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62 | I Série - Número: 079 | 4 de Maio de 2007

despesas com necessidades básicas passaram a ser a incógnita D, os encargos com a habitação a incógnita H e o rendimento do agregado familiar passou a ser considerado num sistema de escalões. Tudo isto se passou a conjugar matematicamente em fórmulas suficientemente compostas com chavetas e parêntesis rectos e curvos, utilizando todas as operações aritméticas. O apuramento da insuficiência económica dos portugueses passou a depender do preenchimento burocrático de um formulário, como se a realidade pudesse ser capturada por variáveis contidas entre chavetas.
Mas esta teimosa realidade não se quis adaptar ao apregoado rigor do novo regime legal. Demorou pouco até se perceber que, com esse regime, era a justiça que ia ficando entre parêntesis e o acesso ao direito e aos tribunais começava a tender para zero.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Obviamente só para aqueles cuja condição económica não cabia nas grelhas das tabelas do apoio judiciário.
Por isso, urgia mudar o sistema. Já nesta Legislatura, com esta maioria do Partido Socialista, o PCP trouxe de novo a discussão do acesso ao direito e aos tribunais à Assembleia da República, tendo apresentado os projectos de lei n.os 187/X e 188/X. Dessa discussão resultou clara a necessidade de rever o regime de acesso ao direito, sobretudo tendo em conta a importância que assume o recurso aos tribunais para o exercício de direitos numa conjuntura de agravamento das condições de vida e de trabalho para a generalidade dos trabalhadores portugueses.
O Partido Socialista, apesar de reconhecer a necessidade de rever o sistema, optou, então, por rejeitar as iniciativas do PCP. Na altura — em Maio de 2006 — o argumento de que o Governo tinha em preparação uma proposta de lei que previa um sistema «mais célere, mais racional e integrado» foi motivo bastante para o PS adiar a resolução de um problema que continuou a atingir milhares de portugueses.
Entretanto, a situação na justiça agravou-se com a continuação do processo de privatização do notariado, a celebração do pacto parlamentar para a justiça entre PS e PSD e as suas decorrências e com a apresentação pelo Governo de propostas de revisão do mapa judiciário, prevendo o encerramento de tribunais.
A revisão do regime de acesso ao direito e aos tribunais é que tardou, apesar das promessas que vinham sendo feitas desde o fim de 2005.
Confrontados que estamos, finalmente, com a proposta de lei do Governo, constatamos que, afinal, a «montanha pariu um rato». Talvez possamos vir a assistir a um alargamento do âmbito de concessão do apoio judiciário, mas não estamos, certamente, perante a resolução dos problemas de fundo que temos identificado até aqui. Continuaremos perdidos na racionalização matemática de questões sociais, em nome de um rigor que estabelece limites matemáticos aos direitos constitucionais.
A proposta de lei que hoje temos em discussão insiste, assim, na prioridade do acessório face ao que é essencial. Insiste numa solução burocrática que transforma decisores em autómatos e que deixa de fora dos tribunais aqueles que, não sendo os mais pobres dos pobres, não dispõem ainda assim dos meios económicos para fazer face às despesas com a justiça.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — E temos mais: os profissionais forenses que participem neste sistema de acesso ao Direito poderão ser nomeados para lotes de processos e escalas de prevenção, mas deixam de ter direito a uma remuneração para passarem a receber uma compensação pelo seu trabalho, sem direito a reembolso das despesas que eventualmente venham a suportar. Fica a dúvida: estamos perante meras alterações de natureza semântica e organizativa ou o futuro para estes profissionais será, mesmo, o de mais trabalho com menos retribuição? A tudo isto, o PCP propõe uma alternativa que não tem a presunção de aprisionar a realidade entre chavetas, mas que tem em conta as suas complexidade e dinâmica próprias.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Propomos a devolução ao juiz da competência para a decisão de concessão do apoio judiciário e a possibilidade de este ordenar todas as diligências que entenda necessárias e indispensáveis ao apuramento do rendimento. Propomos a consideração de situações de presunção de insuficiência económica, identificando, entre outras, as situações dos desempregados, das vítimas de tráfico de seres humanos, de exploração através da prostituição ou de violência doméstica. Propomos, igualmente, a isenção de custas em processos do foro laboral para todos os trabalhadores e, em algumas situações, para os funcionários e agentes da Administração Pública. Propomos, ainda, a fixação de um prazo objectivo para o pagamento de honorários aos profissionais envolvidos no sistema de acesso ao Direito.
Damos, ainda, cumprimento ao Acórdão n.º 654/2006 do Tribunal Constitucional, restringindo o conceito de agregado familiar para efeitos de consideração dos rendimentos a ponderar.
No PCP, continuamos a entender que uma correcta organização do sistema de acesso ao Direito impli-