I SÉRIE — NÚMERO 45
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numa lei de 2008, cuja concretização deveria ocorrer até ao final de 2012 e estar hoje a funcionar com
normalidade.
Possuída de uma atitude de autossuficiência, a Ministra da Justiça e, com ela, o PSD e o CDS acharam por
bem fazer tábua rasa do trabalho anterior.
As consequências são deprimentes: a reforma da organização judiciária, dois anos e meio depois, está por
fazer. É um tempo irrecuperável no combate de todos os dias contra a morosidade e pela qualidade da justiça.
Lembremos os factos.
Em setembro de 2006, com o PS no Governo, o PS e o PSD assinaram um acordo político-parlamentar
para a reforma da justiça. Foi um passo positivo para a estabilização das reformas. Mas, em vésperas de
eleições autárquicas, o mesmo PSD denunciava o entendimento firmado com o PS, invocando divergências
quanto ao mapa judiciário. Opuseram-se com o argumento de que 39 circunscrições judiciais era pouco e
exigiram um número equivalente ao dos círculos — 54. Agora, reduziram as comarcas de 39 para 23. Exigiram
o mais e acabaram no menos. Verdadeiros cata-ventos.
Mas não é tudo. Em 2008, reclamaram para que «nem um só tribunal fosse fechado». Agora, conforme se
anuncia, preparam-se para fechar 47 tribunais e não caem para o lado de arrependidos.
Entretanto, a organização judiciária continua por executar, devido a uma política errática e destituída de
base consensual. Como diz a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, «a proposta de reorganização que
ora se comenta é contraproducente, afasta os cidadãos dos tribunais e desautoriza a justiça, reconduzindo o
seu âmbito e objetivos a critérios meramente economicistas (…)».
Também em relação ao plano de ação para a justiça na sociedade da informação, os falhanços não são
menores. Foi prometido, para estar pronto em 2013, um portal para a justiça e uma plataforma contabilística
para os registos, mas não apareceram. O sistema integral de informatização da gestão processual, em nome
do qual se bloquearam os vários projetos anteriores de inovação, foi adiado para 2015. E, para 2016, foi
remetida a Plataforma de Interoperabilidade de Investigação Criminal (PIIC). Atrasos e mais atrasos!
Em consequência, os recursos continuam a subir e a descer escadas, à maneira antiga; não há
plataformas de ligação eletrónica entre os tribunais, os registos e os cartórios, como não há com a segurança
social, ou entre os tribunais tributários e a administração fiscal, ou na partilha de informações por parte dos
órgãos de polícia criminal.
Mas todos se lembram do que representou de inovação, com a governação PS, o Cartão de Cidadão, o
passaporte eletrónico, o Diário da República eletrónico, a Empresa na Hora, o Casa Pronta, o Nascer Cidadão,
o processo eletrónico a partir de 2008, o desenvolvimento do balcão único e as lojas do cidadão, entre tantas
medidas do programa Simplex.
Aplausos do PS.
Em contraste, o que agora temos, em matéria de desburocratização, é a penalização dos utentes dos
serviços da justiça e a proteção dos interesses corporativos.
Entretanto, a realidade que mais dói abate-se à nossa volta. Em 1 de fevereiro último, o número de
reclusos nas prisões era de 14 172, mais 2700 presos em relação a 2010. As cadeias estão sobrelotadas, a
«rebentar pelas costuras» e em défice de guardas prisionais.
Protestos do PSD.
Perante o alarme da situação, esperar-se-ia uma política ativa de prevenção criminal, de proteção das
vítimas, de ressocialização dos delinquentes, em especial os primários e os mais jovens.
O que o Governo faz é apenas desresponsabilizar-se. Está a desrespeitar a Constituição e a lei e não
apresentou a proposta de lei de orientação da política criminal, como devia. É um escândalo.
E a mesmíssima falta de sentido de Estado está patente na omissão de nomeação, há mais de um ano, do
representante português na rede europeia do Eurojust.
Por outro lado, estamos perante um caso, ou de manifesta ignorância ou de patente má-fé, quando a Sr.ª
Ministra da Justiça anuncia criar um «sistema de referenciação de predadores sexuais», mas omite, perante a