17 | I Série - Número: 037 | 19 de Janeiro de 2008
aumento da oferta, um regime de semi-exploração do indivíduo, com empresas a aceitarem estagiários todos os anos, sem qualquer despesa com os mesmos e sempre num regime de rotatividade e gestão da expectativa dos jovens, que dão o seu melhor por alcançar um contrato, que nunca existe.
Há jovens que estagiam durante anos, sem carreira contributiva, sem qualquer remuneração, sem qualquer protecção social, no aproveitamento de uma designação de «estagiário» que há muito ultrapassou os limites da própria lei.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É um facto!
A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — O Estado, esse, tantas vezes dá o pior dos exemplos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Também é um facto!
A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados: A crise de emprego que se vive hoje, e que é sentida de forma acentuada entre os jovens com mais qualificações, é transversal e subverteu um princípio básico da realização dos estágios curriculares ou profissionais: quando estes deveriam funcionar numa lógica de aprendizagem em contexto de trabalho, tornaram-se, ao invés, num obstáculo à entrada de jovens no mercado de trabalho, porque a oferta constante de estagiários não remunerados leva a que algumas necessidades dos serviços sejam sempre satisfeitas com o recurso a esta mão-de-obra.
A sensibilidade do Governo para com as questões que afectam os jovens é já conhecida. Dou apenas três exemplos: a quase duplicação do valor da contribuição mínima para a segurança social, que inibe, por exemplo, o empreendedorismo jovem; a diminuição drástica dos apoios ao arrendamento jovem e, por conseguinte, à emancipação; o fim dos estágios remunerados para os estudantes das vias de ensino das universidades portuguesas.
Este último exemplo com uma particularidade: a Sr.ª Ministra da Educação assumiu que, por constrangimentos orçamentais, terminou com a remuneração dos estágios. O Sr. Primeiro-Ministro, no seu registo, disse outra coisa: que os estágios tinham acabado para tornar o sistema de acesso aos estágios muito mais justo: agora ninguém tem remuneração! Mas logo atirou com uma promessa: afirmou, na Assembleia da República, que «serão atribuídas ajudas de custo e bolsas para que aqueles que antes tinham direito a um estágio remunerado e que, logo, saíam da universidade auferiam um ordenado de professor possam beneficiar de apoio por parte do Estado para acederem a um estágio no sistema educativo».
Esta promessa também caiu, como tantas outras. A Sr.ª Ministra da Educação, questionada recentemente pelo PSD sobre esta matéria, teve dificuldade em localizar essa promessa…, todos temos essa dificuldade com as promessas do Sr. Primeiro-Ministro!! E chegamos ao projecto de lei hoje em discussão. Acompanhamos o PCP no diagnóstico, mas divergimos quanto às soluções, neste caso específico das medidas apresentadas neste diploma. Esta iniciativa melhorará a vida dos nossos jovens e sua situação face ao emprego? A iniciativa, que com certeza é bem intencionada, é nalguns pontos vaga, carecendo de definições. Não define, por exemplo, de que forma o Estado garante as ajudas de custo, de alimentação e, sobretudo, da habitação, assim como o seu impacto financeiro.
Pela nossa parte, afirmamos convictamente que a actual situação por que passam tantos e tantos jovens portugueses exige que equacionemos uma diferente regulamentação geral dos estágios profissionais, acabando com aquelas que são as piores práticas neste domínio.
Consideramos que o diploma não resolve o problema do abuso da figura do estágio por parte das empresas de acolhimento ou mesmo por parte de serviços do Estado. Também não visa resolver o grave problema do desajustamento do mercado de trabalho à oferta.
Na nossa opinião, a solução está precisamente do lado das empresas, dos estímulos à empregabilidade, dos apoios à inovação e ao empreendedorismo, de regimes fiscais favoráveis à criação de emprego para jovens, ao fim da «praga» dos recibos verdes, que roçam a ilegalidade e da criação de condições para que as empresas sintam a mais-valia de terem estagiários nas suas estruturas, formando-os e apoiando-os como seus futuros quadros, e dando-lhes reais condições de realização profissional.
Consideramos que estes problemas não se resolvem com mais um subsídio a atribuir pelo Estado. De resto, esta proposta poderia mesmo vir a ter um efeito perverso: ajudar a perpetuar um sistema que promove estágios fictícios que não passam de verdadeira exploração de muitos jovens trabalhadores.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — No final, acaba o estágio, acaba-se o subsídio e a empresa recebe outro estagiário no momento seguinte, o que, embora signifique uma vantagem financeira para o estagiário, não passa de um paliativo para o sistema.
Embora o PSD não acompanhe as soluções apresentadas, saúda o Grupo Parlamentar do PCP pela oportunidade e abordagem deste tema.