I SÉRIE — NÚMERO 23
34
É o escândalo dos próprios vistos gold, a manchar a reputação do nosso País, a motivar processos-crime
envolvendo titulares de altos cargos públicos, a criar condições propícias para a ocorrência de casos de
corrupção, de branqueamento de capitais ou de procuradoria ilícita, mas a manter-se, apesar de tudo isso,
como um motivo de orgulho do Governo na sua política de captação de investimentos.
Enquanto os imigrantes, que tentam fugir à fome e à miséria e estão dispostos a trabalhar nas mais
precárias condições, naufragam no mediterrâneo e são repelidos pelos guardiões da fortaleza erguida nos
Acordos de Schengen, quem tiver interesse em depositar 1 milhão de euros ou em comprar imóveis de valor
superior a 500 000 € em Portugal só precisa de permanecer por cá uma semana para ter direito a autorização
de residência, ao abrigo de um visto dourado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Quando confrontamos este regime legal com o Orçamento que acabámos
de discutir, vemos a imagem de marca deste Governo: vistos de ouro para estrangeiros ricos, Orçamento de
chumbo para portugueses pobres.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Passaram mais de seis meses sobre a mágica
data de 17 de maio, em que o Governo e a maioria celebraram ruidosamente a partida da troica. Teria
acabado o protetorado, o País teria recuperado a sua soberania, a crise pertenceria ao passado, mas este
Orçamento do Estado é o desmentido cabal dessa propaganda. Tudo o que de pior nos chegou em nome da
troica e que não foi impedido pela luta dos portugueses ou por decisões do Tribunal Constitucional por cá
permanece, neste Orçamento.
A esse respeito o Orçamento não podia ser mais claro, quando estabelece, no artigo 239.º, que se mantêm
em vigor «todas as medidas e efeitos de natureza temporária, previstos em lei ou regulamentação, que se
encontrem dependentes da vigência do PAEF ou do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010-2013,
nas suas diversas fases».
Na verdade, assim é: continua a perseguição aos funcionários públicos, aos reformados e aos beneficiários
de prestações sociais; continuam os cortes de salários e de pensões; continuam os cortes desumanos nos
apoios sociais; continua o corte infame dos complementos de pensões dos trabalhadores das empresas de
transportes; continuam os aumentos de impostos sobre os rendimentos do trabalho e as escandalosas
benesses fiscais aos lucros do capital; continua a famigerada sobretaxa do IRS (a tal que o CDS dizia que iria
acabar por exigência sua); continua a absurda taxa do IVA a 23% sobre a restauração, o gás, a eletricidade e
outros bens de primeira necessidade; inventam-se novos impostos «pintados de verde» para esmifrar ainda
mais os contribuintes; acaba a cláusula de salvaguarda do IMI; mantém-se os aumentos dos descontos para a
ADSE, a ADM e o SAD e são reduzidos os benefícios que lhes são inerentes.
Entretanto, este Orçamento degrada ainda mais as funções sociais do Estado. Os trabalhadores
portugueses pagam cada vez mais impostos e têm cada vez menos direitos sociais. Os direitos de acesso à
saúde, à educação e ao ensino, à justiça, à proteção social no desemprego e na doença, degradam-se cada
vez mais. Os portugueses que trabalham ou que trabalharam uma vida inteira pagam cada vez mais para ter
cada vez menos.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Mas é claro que nem todos estão pior! Neste Orçamento, o Governo
inscreve uma verba de 24 600 milhões de euros para dar garantias pessoais do Estado aos bancos e procede
ao alargamento dos prazos para os bancos usufruírem de créditos garantidos pelo Estado e do prazo de
reembolso de 20 para 50 anos.
Ou seja, enquanto para a generalidade dos portugueses a austeridade não dá tréguas, para os bancos,
não só se disponibilizam milhares de milhões em garantias pessoais do Estado, como ainda se alargam os
prazos de utilização do crédito e de reembolso. Esta alteração, proposta e aprovada pelo PSD e pelo CDS,