I SÉRIE — NÚMERO 26
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sabemos o que fazer, aumentamos as penas, o que para nós não é receita boa! —, mas depois na norma revogatória não diz nada. Portanto, ficaríamos com dois regimes legais sobrepostos. Ficaria o intérprete com a tarefa de tentar discernir o que é que da lei posterior revogava a lei anterior, criando, de facto, um problema.
Isto para dizer que o facto de as iniciativas circunscreverem o aperfeiçoamento desse diploma revela que não estamos a partir do zero. Isto é, não estamos aqui a discutir algo que careça de um enquadramento legislativo inexistente. Não é verdade. Já existe a lei e a questão é aperfeiçoá-la. E nós entendemos que ela pode e deve ser aperfeiçoada.
Porém, isto não deve ser feito sob pressão dos acontecimentos, como que dando a ideia de que, quando um determinado fenómeno — neste caso, a corrupção no desporto — entra na agenda mediática, todos temos de ir a correr atrás dos acontecimentos, fazendo propostas, como se as nossas propostas pudessem alterar o que está para trás. Ora, não é assim. Os fenómenos já detectados de eventual corrupção no fenómeno desportivo terão de ser regulados de acordo com a lei existente à data, aquela que vigorava no momento em que os factos foram praticados. Para isso o essencial é que a justiça tenha condições para funcionar e que haja mecanismos de prevenção, de investigação e de punição daquilo que for detectado.
Portanto, não somos entusiastas de medidas avulsas tomadas sob pressão de qualquer acontecimento mediático.
Obviamente que encaramos positivamente aperfeiçoamentos ao sistema legal existente e, a esse respeito, importa dizer o seguinte: pensamos que não se devem criar distorções na nossa ordem jurídica. Assim, o que for aprovado em matéria de corrupção deve ser compatibilizado com o que presentemente está a ser discutido em matéria de Código Penal. Importa reparar que o crime de corrupção passiva, por exemplo, é punido com uma moldura penal superior às que estão previstas nos diplomas em discussão, mesmo com o agravamento proposto pelo PSD.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Podemos discutir qual delas é mais adequada. Podemos discutir se, de facto, será excessiva, para aquilo que se quer punir, a punição de 1 a 8 anos de prisão, hoje prevista no Código Penal, dado que o que está previsto no diploma em discussão, mesmo com os aumentos de penas, só vai até cinco anos — eventualmente, justificar-se-á, mas temos de discutir. Podemos, mesmo, discutir se consideramos que este é um fenómeno de corrupção menos grave do que outros, ou não.
Portanto, esta questão está em aberto. Devemos é evitar que haja disparidades de moldura penal que possam criar confusão e que, como é óbvio, não são boas para a unidade que o sistema jurídico deve ter.
Um outro aspecto referido na proposta de lei tem a ver com a questão da responsabilidade penal das pessoas colectivas. Evidentemente que isso se justifica. A responsabilidade penal não apenas das pessoas individuais mas também das pessoas colectivas, sem prejuízo da responsabilidade pessoal que deva ter lugar, é uma tendência que tem vindo a verificar-se nas ordens jurídicas contemporâneas. No entanto, se isso for feito antes de ser consagrado, com carácter geral, no Código Penal é que já não está bem. Não seria adequado que fosse introduzido exclusivamente, em primeiro lugar, na área da corrupção desportiva, a responsabilidade das pessoas colectivas antes de isso ser feito, com carácter geral, no Código Penal.
Isto é, assentemos, em sede de discussão do Código Penal, que é adequado responsabilizar penalmente as pessoas colectivas e, depois, podemos ver que projecção é que esse princípio geral deve ter na área da responsabilidade penal das pessoas colectivas ligadas ao desporto. Fazer o contrário é que não seria adequado. Não podemos, em primeiro lugar, punir as sociedades desportivas, os clubes desportivos, as associações e federações desportivas, sem que, na nossa ordem jurídico-penal, esteja previsto, com carácter geral, o princípio da responsabilidade penal das pessoas colectivas. Nós não somos contra esse princípio, pelo contrário, mas entendemos que as coisas devem ser feitas pela ordem que é natural serem feitas.
Isto para dizer que pensamos que estas iniciativas têm um carácter limitado e que o combate à corrupção, mesmo do ponto de vista legislativo, não deve limitar-se a isso. Nós próprios anunciámos a intenção de apresentar propostas concretas que contribuam para o aperfeiçoamento do nosso sistema legal de prevenção e de combate à corrupção e pensamos que será possível, tendo em conta o que já foi anunciado, até pela bancada do Partido Socialista, no início do próximo ano civil, fazermos aqui um debate já com iniciativas concretas dos vários partidos sobre essa matéria para o qual nós também nos propomos contribuir.
Relativamente a estas iniciativas, mesmo tendo em conta o seu carácter circunscrito, pela nossa parte, haverá todo o empenho em que, do seu debate na especialidade, possa resultar algum aperfeiçoamento útil para a legislação hoje existente em matéria de combate à corrupção no âmbito do fenómeno desportivo.
Reconhecemos a importância social deste fenómeno, reconhecemos a importância de combater a corrupção que possa desenvolver-se a esse nível e, nesse sentido, encaramos bem a apresentação de iniciativas sobre essa matéria e pensamos que, corrigido alguns aspectos que nos parecem menos felizes ou menos conseguidos do ponto de vista técnico, podemos dar um contributo limitado e singelo, ainda assim que pode ser útil, para alterar o decreto-lei de 1991.
Agora, a questão não é apenas para que lei exista, porque já existe; a questão é que, depois, existam mecanismos que, na prática, impeçam a ocorrência de fenómenos desta natureza e que eles, quando