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I SÉRIE — NÚMERO 2

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aquela ideia estranha e radical de que nem tudo na economia e na sociedade se gera pela procura e pela

oferta.

Um serviço público é ter um autocarro num sítio onde não há muita gente, mas onde interessa ir, porque é

preciso que essas pessoas tenham acesso a serviços e à cidade.

Um serviço público é um serviço que não tem necessariamente de dar lucro, mas que é preciso, porque os

jovens podem não ter dinheiro para ir para a escola e precisam de um desconto de 50% nos seus passes.

Um serviço público é um serviço que concede aos idosos de uma cidade a possibilidade de andarem pela

cidade, de usufruírem da sua cidade mesmo que isso não dê lucro, mesmo que morem nos arrabaldes, que só

sejam duas pessoas e que não compense economicamente ter lá um autocarro.

É isso o serviço público e é essa a noção que o seu Governo perdeu, porque perdeu a noção de serviço

público e só vê uma coisa à frente: privatização e lucros para privados. E faz isto partindo de uma premissa

falsa, de um argumento falso, que é dizer que os transportes públicos não são sustentáveis, quando nós

sabemos que a taxa de receitas operacionais, que cobre as despesas operacionais dos transportes públicos

portugueses é mais elevada que na média da Europa. O problema dos transportes públicos portugueses tem a

ver com o facto de, durante anos e anos, os governos terem preferido não dar o financiamento que era preciso

e as empresas terem tido de ir pedir empréstimos à banca. Assim, todos os anos a dívida aumentava e todos

os anos eram precisos mais empréstimos para pagar os juros anteriores. Portanto, foi pura irresponsabilidade

das tutelas destas empresas, que não lhes deram os serviços e o financiamento de que precisavam e agora a

dívida financeira acumulou-se e o Governo diz que temos de privatizar ou de concessionar para resolver o

problema financeiro. Mas não é verdade, pois a dívida fica para o Estado. A dívida não diminuiu, é maior hoje

do que era há dois anos, pelo que não resolveram o problema da dívida financeira, simplesmente assumiram a

dívida, cortaram serviços, puseram as empresas a dar lucro operacional e entregaram essa parte boa a

privados.

Portanto, os consumidores, os cidadãos que precisam desses transportes pagam os impostos, pagam a

dívida e pagam os preços mais caros para dar o lucro ao privado. É por isso que os transportes não podem ser

privados e devem ser públicos.

Sr. Deputado, utopia é achar que os privados prestam um serviço público — isso é que é utopia. Utopia é

achar que se garantem os interesses dos cidadãos, os interesses dos idosos que precisam de andar em

Lisboa ou no Porto ou os interesses das pessoas que vivem nos campos ou em zonas mais distanciadas das

cidades através do privado — isso é que é utopia. Utopia é achar que o privado faz o que faz não por lucro,

mas por altruísmo — isso é utopia.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, queira terminar.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Sr. Deputado Bruno Dias, o desmantelamento do serviço público de transportes não é só uma questão

social, não é só uma questão ambiental, não é só uma questão humana, é também uma questão de economia.

O desmantelamento destas empresas de transportes é um paradigma da desindustrialização deste País.

Vende-se, desmantela-se, entrega-se aos privados, entrega-se ao exterior e o País vai perdendo o seu

potencial industrial, o seu potencial de investimento e ficamos a perder todos: as pessoas que usam os

transportes, a economia e o País no geral.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo.

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, começo por saudá-

la, bem como ao Bloco de Esquerda, por trazer os temas da TAP, da ANA, dos transportes, aqui a debate.

Tem sido difícil debater estes assuntos na Assembleia da República, por uma ação de bloqueio sistemático

que a maioria do PSD e do CDS têm feito, nomeadamente na Comissão de Economia e Obras Públicas.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!