19 DE JANEIRO DE 2007
21
O Orador: — Devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que esta Câmara e o País mereciam de V. Ex.ª maior respeito e maior consideração ética e política.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Ministro, eu gostava de falar um pouco sobre a estrutura de financiamento da despesa do sistema de saúde em Portugal e de procurar desmontar consigo o argumento que é muito utilizado, designadamente pelo Governo, de que Portugal apresenta uma exagerada despesa em saúde, que Portugal gasta muito em saúde, e daí as suas orientações no sentido de cortar a despesa com a saúde.
Se formos analisar os estudos da OCDE, verificamos que essa ideia, Sr. Ministro, é, no mínimo, controversa, para não dizer que é uma verdadeira patranha. Assim, se verificarmos a despesa per capita em Portugal, em paridade de poder de compra, concluímos que ela está em 15.º lugar na União Europeia a 15 e é mais ou menos metade da mesma despesa pública na Alemanha.
Mas o mesmo estudo diz mais, Sr. Ministro: diz que quem paga os custos da saúde são, em grande medida, os cidadãos quando estão doentes, isto é, pagam-nos directamente. E neste aspecto, Sr. Ministro, o estudo da OCDE também mostra que Portugal aqui não está em 15.º lugar mas, sim, em 19.º. Isto é, Portugal está na cauda da Europa quando se analisa sobre quem recaem os custos da saúde.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Podia dar outros números, por exemplo, como é que se distribui o pagamento acrescido entre o Estado e os utentes relativamente aos aumentos que os custos da saúde vão sofrendo, mas o Sr.
Ministro sabe bem melhor do que eu que os números deste estudo desmentem as ideias preconcebidas de que Portugal gasta muito em matéria de saúde.
São estes números, Sr. Ministro, que melhor desmentem os seus argumentos; são estes números que tornam mais chocante o corte no investimento público, que o senhor promove e vai promover, por exemplo, na saúde em 2007, que fazem regressar o investimento nesta área a níveis inferiores àqueles que o Sr.
Ministro, quando ministro do governo do Eng.º António Guterres, também propôs em termos orçamentais.
São 80% a menos, são cortes de 80% relativamente ao que foi inscrito nesse ano de 2000.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma vergonha!
O Orador: — Portanto, importa perceber como é que o senhor vai dar seguimento a esta política de desresponsabilização do Estado na área da saúde. Sr. Ministro, gostava de perceber como é que vai prosseguir esta política. Não é se a vai prosseguir, porque já percebemos que sim, é como é que vai prosseguir.
Vai, por exemplo, privatizar os hospitais de parceria público-privada e quando? Tenciona ou não prosseguir a passagem dos centros de saúde para entidades privadas e das unidades de saúde familiar para instituições ou grupos privados? Até quando é que o Sr. Ministro vai prosseguir neste objectivo e com esta direcção? Até quando é que o Governo vai privatizar a saúde em Portugal? Onde e quando é que o Sr. Ministro vai parar? É quando o Serviço Nacional de Saúde estiver completamente espatifado e estilhaçado? Será esse, finalmente, o seu limite? Diga-nos, para nos tirar estas dúvidas. Confirme-nos se é esse ou não o seu limite, Sr. Ministro.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.
A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, o balanço que aqui nos trouxe, sem ser novidade, não corresponde nem de longe nem de perto ao que os portugueses sentem e vivem no diaa-dia. Vou dizer-lhe o que é que os portugueses sentem: sentem permanentes ziguezagues e alguns dislates nas posições públicas que o Sr. Ministro toma e sentem também o descontentamento generalizado de doentes, de profissionais, de autarcas e da população em geral. E a receita, Sr. Ministro, é sempre a mesma: cortar primeiro, sem esclarecer, para ver depois; fechar sem criar alternativas; tirar sem dar nada em troca; exigir sem criar expectativas; encerrar serviços de saúde nos cuidados primários; encerrar urgências hospitalares; encerrar maternidades; reduzir a comparticipação do Estado no preço dos bens de saúde; agravar as taxas moderadoras em mais de 25%; criar novos impostos sob a forma de taxas de utilização no internamento e no ambulatório;…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
A Oradora: — … e, por fim, o anúncio de mais um novo imposto para a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.