5 DE JANEIRO DE 2007
23
animais.
Este julgamento não seria aceite em nenhum país que respeite os princípios do direito e é uma vergonha para os aliados de George Bush.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Orador: — Mas é também um crime político, porque acentua a guerra civil no Iraque. As suas consequências vão marcar profundamente o futuro do Iraque, agudizando o já problemático relacionamento entre as suas comunidades e a violência sectária que marca o dia-a-dia deste país.
Como bem destaca o editorial do Financial Times de há dois dias, a execução de Saddam representa o abandono pelo Governo de maioria chiita das pretensões a governar para todos os iraquianos e foi um acto de vingança deliberado para celebrar a nova hegemonia.
É certo, Sr.as e Srs. Deputados, que Saddam foi uma das personagens mais repugnantes da história mundial das últimas décadas, mas é igualmente certo que isso não serve nem pode justificar tudo.
Saddam foi condenado por crime cometido em 1982, altura em que era um dos principais aliados dos Estados Unidos da América. Até 1991 —até à invasão do Kuweit —, diversos governos apoiaram a sua acção e forneceram-lhe armas de destruição massiva e/ou munições, como, aliás, foi o caso do governo dos Estados Unidos da América, mas também do governo português, então dirigido por Cavaco Silva, que tinha como ministro dos Negócios Estrangeiros o actual Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É verdade!
O Orador: — Mesmo o principal massacre contra a população curda, em 1988, ocorreu três anos antes do embargo internacional ao regime iraquiano, muito antes de Portugal parar de fazer negócio com o torcionário que agora foi executado, o que só aconteceu em 1991, data até à qual o governo português vendia armas e munições a este regime, que, aliás, era um dos seus bons clientes.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É verdade!
O Orador: — Foi com a aprovação de Washington e com o gás venenoso fornecido pela Alemanha Ocidental que Saddam arrasou Halabja com armas químicas em plena guerra entre o Irão e o Iraque, como, aliás, o próprio Saddam Hussein admitiu no seu julgamento.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Bem lembrado!
O Orador: — Os padrões dúplices usados pela Casa Branca não deixam nunca de nos espantar. Suharto, Pinochet, Videla, Strossner, Somoza e tantos outros protegidos por Washington, esses sim, são os ditadores de confiança, os bons clientes da Administração norte-americana.
Mas o que é certo é que nenhuma justiça baterá à porta dos que criaram o desastre no Iraque de hoje.
Bush e Blair nunca serão julgados nem nunca responderão pelos milhares de crimes e de mortos que provocaram com a invasão e ocupação do Iraque.
Sr.as e Srs. Deputados: Só mesmo George Bush é que poderia saudar esta execução. O Presidente norte-americano e as forças ocupantes do Iraque são directamente responsáveis por este crime. Aliás, a declaração de Bush sobre esta decisão — considerando-a um «marco para a democracia iraquiana» — ilustra perfeitamente o seu apoio e compromisso com a aplicação da pena de morte.
Compreende-se a vontade e a pressa de George Bush em liquidar e apagar Saddam. Como se já não bastasse a crescente oposição à guerra na sociedade americana, é a própria Casa Branca que se confronta, cada vez mais, com um número crescente da altas patentes militares que defendem a retirada das tropas norte-americanas de uma guerra entretanto já perdida.
A democracia prometida por Bush e seus companheiros nesta louca aventura de guerra tornou-se neste cenário: a substituição da ditadura liderada pela minoria sunita pelo totalitarismo da opressão da maioria xiita sobre as outras comunidades. Pelo meio morrem milhares e milhares de iraquianos e 3000 soldados americanos. O Iraque vive, há três anos, uma guerra civil, que tem destruído o país e minado todo o Médio Oriente.
A pronta condenação pela União Europeia da execução merece, naturalmente, ser sublinhada, mas convém não esquecer, no entanto, que alguns dos seus membros apoiaram ou participaram na invasão do Iraque — foi o caso do governo de Inglaterra, sob Tony Blair, ou do governo de Portugal, sob Durão Barroso —, e participaram na criação deste mesmo regime fantoche que conduziu à execução de Saddam.
Não nos esquecemos que foi na Cimeira das Lajes, em território português, com o aval do então governo PSD/PP, que foi dada a ordem de partida para a invasão do Iraque, iniciando uma guerra à revelia do direito internacional e suportada pela mentira grosseira das armas de destruição massiva.
Vozes do BE: — Muito bem!