I SÉRIE — NÚMERO 61
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das pessoas que hoje vivem guetizadas ainda não vivemos propriamente no 25 de Abril, mas no «24 e meio»,
e eu não quero ficar pelo «24 e meio».
Sr. Deputado António Filipe, é evidente que a luta antirracista faz-se com os portugueses e não contra os
portugueses. Contudo, devo dizer que me cansa um pouco essa questão de as pessoas se sentirem ofendidas
quando se diz que Portugal é um país racista, porque quando dizemos que Portugal é um país sexista ninguém
se zanga.
Vamos para a rua com cartazes a contestar a justiça sexista, o País sexista que temos. O sexismo está
identificado na sociedade, está identificado nas instituições e sabemos que temos um País sexista.
Quando fazemos este diagnóstico, não estamos a dizer que todos os portugueses são sexistas, não estamos
a dizer que todas as pessoas de todas as instituições são sexistas, não estamos a dizer que todos os juízes e
juízas são sexistas! Mas está identificado que, estruturalmente, há um problema de sexismo em Portugal!
Portanto, dizemos que Portugal é um país sexista, é evidente, senão não morriam as mulheres que morrem
por ano, para além dos outros problemas.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Que disparate!
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — E o mesmo se passa com a homofobia!
Temos uma história com um passado colonial recente que tem, evidentemente, reflexos, com uma
propaganda que ainda hoje tem os seus reflexos, que o Sr. Deputado conhece muito bem, do luso-tropicalismo,
com um passado de trabalho forçado que acabou legalmente em 1961 mas que terminou muito mais tarde —
temos reflexos de tudo isso — e temos, também, atos condicionados que não digo que sejam por dolo, mas que
refletem o tal racismo latente, mesmo que não haja vontade de fazer esse racismo.
Quando uma escola acha por bem discutir o tema «Raças» e, para isso, diz aos alunos para se vestirem de
negro, para se pintarem de preto e para porem umas imitações de carapinha na cabeça, para com isso
representar África, penso que está dito que há aqui um problema!
O Sr. António Filipe (PCP): — Há um problema de parvoíce!
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Há um problema, porque, desde logo, não perceber a ofensa que coloca
é grave. Em primeiro lugar, penso que não é assim que se discute a questão, mas, desde logo, imagino que
haja alunos negros e alunas negras em Matosinhos que, «por defeito», já estarão mascarados! Isto são coisas
graves que acontecem, para além de todo aquele racismo que estive a descrever da tribuna.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Quando digo que Portugal é um país racista, não estou a dizer isto contra os portugueses. Digo e assumo
em mim própria, repito, em mim própria, a interiorização desse racismo, desde o momento do meu nascimento,
como é evidente, tal como interiorizei o sexismo, tal como interiorizei a homofobia. Cresci com esses fatores que
estavam identificados na sociedade e fiz um combate para me libertar deles. Portanto, todos padecemos disso.
Aplausos do PS e do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Ao abrigo dos n.os 2 e 3 do artigo 76.º do Regimento, tem a
palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Helena Roseta.
A Sr.ª Helena Roseta (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aproveito este final de sessão para
trazer um problema que me preocupa.
Há um sentimento generalizado de revolta perante a desigualdade de tratamento que no nosso País é dado
aos incumpridores. O castigo é máximo para os pequenos e suave ou inexistente para os grandes.
Veja-se o caso do Novo Banco. Herdou do BES enormes imparidades no seu balanço — imparidades é,
evidentemente, um eufemismo para «buracos», é assim que o povo lhes chama. Grande parte destas