I SÉRIE — NÚMERO 28
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O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero saudar, em
nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, as peticionárias e os peticionários, que, com esta petição
que trouxeram ao Parlamento para ser discutida em Plenário, propõem a criação de um Dia Nacional para a
Sensibilização da Perda Gestacional, porque consideram que este dia contribuiria não só para a sensibilização
social desta problemática, mas também, dessa forma, para lhe dar visibilidade.
A visibilidade é importante para que as pessoas que, a determinada altura, são confrontadas com a perda de
um filho desejado e com a interrupção de um projeto e de um sonho de vida não necessitem de sofrer sozinhas.
A visibilidade é importante para que estas pessoas que, a determinada altura da sua vida, são confrontadas
com tal notícia não precisem de passar por um processo de luto de forma desamparada.
Essa visibilidade é importante porque, muitas vezes, o processo de luto é um processo que é necessário
fazer com acompanhamento e com apoio.
Por isso, no entender do Bloco de Esquerda, refletir sobre as formas de sensibilizar a sociedade acerca
destes episódios é importante, como também é importante atuar sobre a forma como o próprio Serviço Nacional
de Saúde intervém junto de pessoas a quem é comunicada esta notícia.
Sabemos que o Serviço Nacional de Saúde tem um problema estrutural que é a falta de resposta do ponto
de vista de cuidados de saúde mental. Portanto, deste ponto de vista, tem também uma dificuldade em lidar com
pessoas que precisam, por exemplo, de apoio para fazer um processo de luto.
O Serviço Nacional de Saúde, muitas vezes, comunica o facto e, depois, deixa as pessoas desamparadas.
É necessário reforçar o número de psicólogos nos cuidados de saúde primários, nos cuidados hospitalares. É
necessário reforçar a humanização dos cuidados de saúde, em Portugal, é necessário, sempre que é
comunicada uma notícia deste tipo, deixar às pessoas a possibilidade de serem acompanhadas, apoiadas,
dentro do Serviço Nacional de Saúde, para que não precisem de sofrer sozinhas, para que não precisem de
passar por um período traumático da sua vida sozinhas e isoladas e para que possam ser acompanhadas pelo
Serviço Nacional de Saúde, por um acompanhamento público, principalmente nos momentos mais difíceis da
sua vida.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marisabel Moutela.
A Sr.ª Marisabel Moutela (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me, antes de mais, que
dirija aqui uma saudação muito especial à Associação Projeto Artémis, presente neste Parlamento e cujos
dirigentes e associados são promotores da petição n.º 57/XIII (1.ª), através da qual pretendem a instituição do
Dia Nacional para a Sensibilização da Perda Gestacional, à semelhança do que acontece já noutros países, e
sensibilizar-nos, assim como a todos os portugueses, para a problemática que envolve a perda gestacional, que
afeta muitas famílias portuguesas e que, na grande maioria das vezes, ocorre em sucessivas gravidezes.
O povo chama-lhes «as mães e os pais dos anjinhos».
Se me permitirem, e na minha qualidade de Deputada relatora desta petição, de mulher e de mãe, hoje, nós,
aqui, deveremos dizer-lhes que eles são os pais e as mães do colo vazio, dos braços que não embalarão, do
berço que nunca o será.
Na generalidade — nós, a sociedade, e muitos profissionais de saúde —, olhamos para estes pais e para
esta mães com a simplicidade de quem passou por um aborto, e esquecemo-nos de que, na realidade, estamos
perante a perda irreparável do seu bebé, do filho que queriam ter.
Não conseguiremos impedir esta sua dor — só percetível por quem passou por ela —, podemos, sim,
envolver-nos e envolver todos os portugueses e as funcionalidades do Serviço Nacional de Saúde para lhes
demonstrarmos o nosso respeito e a nossa solidariedade para com a sua perda e a sua dor.
É que estas mães fazem todo o trabalho de parto como qualquer outra mãe, mas com mais dor física porque
estas mães não têm a ajuda de um filho vivo para fazerem a expulsão. É que estas mães estão com o coração
a sangrar porque, no fim deste trabalho de parto, não têm o choro nem o olhar do seu bebé.
Estas mães passam depois para quartos ou enfermarias, onde são colocadas, lado a lado, com outras mães
que estão em início de trabalho de parto ou que já embalam felizes o seu filho nos braços.
O choque emocional e psicológico que provocamos entre estas mães é brutal, é desrespeitoso.