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2926 | I Série - Número 052 | 14 de Fevereiro de 2004

 

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tivemos uma discussão em que todas as bancadas apresentaram o seu ponto de vista. Gostaria de voltar àquilo que estamos a discutir originalmente, que é o projecto de lei proposto pelo Bloco de Esquerda.
Este projecto prevê a prescrição médica da cannabis em condições medicamente controladas, seguindo as melhores práticas clínicas de investigação e aplicação.
Restringe-a a alguns casos concretos: doença terminal, dores crónicas e graves, náuseas graves, anorexia, subnutrição, perda de peso, nos casos de cancro e infecção com HIV, dores musculares crónicas e espasmos ou dores crónicas graves, em casos de esclerose múltipla, lesões ou doenças da medula espinal, acessos de epilepsia e dores crónicas em casos de formas extremas de artrite.
É um universo de patologias extremamente bem delimitado ao qual se pretende aplicar, seguindo o que outros países já fazem, a possibilidade de o médico, no seu melhor discernimento, aplicar medicamentos que possam diminuir a dor em relação a estas situações.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - A partir daqui gera-se uma discussão em que se confundem opções políticas com opções estruturantes do sistema de saúde.
Vários Deputados e Deputadas disseram que nenhuma planta tem uma cor política. Nada de mais verdadeiro! A escolha das políticas medicamentosas deve basear-se, única e exclusivamente, em boas práticas de investigação e conhecimento científico. Não reivindicamos nem mais, nem menos! O critério para que possa ser prescrito um medicamento com base em canabinóides é o mesmo que deve nortear a utilização, ou não, de um opiáceo em relação a estes casos. O critério que a agência pública de controlo da introdução de medicamentos deve determinar em relação a estes casos é exactamente o mesmo do que em relação a qualquer outro, e não é sobre isso que importa haver uma intervenção legislativa do Parlamento. Não é sobre isso!
Aquilo a que o Parlamento tem de olhar é para o quadro da informação disponível e para as decisões legislativas que estão aplicadas em países de referência, que, certamente, não estão mais atrasados que Portugal, pelo contrário, estão muito mais avançados do ponto de vista da investigação científica e da prática clínica, e saber se essa experimentação, essa capacidade e esse cuidado nos dão um caminho, ou não.
Citei a evidência científica, e vou repeti-la: três revistas científicas da área medicina, que são, não por acaso, as três mais importantes (não há nenhuma outra que se compare, em termos de significado científico, com estas): Lancet, New England Journal of Medicine e o Journal of the American Medical Associations. Estas revistas concluem, a partir de ensaios clínicos, em editoriais, em tomadas de posição formais, que comprometem os seus organismos, que esta mudança é indispensável.
Por isso, tribunais destes países, ou legisladores destes países, caminharam no sentido que aqui é proposto - por exemplo, o Supremo Tribunal de Ontário.
Gostaria de chamar a atenção para um outro detalhe: há um tribunal que dirige e verifica toda a actuação da agência pública federal norte-americana sobre a aplicação de drogas, a DEA. Esse tribunal decidiu intimar a estrutura federativa a aplicar a correcção das tabelas de substâncias, de tal modo que passasse a ser possível compor medicamentos na base de derivados canabinóides.
E o mesmo acontece com o relatório da Câmara dos Lordes, que não é o relatório de um Deputado individual, não é uma opinião avulsa, é uma decisão substancial, colectiva, do Comité Científico de Tecnologia, que diz o seguinte: "recomendamos que o Governo deve tomar medidas para retirar a cannabis e a resina canabinóide da proibição do uso de drogas, para permitir aos médicos prescrever medicamentos com base nos preparados de cannabis". Isto é o que temos à nossa frente.
Dito isto, perguntam-nos: quais princípios activos? Qual a dosagem? Qual a forma de administração? Não compete à lei determinar a dosagem, não compete à lei determinar a forma de administração, isso é uma decisão do médico e é tutelada pelo INFARMED e pelos organismos competentes para escolher que tipo de medicamentos, que posologia, como é que deve ser aplicada. Não é a lei que tem de o fazer!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - O que a lei tem de determinar é se sim ou não quebra um tabu absurdo, que é contestado e posto em causa pela experiência de ensaios clínicos e pela experiência terapêutica e que nós só podemos homologar, porque corresponde às melhores práticas científicas nestes países que acabei de citar.
É certo que não conhecemos todos os princípios activos da cannabis, como não conhecemos os de muitas outras plantas. Conhecem-se razoavelmente dois: o THC (tetrahidrocanabinol) e o CBD