53 | I Série - Número: 048 | 15 de Fevereiro de 2008
Perante esta realidade, o Governo PS foi remendando aqui e ali a legislação, distribuiu os processos dos grandes centros pelos tribunais de todo o País e foi convidando os cidadãos a desistirem das acções intentadas, preocupado que estava em resolver o problema estatístico sem ter que reforçar os meios do sistema judicial.
É então que surge o pacto! PS e PSD, tantas vezes unidos de facto nas políticas praticadas, assumem que, na área da justiça, há casamento e de papel passado!
Risos do PCP.
O resultado do pacto na acção executiva é-nos agora apresentado na proposta de lei que discutimos. Para o PCP, as alterações ora propostas representam, afinal, o aprofundamento da reforma levada a cabo em 2003 naquilo que ela revelou ter de mais preocupante e negativo: o caminho de privatização da justiça.
As críticas que nos merecem as alterações em discussão centram-se em três aspectos essenciais.
Em primeiro lugar, parece-nos perigosa a solução de libertar o agente de execução da dependência funcional do juiz para o colocar na dependência do exequente, aprofundando a privatização de funções que se revestem, por vezes, de carácter essencialmente público. Quando se prevê a possibilidade de livre destituição do agente de execução, criam-se as condições para que este actue sujeito às orientações e interesses do exequente, mesmo quando se lhe atribuem funções que impõem imparcialidade e isenção.
Com que garantias dos direitos do executado decorrerão as penhoras de bens móveis no seu domicílio, estando o agente de execução sujeito à ameaça de destituição pelo exequente? Com que liberdade irá o agente de execução decidir o requerimento apresentado pelo executado para redução ou isenção de penhora de rendimentos? Sujeitar-se-á o agente de execução a decidir livremente quando pende sobre ele a ameaça de destituição pelo exequente? Um segundo aspecto que nos merece crítica diz respeito à introdução de mecanismos de resolução alternativa de litígios, os centros de arbitragem voluntária.
O texto da proposta de lei e as explicações dadas pelo Governo, em sede de audição na comissão parlamentar, não esclarecem o papel reservado à arbitragem neste âmbito. Aliás, a dificuldade dessa explicação é óbvia se tivermos em conta que, no âmbito do processo executivo, já existem direitos reconhecidos, já existe um título executivo e, na maior parte dos casos, existe já um mandatário que procura um acordo para dar execução ao título de que dispõe.
Fica assim a preocupação relativa aos contornos que virá a assumir a arbitragem, sobretudo se o seu afastamento por uma das partes tiver como consequência a responsabilização pelo pagamento de custas.
Um terceiro e último aspecto objecto de crítica é o da criação de listas de despojados de património. Esta medida é, aliás, uma boa caricatura deste Governo e deste PS que pactua com o PSD: corajosos a propor listas públicas de quem não tem bens para pagar dívidas, mas temerosos no levantamento do sigilo bancário para combater o enriquecimento ilícito e a corrupção.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Para terminar, duas preocupações quanto à constitucionalidade de normas propostas no Decreto autorizado.
A primeira, relativa à alteração proposta para o artigo 824.º do Código de Processo Civil, na medida em que atribuir ao agente de execução competência para decidir numa situação em que existe conflito de interesses pode pôr em causa o princípio de reserva de jurisdição por se atribuírem funções jurisdicionais a quem não é juiz.
A segunda, relativamente à norma do artigo 13.º do Decreto autorizado, que prevê a regulamentação por portaria de matéria compreendida na reserva relativa de competência da Assembleia da República, uma vez que se trata da organização de entidades não jurisdicionais de composição de conflitos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Por falta de tempo, não por falta de oportunidade, fica aqui por discutir a questão que determina a eficácia desta e de qualquer outra reforma processual, a questão dos meios ao dispor do sistema judicial.