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2424 | I Série - Número 043 | 24 de Janeiro de 2004

 

Por outro lado, fala também da produtividade e da contratação por objectivos, escondendo que o que tem estado por detrás desta linguagem e deste discurso é uma progressiva restrição dos recursos financeiros atribuídos às unidades de saúde e uma imposição de regras economicistas que prejudicam a qualidade dos serviços e diminuem a capacidade de muitas unidades de saúde responderem à missão que lhes está atribuída.
Estas alterações consagram, portanto, o dirigismo centralista do Ministério de Saúde, consagram o contrato individual de trabalho como regra, desvalorizando os direitos dos profissionais e fazendo crer que é aí, nos seus direitos e no seu vínculo à função pública, que residem os problemas das unidades de saúde, o que não é verdade. Estas alterações afastam a participação dos profissionais e consagram um modelo de financiamento insuficiente e de gestão economicista da saúde que não é admissível num Portugal que ainda precisa de melhorar e de investir mais nos seus cuidados de saúde.
O outro diploma que hoje apreciamos aqui tem a ver com as taxas moderadoras, o qual foi logo seguido, passadas umas semanas, da portaria que aumentou as taxas moderadoras. Este aumento representou um profundo agravamento dos custos da saúde, a juntar ao que muitos utentes pagam já nos medicamentos, quando os seus médicos não autorizam a substituição dos medicamentos de marca por medicamentos genéricos e se aplica o sistema de preços de referência, aprovado pela Governo e pela maioria, que, sem apelo nem agravo, impõe que os utentes paguem mais, nesses casos, do que aquilo que pagavam anteriormente, sem que tenham tido qualquer possibilidade de escolher outra opção.
Este agravamento dos custos junta-se também ao agravamento causado pela necessidade progressiva de quem ainda pode, ou de quem se endivida até para isso, recorrer ao sector privado, por falta de acesso aos serviços públicos de saúde em tempo útil e em condições aceitáveis.
Com este aumento, os principais prejudicados são os que têm menos recursos, porque são estes que mais necessidade têm de recorrer à oferta pública dos cuidados de saúde. Como não têm outras opções, terão de suportar o aumento que o Governo agora impôs. Os aumentos são de 30 a 40% nas consultas e nas urgências, quer nos hospitais, quer nos centros de saúde, e o Governo aumenta os actos taxados de 143 para 355. Muitos actos que até aqui eram feitos gratuitamente no Serviço Nacional de Saúde passam a ser pagos, onerando ainda mais as populações que a eles recorrem.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - É uma vergonha.

O Orador: - E, por exemplo, fazem algumas habilidades, se me permitem a expressão, relativamente a alguns meios de diagnóstico e de tratamento. Vejamos o exemplo da litotrícia, que é o tratamento para a chamada "pedra nos rins". Antes, o tratamento global custava 150€, que já era uma taxa elevada; agora, o Governo resolveu baixar essa taxa para 60€. O problema é que, antes, os 150€ abrangiam todas as sessões necessárias ao tratamento e, agora, os 60€ são pagos por sessão. Ora, como este tratamento implica, na maioria das vezes, quatro, cinco ou seis sessões, isto significa que, em alguns casos, o custo deste tratamento, já alto, duplica. E este é um exemplo que se multiplica por muitos outros tratamentos e meios complementares de diagnóstico.
Portanto, o que está por detrás deste decreto-lei é um agravamento real, e grave, das taxas moderadoras, que acentua a ideia de que, como dissemos desde o início da imposição das taxas moderadoras, nos governos do PSD anteriores a 1995, estas taxas ditas moderadoras não moderam nada, não servem para moderar um consumo eventualmente excessivo de cuidados de saúde, servem apenas para onerar as populações com mais um custo de um serviço que lhes devia ser prestado gratuitamente, e impedem, quanto mais aumentam os seus custos, quanto maiores são as taxas, o acesso de muitos cidadãos aos cuidados de saúde, porque o custo começa a ser cada vez mais oneroso.
As taxas moderadoras são cada vez mais encaradas como uma fonte de receitas próprias e isto não se desliga, evidentemente, da política de restrição financeira às unidades públicas, que são obrigadas a procurar receitas, neste caso através das taxas moderadoras. E esta é mais uma peça na política de subfinanciamento pelo Orçamento do Estado que o Governo impõe ao Serviço Nacional de Saúde.
De resto, desafio o Governo a provar que todas as taxas aplicadas são, como já dizia, desde 1992, o decreto-lei, menos de 1/3 do custo real, porque a verdade é que em muitas delas isso não está comprovado e serão, segundo se diz, nalguns casos, muito próximas ou até acima do custo real.
O Governo tem forma de nos garantir, aqui, que todas estão abaixo de um 1/3 do custo real, como diz o decreto-lei que as aprovou? Isso não está garantido!
Alarga-se a aplicação de taxas a actos até aqui gratuitos, numa curiosa e pelo menos um pouco forçada aplicação do princípio constitucional de que o acesso aos cuidados de saúde é tendencialmente gratuito. Não se percebe como é que o "tendencialmente gratuito" suporta o aumento de actos que passam a ser taxados. Mas esta é, sem dúvida, uma interpretação criativa que o Governo faz desta matéria, no seu conhecido incómodo com o texto constitucional.