I SÉRIE — NÚMERO 49
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O que tivemos agora e ao que assistimos, desde a desorientação inicial do Ministro Miguel Relvas, foi
precisamente ao inverso, ou seja, foi ao deitar fora o que estava bem feito e procurar criar um problema onde
ele não existia.
Por isso, concentremo-nos no que é fundamental e é sobre o fundamental que eu queria colocar uma
questão à Sr.ª Deputada.
Fundamentalmente, o problema da RTP é de financiamento. Pedia-lhe que comentasse também se —
dados que se tornaram públicos, no quadro destas audições — a opção do Governo em, por um lado, acabar
com a indemnização compensatória e, por outro, em substituí-la por um aumento da CAV, que é insuficiente,
não vai, claramente, cavar ainda mais o fosso em que a RTP se encontra.
Mas há um aspeto que é importante sublinhar novamente: numa conferência realizada em Lisboa, a
Presidente da União Europeia da Radiodifusão veio dizer, muito claramente, que o cálculo estava mal feito e
que era necessário, pelo menos, um valor de 3 € para que se pudesse fazer um financiamento adequado do
serviço público de rádio e televisão — e, note-se, «adequado» para substituir o que desaparece com o fim da
indemnização compensatória, já nem sequer estamos a falar no ideal para assegurar a qualidade da RTP.
Esta é a questão de fundo que nos deve mobilizar. A RTP, o serviço público de rádio e televisão de
qualidade é a seiva da democracia, porque é o garante do pluralismo, é o garante da informação isenta, é o
garante de todas as regiões terem uma voz e uma capacidade de projetar aquilo que sucede nos seus
territórios e é aquilo que, infelizmente, com as medidas que estão em cima da mesa propostas pelo atual
Governo, está em risco de desaparecer.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, muito obrigada pela
sua questão.
Sr. Deputado, foi mesmo esse o desafio que aceitámos ao fazer a declaração política, em jeito de balanço
das audições que tivemos com a tutela e com o Presidente do Conselho de Administração, sendo que
identificamos que o essencial é o reconhecimento do subfinanciamento, que, do nosso ponto de vista, é um
subfinanciamento crónico da RTP.
Como sabe, condenamos a extinção da indemnização compensatória, fizemos, aliás, propostas em sede
de Orçamento do Estado no sentido da sua reposição, e entendemos que é uma vergonha que o Estado se
tenha, desta forma, descomprometido face a preceitos constitucionais, porque a verdade é que o Estado tem a
obrigação de garantir o financiamento do serviço público de televisão e de rádio.
Mas mais sinistra, convirá, e, porventura, o Sr. Deputado acompanhar-me-á neste raciocínio, é a ideia
criada pelo Governo de que pôr os contribuintes a pagar duas vezes é a forma de garantir transparência no
modelo de financiamento da RTP. Ou seja, os contribuintes pagam os impostos, aumenta-se-lhes a CAV e isto
é igual a mais transparência. Ora, este argumento não cabe na cabeça de ninguém, exceto na do Sr. Ministro
responsável pela área.
Um outro argumento ainda mais sinistro é o de entender que continuar a preservar este subfinanciamento é
uma forma de reforçar a independência da RTP, o que é absolutamente incompreensível, é exatamente o
oposto, uma vez que é o estrangulamento financeiro que reforça os mecanismos de dependência — aliás, a
independência só se assegura com garantias de saúde financeira para esta empresa e para o serviço público.
Depois, temos estas maroscas, que nem sequer são justificáveis do ponto de vista político: como é possível
que o Ministro diga uma coisa e o Presidente do Conselho de Administração diga exatamente o oposto no que
à CAV diz respeito? É que a contribuição do audiovisual deveria, segundo recomendação da própria União
Europeia, ser aumentada para 3 €, mas a opção foi a dos 2,65 €. O Ministro diz que foi o Conselho de
Administração que decidiu assim e o Conselho de Administração diz que foi o Ministro que decidiu assim…!
Ora, esta instabilidade, com a ameaça de despedimento permanente que os trabalhadores da RTP vivem,
é absolutamente inaceitável, do nosso ponto de vista. Todavia, entendemos que a resistência de todas as
forças políticas e dos profissionais, sobretudo da RTP e da Lusa, encontrará um futuro para as suas
responsabilidades e para o seu papel determinante na qualificação da nossa democracia.