargamento da União Europeia. Este alargamento é necessário e confronta os Estados membros com a própria crise de legitimidade da União. Poderia, por isso, constituir motivo para a reflexão urgente do projecto europeu como um território cuja identidade, ou identidades, multinacional, multicultural, multi-étnica e multireligiosa impõe uma refundação da democracia, um processo de democratização da democracia. Mas é esse mesmo alargamento que exige opções de fundo sobre o modelo de Europa.
Por isso, as cidadãs e os cidadãos europeus passam ao lado da Cimeira. Mas estão também à beira de Cimeira, a esta mesma hora em que aqui nos reunimos para esta discussão: os movimentos sociais de desempregados, os