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0339 | I Série - Número 10 | 11 de Outubro de 2001

 

contrato individual de trabalho e, ainda assim, isso deveria ser feito com garantias relativamente à forma de admissão de pessoal, não devendo dispensar uma forma, embora um tanto mitigada, de concurso público.
Ora bem, aquilo que o Governo aqui propõe não é isso, não é qualquer regra de excepcionalidade para o recurso ao contrato individual de trabalho, o que o Governo aqui propõe, mesmo que esta proposta de lei seja discutível relativamente à possibilidade que abre de recurso a excepções para contornar o regime geral, é, pura e simplesmente, um regime de opção governamental em cada caso concreto entre recorrer ao regime da função pública ou ao regime do contrato individual de trabalho. É isto que expressamente consta do artigo 30.º desta proposta de lei, no qual o Governo até prevê a co-existência dos dois regimes no mesmo instituto, correspondendo a cada um dos regimes um quadro de pessoal próprio.
Portanto, isto para nós é absolutamente inaceitável, porque cria disparidades óbvias dentro de cada instituto; permite que, no mesmo instituto, estejam a desempenhar a mesma função dois trabalhadores com regimes absolutamente díspares, um sujeito ao regime da função pública e outro sujeito ao regime do contrato individual de trabalho; e legitima tudo, isto é, legitima uma fuga absoluta ao regime de emprego público para o exercício de funções que, evidentemente, são funções públicas.
Há uma segunda questão que, do nosso ponto de vista, é importante salientar, que é esta: o que é que este diploma permite em matéria de criação de institutos públicos? Permite quase tudo. Permite que, quando considere que as funções a desempenhar no âmbito da Administração Pública devam ser melhor desempenhas através do instituto público, o Governo tome essa opção e crie o instituto; que o próprio instituto possa criar uma entidade de direito privado, uma vez que o artigo 9.º desta proposta de lei permite ao próprio instituto participar na criação de uma entidade de direito privado para desempenhar as suas próprias funções; que o próprio instituto possa participar na criação de uma entidade privada, juntamente com outras entidades, para desempenhar as suas funções; que o Governo possa também adoptar um regime para um instituto público que seja equiparado ao das entidades empresariais públicas (artigo 43.º); que o instituto possa criar subinstitutos (artigo 47.º); e tem ainda uma insólita disposição, que é a do artigo 52.º, que diz que «as fundações de direito privado instituídas por entidades públicas, ainda que seja por instrumento próprio das fundações particulares, regem-se pela lei civil».

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É para a FPS!

O Orador: - Este artigo 52.º da proposta de lei faz-nos lembrar uma célebre fundação, chamada Fundação para a Prevenção e Segurança, que, inclusivamente, foi aqui objecto de um inquérito parlamentar, porque, de facto, era disso que se tratava. Tratava-se de uma fundação de direito privado exactamente criada por um instrumento próprio das fundações particulares, instituída por entidades públicas. Com uma norma destas, o Governo consideraria que se regem pela lei civil este tipo de fundações e, portanto, ficaria legitimada uma actuação como aquela que foi aqui condenada.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não é verdade! São realidades diferentes!

O Orador: - O Sr. Deputado Jorge Lacão está muito exaltado a dizer que são realidades diferentes, mas fico à espera que ele demonstre isso, porque, para nós, o que está aqui, preto no branco, é que se trata, de facto, de uma realidade que encaixa perfeitamente na moldura que o Governo procurou criar para a chamada Fundação para a Prevenção e Segurança.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas há ainda uma terceira questão, que é a da fuga para a regulamentação. O que é que quero dizer com isto? No artigo 6.º deste diploma, diz-se que os institutos são criados por decreto-lei. Simplesmente diz-se também que o decreto-lei apenas tem de definir a designação, as atribuições, a jurisdição territorial, o ministério da tutela e que tudo o mais pode ser definido através de decreto regulamentar.
Ora bem, o decreto regulamentar, como se sabe, não está sujeito a fiscalização parlamentar, apenas o decreto-lei está, e permite-se aqui que, inclusivamente, o regime de pessoal seja definido através de decreto regulamentar, quando o regime de emprego público, nos termos constitucionais, constitui uma reserva legislativa, razão pela qual, do nosso ponto de vista, como é evidente, nunca pode ser remetido para um diploma regulamentar.
Portanto, o que se visa permitir com esta disposição é que, no fundo, o Governo, através de decreto-lei, se possa limitar a algo muito simples, que é dizer: é criada uma fundação, com a seguinte designação, com a seguinte atribuição, de âmbito nacional e sob tutela do ministério x, e tudo o mais, tudo aquilo que é fundamental do ponto de vista estatutário, passa para decreto regulamentar, ficando aí o Governo absolutamente de mãos livres para fazer aquilo que muito bem entender.
Concluindo, este diploma, tal como está, é para nós absolutamente inaceitável, apresenta-se como um diploma que procuraria, no fundo, moralizar uma situação que todos consideramos inadmissível, porque aquilo que, no fundo, vem fazer é legitimar situações como aquelas que existem actualmente e que nós, manifestamente, condenamos.
O que é desejável, do nosso ponto de vista, é um diploma que corresponda, de facto, aos objectivos que são invocados e que, no seu conteúdo, não acabe por vir negar esses objectivos, que é aquilo que acontece com a proposta de lei.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Creio que, para além das próprias fronteiras do debate que agora travamos, todos nós temos o dever de não ignorar as profundas mutações do Estado em face das responsabilidades que ele tem sido sucessivamente chamado a desempenhar.
Há muito tempo que se ultrapassou o domínio do chamado Estado de administração autoritária, em que a concepção fundamental era uma concepção de unidade orgânica, com relações de hierarquia absolutamente estabilizadas, numa estrutura piramidal das relações