6 DE DEZEMBRO DE 2014
23
acesso a bens e serviços e seu fornecimento, lei esta que, por sua vez, transpôs para a ordem jurídica interna
uma diretiva de 2004, onde o legislador deu, de facto, um tratamento autónomo à matéria dos seguros.
Partindo sempre da valorização do direito à igualdade como um direito fundamental, reconhecido, aliás, na
Carta dos Direitos Fundamentais e, consequentemente, inscrito na sua ordem de prioridades de ação, a
Diretiva proibiu que o critério do sexo seja tomado em consideração para calcular prémios e prestações de
seguro dos contratos de seguro, a partir de 21 de dezembro de 2007.
Todavia, previu um período transitório, com um regime bastante limitado em que a diferenciação só poderia
ser feita tendo por base dados atuariais e estatísticos relevantes e rigorosos, que depois seriam definidos por
norma regulamentar, período esse durante o qual os Estados-membros e as seguradoras deveriam proceder
aos ajustamentos necessários às respetivas legislações e práticas. E isto mesmo reconhecendo que o sexo
não constitui o principal fator determinante da esperança média de vida.
No fundo, procurou acautelar-se eventuais perturbações no mercado, fruto de uma alteração brusca de
fatores.
O período transitório foi, no fundo, pensado para permitir à indústria e às autoridades públicas trabalharem
em conjunto no sentido de melhorarem a fiabilidade do fator «estilo de vida» e outros critérios que produzem
um impacto mais significativo do que o fator «sexo», nomeadamente na esperança de vida, como já referi.
Exatamente no mesmo sentido, a Lei n.º 14/2008 prevê uma derrogação ao princípio da igualdade de
tratamento entre homens e mulheres em matéria de seguros, consagrando expressamente, e bem! que esta
derrogação deveria ser objeto de revisão cinco anos após a sua entrada em vigor, em linha, aliás, com o
espírito transitório da exceção, porquanto restritivo do princípio da igualdade.
Ora, o Tribunal de Justiça da União Europeia, na sequência de um pedido de decisão prejudicial, a 1 de
março de 2011, proferiu um acórdão no qual declarou que no setor dos serviços de seguros a derrogação à
regra geral da igualdade em matéria de prémios e prestações é inválida, com efeitos a partir de 21 de
dezembro de 2012. No fundo, estava em causa a ausência de um limite temporal, pelo que o facto de não ter
este limite poder-se-ia tornar definitivo.
Bom, naturalmente que não se ignora que uma declaração de invalidade por parte do Tribunal de Justiça
da União Europeia não tem efeitos automáticos sobre a validade da norma nacional correspondente. Contudo,
é verdade — e vamos aos efeitos práticos — que, a partir de 21 de dezembro de 2012, por um lado, as
autoridades nacionais poderiam, de facto, deixar de aplicar a disposição e, por outro, a sua validade poderia
ser contestada, desencadeando as pertinentes ações de fiscalização por parte das entidades competentes
para assegurar, assim, o cumprimento do princípio da igualdade.
O presente projeto de lei pretende alterar a lei nacional de modo a que não subsistam dúvidas quanto ao
sentido e alcance da Lei n.º 14/2008, garantindo conformidade, tanto com a declaração de invalidade do
Tribunal de Justiça da União Europeia, como com a subsequente comunicação da Comissão Europeia, de 22
de dezembro de 2012, em que se estabelecem importantes orientações clarificadoras e uniformizadoras deste
regime na União Europeia sobre o âmbito de aplicação da lei, particularmente quanto ao que se deve entender
por novo contrato.
Refira-se que, na situação concreta da Lei n.º 14/2008, e olhando para a realidade nacional, as
consequências do acórdão são muito reduzidas. Já é usual a utilização de tabelas comuns para homens e
mulheres.
Por outro lado, refira-se também que as alterações que agora se propõem respeitam totalmente o espírito
da lei, não eliminando toda e qualquer diferenciação, ou seja, atendendo ao princípio da igualdade para tratar
de forma diferente o que tiver uma justificação objetiva para um tratamento diferenciado, e salvaguardam uma
adequada e justa aplicação da lei no tempo, na ponderação sobre a conciliação e a eventual prioridade de
direitos, capaz de não desvirtuar o contrato de seguro e respeitar a Constituição.
Em suma, termino recorrendo às palavras do Conselho Superior da Magistratura: «O projeto de lei em
apreço concretiza uma relevante vinculação do Estado português ao cumprimento deste direito».
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves
Moreira.