21 DE JUNHO DE 2018
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Apesar de haver toda uma política que tem sido absolutamente coroada de ter tido pouco sucesso na gestão
de fluxos migratórios de forma humana, regular e segura, a verdade é que neste Conselho Europeu vamos
discutir um regulamento que é muito importante, que é o Regulamento de Dublin.
Esse Regulamento fala alemão e estabeleceu, desde os anos 90, como primeiro critério da responsabilidade
por um pedido de asilo, o primeiro país de entrada.
O que estamos neste momento a fazer, mantendo este critério, que, no fundo, vai atirar a responsabilidade
pela proteção de refugiados para os países da linha da frente, é a mitigar esse Regulamento com um outro valor
que deveria ser o cimento da União Europeia, que é o valor da solidariedade — solidariedade essa manifestada
não só através do apoio financeiro mas também através do acolhimento físico de refugiados; solidariedade essa
que está a ser negada por muitos países.
Outros sinais preocupantes, Sr. Primeiro-Ministro, vêm da Europa, mais concretamente da Áustria, que já
anunciou que, se as negociações falharem, vai adotar o chamado «paradigma australiano». Só gostaria de
recordar que este paradigma australiano já foi ensaiado pela Itália de Berlusconi e pela Líbia de Kadhafi e foi
considerado violador dos direitos humanos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Hoje, todos acordámos com a declaração de Meseberg, que, no fundo, volta a insistir na mesma tónica e na
mesma política: uma política de contenção, como se fosse possível parar o vento com as mãos. Em vez de uma
política de imigração e de asilo, de gestão racional dos fluxos migratórios, tenta-se uma política de contenção,
repito, como se fosse possível parar o vento com as mãos.
Eis senão quando o Presidente do Conselho Europeu recupera uma ideia velha, mas muito cara à Hungria
de Orbán, que é a da criação de hotspots ou centros de triagem nos países a sul do Mediterrâneo — a velha
receita da externalização da política de imigração, cujo resultado foi, pura e simplesmente, o de transformar o
Mediterrâneo na fronteira mais letal do mundo, às portas da Europa.
O que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, para terminar, é o seguinte: como é que Portugal se vai posicionar?
Vai seguir a via fácil de cavalgar o medo das pessoas ou a via mais difícil de intransigente defesa dos nossos
valores fundacionais, como a solidariedade e o respeito intransigente pelos direitos humanos de qualquer
pessoa?!
Era isso que gostaria de saber, Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada
Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas:
Faltam apenas alguns dias para o próximo Conselho Europeu de 28 e 29 de junho, mas as notícias indiciam já
qual será o centro do debate, ou seja, as migrações, a zona euro e o orçamento.
O problema com estas notícias é que temos o eixo franco-alemão com propostas conjuntas, como já aqui foi
referido, sendo que esta é uma aliança de maus augúrios. Aliás, facilmente se percebe que estamos perante
propostas que respondem mais a problemas internos de cada um dos países, quando, na verdade, do que
precisávamos era de soluções de solidariedade entre os povos. Portanto, a opção está a ser pela nulidade
política e pelo cinismo anti-humanista.
O encontro informal de Juncker para preparar a Cimeira, escolhendo apenas alguns países para a mesa das
negociações e deixando Portugal de fora, mostra, mais uma vez, a construção europeia dos diretórios e das
elites.
Por exemplo, o caminho de propostas como a deslocação de hotspots para bem longe do território europeu
é, efetivamente, uma cedência grave à chantagem racista e xenófoba de vários movimentos e governos dentro
da União Europeia.
A questão que se coloca a Portugal e ao Governo é se vai apoiar estas propostas que têm sido anunciadas
do lado alemão, porque estas propostas, nascidas para responder às divergências dentro do Governo alemão,
são demasiado próximas, por exemplo, das propostas do Governo de Viktor Orbán.
Portanto, é lamentável, se for esse o caminho a seguir, deixando perpetuar o drama do cemitério em que o
Mediterrâneo se tornou nos últimos anos.