19 | I Série - Número: 101 | 5 de Julho de 2007
«miar de um gato», com a transformação das actuais provas de aferição em exames nacionais
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Já não era mau!
O Orador: — Felizmente que as propostas são tímidas, porque já assim elas não contribuem para a melhoria da qualidade do sistema educativo português e da formação dos portugueses, podendo mesmo contribuir para o agravamento de alguns problemas já hoje existentes.
Para o PCP, boas e corajosas seriam as propostas (que o CDS, infelizmente, se abstém de apresentar) que pusessem fim à perseguição aos docentes que tem sido desenvolvida pelo actual Governo, em que o Estatuto da Carreira Docente aprovado recentemente é apenas um dos exemplos; boas e corajosas seriam as propostas que pusessem fim à destruição da rede de equipamentos escolares, à alienação do património público da rede escolar, ou à política de encerramento de escolas um pouco por todo País;…
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — … boas e corajosas seriam as propostas que permitissem a verdadeira adaptação do processo educativo em função das exigências e das necessidades concretas de cada contexto escolar e educativo; boas e corajosas seriam as propostas que invertessem as orientações do Governo no que diz respeito às necessidades educativas especiais, visto que o Ministério da Educação se prepara para enterrar definitivamente o conceito de escola inclusiva e criar e aprofundar a realidade de exclusão a que já hoje muitas das crianças com necessidades educativas especiais estão sujeitas.
Infelizmente, o CDS insiste em fazer dos exames nacionais uma solução que, como há muito está demonstrado, não soluciona coisa alguma.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o Partido Ecologista «Os Verdes» é óbvio que tanto para o CDS-PP como para a direita em geral o «cavalo de batalha» são os exames e a avaliação dita «com consequências». Aliás, na semana passada, durante o debate de uma iniciativa que se debruçava sobre as questões da disciplina e do novo estatuto do aluno dos ensinos básico e secundário, foi curioso verificar que as duas bancadas da direita perderam muito tempo para trazer à liça as questões dos exames nacionais, em vez de falarem do assunto em apreço.
Esta questão dos exames, que o CDS tanto apregoa como sendo fundamental para realizar uma verdadeira avaliação, uma avaliação dita «com consequências», não é mais do que a avaliação que reprova os alunos e que processa a filtragem e o afunilamento social. É a avaliação que faz a triagem, antes de mais, dos que, na maior parte dos casos, porque tiveram outras condições socioeconómicas, porque beneficiaram de outro apoio familiar ou de modelos familiares formativos positivos ou, ainda, de um clima e convivência mais ricos, com acesso a outras experiências mais enriquecedoras e com valorização do conhecimento, obtêm, com mais ou menos trabalho, com mais ou menos mérito, resultados positivos acima da média. Mas também é esta avaliação que separa aqueles que não beneficiaram desses percursos de vida pessoais tão favoráveis, porque as condições socioeconómicas e culturais das respectivas famílias não lhes permitiram mais. De facto, a exclusão social reproduz-se muitas vezes na escola, que, na prática, não tem condições para combater o clima adverso da falta de coesão social e para promover a igualdade de oportunidades, razão pela qual relegará para as margens do sistema os menos beneficiados. Estes alunos ficam, muitas vezes, numa situação que é a antecâmara da desmotivação e a verdade é que, não havendo meios nem projectos para a sua recuperação, essa situação passa a ser a antecâmara do próprio abandono e insucesso escolares.
A lógica desta iniciativa que hoje nos é proposta é a da estratificação e das desigualdades sociais, algo de absolutamente natural e imutável para a direita. Para além disso, consagra-se ainda a ideia retrógrada e liberalista de que os alunos são, à partida, todos iguais, dependendo as melhores ou piores notas que cada um tira exclusivamente do seu trabalho e do seu mérito. Só que esta lógica, Srs. Deputados, esbarra num problema. É que a realidade demonstra-nos que não é assim. Infelizmente, na nossa sociedade, em que há cada vez maiores desigualdades, os alunos não chegam todos nas mesmas condições às escolas nem chegam todos nas mesmas condições ao final do ano lectivo, sem que tal dependa apenas do seu trabalho ou mérito. Não são, infelizmente, todos iguais. Antes pelo contrário, são todos diferentes.
O problema que nos deve preocupar é o da procura das políticas, das medidas, dos investimentos e das apostas que fazem falta na escola pública para que esta possa responder cabalmente à importantíssima missão que lhe está atribuída: a formação de cidadãs e cidadãos do futuro, de pessoas preparadas com habilitações e com uma formação sólida do ponto de vista cívico e dotadas de valores humanistas, de solidariedade, de justiça e de igualdade. Queremos que seja esta a formação a estar presente na escola pública democrática.