I SÉRIE — NÚMERO 3
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Protestos do Deputado do PS Santinho Pacheco.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Dias, do PCP.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, antes de mais, apresento-lhe os meus cumprimentos, bem como aos Srs. Deputados e aos Srs. Secretários de Estado.
Sr. Secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, esta
autorização legislativa que o Governo vem solicitar à Assembleia da República é mais um passo no
aprofundamento do ataque à pequena propriedade e também às autarquias.
Por um lado, aprofunda a ideia de que os «grandes males da floresta» resultam, maioritariamente, da
estrutura da propriedade rústica com predominância do minifúndio, por outro, quer mais uma municipalização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, tanto quanto se sabe, a grande propriedade florestal, mesmo de áreas
contíguas, do País em geral e do Norte e Centro em particular, não é propriamente sinónimo de boa gestão e
ordenamento e não tem sido mais poupada aos incêndios do que a pequena propriedade.
Não ignoramos que apenas 1% das explorações tem 100 ou mais hectares de extensão. Contudo, a
concentração da superfície florestal nas grandes explorações é bastante notória, sendo que 1% das explorações
dispõem de cerca de 55% da área florestal total do País.
Por isso, devemos questionar: por que razão é que ardem extensas áreas de montados de sobro no verão,
na área da grande propriedade alentejana e ribatejana, para não falar em algumas áreas até geridas pelas
celuloses?! Por que razão têm ardido significativas e extensas áreas de floresta, com dimensões de milhares de
hectares, onde o Estado tem particulares responsabilidades, como nas matas nacionais, de que o Pinhal de
Leiria é bom exemplo, ou nas áreas protegidas dos parques naturais, como o da Serra de São Mamede ou o da
Peneda-Gerês, igualmente assolados pelo flagelo dos fogos, já neste verão e, claramente, em anos anteriores?!
Portanto, Sr. Secretário de Estado, o argumento da pequena propriedade é falso e só pode pretender
esconder incompetências, incapacidades e erros de sucessivas políticas.
Aquela tese de que, responsabilizando a pequena propriedade e o pequeno proprietário pelo abandono das
matas, absolve este e outros Governos por políticas agroflorestais desastrosas, que desertificaram e
desertificam o mundo rural e o interior do País, que retiraram harmonia produtiva e ambiental à ligação terras de
cultivo/pecuária/matas das explorações agrícolas familiares do Norte e Centro do País, aquela tese de que,
responsabilizando a pequena propriedade, desresponsabilizam o Governo pela falta de ordenamento da floresta
portuguesa, quando é sabido que a Lei de Bases da Política Florestal, que foi aprovada já em 1996, não foi
posta em prática pelos Governos PS e PSD/CDS, não disponibilizando, inclusive, os meios orçamentais e
humanos necessários.
Aquela tese de responsabilizar o pequeno proprietário florestal e os compartes dos baldios pela pouca ou
nenhuma viabilidade económica da floresta portuguesa pretende fazer esquecer as responsabilidades dos
sucessivos governos por uma política de comercialização das madeiras inteiramente nas mãos e conforme os
interesses das celuloses, dos aglomerados e de outras indústrias grandes consumidoras, quer pela política de
preços, quer pela política de liberalização das importações.
Aquela tese, Sr. Secretário de Estado, de responsabilizar o pequeno proprietário florestal pela ausência de
gestão, que, agora, dizem ativa e adequada da floresta, procura passar uma esponja sobre a responsabilidade
de sucessivos governos como cogestores técnicos dos baldios e procura fazer esquecer que o não cumprimento
do seu papel de gestor técnico nos cerca de 400 mil hectares de mata dos baldios se tem traduzido na
degradação e abandono da floresta.
Aquela tese de responsabilizar o pequeno proprietário pelo estado a que chegou a floresta nacional pretende
fazer esquecer as políticas do Estado mínimo, que, dentro da boa filosofia neoliberal, os sucessivos Governos
vêm aplicando à estrutura do Ministério da Agricultura virada para a floresta, liquidando a extensão florestal,
reduzindo os serviços regionais ao osso, de que Pedrógão Grande é bem o exemplo, já que não tem um único
serviço de extensão rural ou florestal.
Aquela tese de que o mal de todos os males é o pequeno minifúndio está mais do que provada.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, o Governo prossegue a política que desvia a atenção
dos reais problemas da floresta que a agricultura e o mundo rural enfrentam.