O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1705 | I Série - Número 42 | 27 de Janeiro de 2001

 

O Orador: - Só agora conseguimos compreender o total alcance do artigo 12.º da Lei de Bases e do artigo 6.º do Regulamento. O que diz tal artigo é muito simples: o Estado é monopolista da gestão dos recursos cinegéticos em Portugal, podendo transferi-los ou concessioná-los. No caso de transferir, formam-se as zonas de caça nacionais e as zonas de caça municipais; no caso de concessionar, formam-se as zonas de caça turísticas e zonas de caça associativas.
E agora vem o busílis da questão: no caso de transferência, esta é feita para associações de caçadores, proprietários, associações de defesa do ambiente, autarquias e - pasme-se! - não é necessária autorização dos proprietários para os seus terrenos ficarem sob a alçada destas associações; ou seja, há uma espécie de nacionalização indirecta da utilização cinegética dos terrenos privados. Está agora claro, porque se dizia no artigo 16.º da Lei, que o estabelecimento das zonas de caça mediante concessão carece de acordo prévio. Era preciso estar por dentro do segredo para se perceber que, pelo contrário, o estabelecimento de zonas de caça mediante transferência não carece de acordo prévio. É uma espécie de «gato escondido com o rabo de fora»! Esta problemática já deu, aliás, muita celeuma existindo um Acórdão do Tribunal Constitucional que definiu a inconstitucionalidade das normas que permitem a constituição de zonas de caça sem o acordo prévio do proprietário.
O Sr. Secretário de Estado seguramente vai dizer que há uma diferença substancial: é que às zonas de caça nacionais e municipais têm acesso todos os caçadores. Mas, Sr. Secretário de Estado, às zonas de caça turística também têm acesso todos os caçadores e, no entanto, é necessário acordo prévio. Relembro-lhe o artigo 9.º onde se diz que às zonas de caça turística têm acesso todos os caçadores que cumpram as normas privativas de funcionamento das mesmas. Ora isto é, precisamente, o que acontece nas zonas de caça nacionais e zonas de caça municipais só que as normas de funcionamento vêm noutro artigo, que é o artigo 22.º. Mas não é só no artigo 22.º, também no artigo 16.º se define o acesso, que, forçosamente, tem de ser restrito, às zonas de caça nacionais e às zonas de caça municipais.
Mas há mais, Sr. Secretário de Estado: de acordo com os artigos 22.º e 25.º do Decreto-Lei, o exercício da caça nas zonas de caça nacionais e municipais está sujeito ao pagamento de taxas que (não se diz, mas depreende-se) vão para as associações que fazem a gestão dos ditos recursos cinegéticos.
Em suma, não só é possível que associações privadas se apropriem das propriedades alheias para a exploração dos seus recursos cinegéticos como também ainda podem cobrar taxas sobre a utilização dessa propriedade alheia.
Ora o PSD não pode de maneira alguma concordar com este procedimento. E pensamos que os outros partidos nesta Assembleia, designadamente os Srs. Deputados do PS, também não podem concordar com este processo. Ainda por cima, Sr. Secretário de Estado, consta nos meios cinegéticos nacionais que não se vão proceder à renovação de muitas zonas de caça associativas e turísticas para que os terrenos possam passar para zonas de caça municipais. A ser verdade - e desde já digo que não acredito - era caso muito grave, mas veremos o que acontece no próximo Conselho Nacional de Caça, que se realiza daqui a uma semana.
Mas há mais ainda, Sr. Secretário de Estado: poderá não ser possível recusar a inclusão de uma propriedade numa tal zona de caça municipal ou nacional. Tomemos então um exemplo muito simples: um proprietário rural, num concelho com mais de 50% da área afecta a zonas de caça turísticas e a zonas de caça associativas, não pode, ao abrigo desta lei, constituir no seu concelho mais zonas deste tipo. Há um grupo de caçadores que resolveu solicitar a inclusão da sua propriedade numa zona de caça municipal; esse grupo de caçadores, por acaso, é constituído pelos seus maiores inimigos locais, por pessoas que não lhe merecem a mais pequena consideração. Como o proprietário tem licença de caça, não pode, segundo o artigo 26.º, requerer a não caça, tem, pois, de estar sujeito a ver a sua propriedade gerida por indicação de pessoas em quem não confia, sem hipótese de a retirar! Acontece ainda que se vislumbra aqui um flagrante tratamento de desigualdade: um proprietário vê rentabilizados os seus terrenos ao arrendá-los de livre vontade a zonas de caça turísticas e a zonas de caça associativas; enquanto outro, vizinho daquele, assiste impotente a uma ocupação sem poder escolher quem, na sua propriedade, explora os recursos cinegéticos.
E não se compare esta situação com a alternativa do terreno livre, já que aí o próprio Tribunal Constitucional reconhece haver um bem social que se sobrepõe ao bem particular justamente por ser praticado por toda a gente, sem limitações. De resto, em nenhum lugar da Constituição se encontra um genérico direito à caça, Sr. Secretário de Estado, o que quer dizer que, não sendo um direito constitucional, não pode legitimar qualquer restrição de direitos, liberdades e garantias ou de direitos fundamentais da mesma natureza, tais como o direito à propriedade ou à iniciativa económica privada. De, facto é bom lembrar que o direito à propriedade privada é um direito constitucional que vem previsto no artigo 62.º e que não pode nem deve ser subvertido por um decreto-lei de regulamentação da Lei de Bases Geral da Caça. Mas, se isso não bastasse, o artigo 267.º, n.º 5, da Constituição prevê o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes digam directamente respeito. De duas, uma: ou o Governo ouve os interessados antes de criar uma zona de caça ou, então, o procedimento de criação de tal zona de caça em terrenos de terceiros é inconstitucional.
Estas são, Sr. Secretário de Estado, as principais objecções quanto ao Decreto-Lei n.º 227-B/2000. Quanto ao resto, o que propomos são pequenas alterações a alguns artigos que, do nosso ponto de vista, só vêm melhorar o diploma. E esperamos para ver o que vai acontecer com as 23 ou 24 portarias que o decreto-lei prevê que venha a regular este regulamento, propondo desde já retirar uma, Sr. Secretário de Estado. Neste afã regulador, prevê o artigo 30.º, n.º 4, definir com o Sr. Ministro da Economia a traça arquitectónica dos edifícios a construir nas zonas de caça turísticas. Pensamos que talvez não sejam as pessoas indicadas para o fazer; e, à laia de descentralização, de que o PS tanto diz gostar, propomos que tal caiba às câmaras municipais de cada região.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.