23 DE JUNHO DE 2017
11
A primeira diz respeito ao sistema prisional e sistema penal. O Bloco de Esquerda tem conferido a esta
matéria uma importância grande por ser uma realidade de teste a uma cultura de direitos humanos, de Estado
de direito democrático, de respeito pela dignidade das pessoas.
Temos, na verdade, um triplo problema com o sistema prisional, ao qual a sociedade portuguesa tarda em
dar uma resposta satisfatória.
Em primeiro lugar, há uma degradação muito inquietante das condições físicas do parque penitenciário. E
sabemos bem que, por iniciativa do Bloco de Esquerda, foi aprovada, no âmbito do Orçamento para 2017, a
elaboração, por parte do Governo, de um relatório com calendarização de prioridades, com a quantificação de
meios, etc.
Em segundo lugar, há uma perda inquietante de centralidade da função ressocializadora. Há uma
degradação das condições de exercício dessa função, há uma perda de qualidade das próprias carreiras de
técnicos de reinserção social, e isso é bastante preocupante.
Em terceiro lugar, e acima de tudo, diria que há um problema de composição e de natureza da população
prisional, uma população jovem, pobre, condenada por pequena delinquência, que se perpetua no sistema
prisional, sem geração de alternativas.
Não é, pois, um problema de sobrelotação, é um problema de uma cultura de encarceramento que, de alguma
maneira, tomou conta do próprio sistema judiciário e em que as medidas alternativas não têm tido capacidade
efetiva de ter o efeito ressocializador.
Portanto, saudamos que se regresse com este conjunto de medidas, e com outras que são necessárias, à
centralidade da ressocialização e para tirar do meio prisional quem não tem de estar, efetivamente, em meio
prisional para cumprir a sua pena, certo de que esta função só se cumprirá efetivamente se for acompanhada
de um conjunto de outras medidas que têm a ver com a resposta à desqualificação do parque penitenciário, a
qualificação e reforço da valência de reinserção social. Saudamos, pois, esta parte, digamos assim, do diploma.
Saudamos, também — e esta é a segunda observação —, o ajustamento que se faz do tipo legal de crime
no artigo 240.º do Código Penal, ao autonomizar o incitamento à violência e ao ódio por razões de discriminação
racial, sexual ou religiosa. É algo que nos merece registo e saudação. Converge, aliás, com um projeto de lei
que o Bloco de Esquerda trouxe a este Plenário, de criminalização de comportamentos racistas, e que se opõe
à regulação, que até agora tem sido dominante, desta matéria através de contraordenações e, portanto, de
punição através de coimas.
No debate na generalidade, o nosso projeto de lei foi vivamente criticado por apontar para a lógica da
criminalização de comportamentos racistas. Mas ainda bem que essas críticas, hoje, nesta iniciativa do Governo,
são transformadas em aproximação — ainda limitada, mas já é um caminho de aproximação. Isto porque — e
vou terminar —, como tivemos ocasião de afirmar no debate, na generalidade, do nosso projeto de lei, e cito:
«O racismo é um atentado contra a dignidade das pessoas e as práticas de discriminação racial têm que ser
objeto da máxima reprovação social e jurídica. E isso tem um nome: crime.»
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Silvano, do PSD.
O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa
legislativa, Sr.ª Ministra, tem motivos confessáveis — aqueles que acabou de afirmar —, nomeadamente a
ressocialização, a elevada taxa de incumprimento destas medidas no sistema prisional, a falta de condições
logísticas e humanas que existem nas nossas cadeias. Estes são os motivos confessáveis que estão claros na
proposta de lei.
Mas também tem um principal motivo, que ainda agora o Sr. Deputado do Bloco de Esquerda acabou de o
afirmar com toda a clareza, que é o combate à sobrelotação dos estabelecimentos prisionais e o atenuar o
sistema de funcionamento, que está em rutura, das nossas prisões.
A prova de que este é o motivo principal são as próprias declarações da Sr.ª Ministra feitas, há uns tempos,
na 1.ª Comissão, é a intervenção do Bloco de Esquerda sobre esta matéria e são as orientações estratégicas
inscritas na Direção-Geral de Serviços Prisionais, que refere que uma das prioridades para 2017 é rever os
conceitos de prisão por dias livres e outras penas de curta duração.