17 DE DEZEMBRO DE 2020
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A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — É isso que me preocupa, porque passaram-se nove meses e não houve qualquer reflexão profunda sobre o modelo. Repito, o problema é o modelo. Foi este modelo que
provocou a morte do Ihor. Não foram só os inspetores do SEF que o mataram, foi um modelo que não foi
vigiado, um modelo que foi colocado e que foi deixado à solta.
É isso que é preciso corrigir. E nós só vamos sair desta situação quando olharmos e reconhecermos esta
realidade e reconhecermos o modo como os preconceitos e a discriminação infetam a nossa sociedade e
condicionam a forma como as pessoas estrangeiras são tratadas.
Existem outros modelos. Outros países europeus têm outras formas de acolher pessoas migrantes. Têm
sistemas abertos e outros modelos que podemos estudar e transportar para Portugal.
É muito importante que este processo seja feito com uma discussão alargada na sociedade portuguesa e
com aqueles que têm o pensamento estruturado em migração, pessoas que são especialistas em migração,
em leis de migração e que conhecem bem o direito migratório; pessoas que são economistas, que sabem o
contributo que as pessoas migrantes dão ao País; pessoas das organizações não governamentais, que
conhecem todas as violações de direitos humanos que aconteceram com as pessoas com que trabalham.
Portanto, temos de criar estas condições e este grupo para que estes encobrimentos, a tortura, não possam
voltar a acontecer.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Concluo, Sr. Presidente, dizendo que, se aquele que tutela o SEF, até este momento, não fez a transformação que era necessário fazer, então não tem condições políticas para ser
responsável por esta transformação.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Segue-se a declaração política do PCP. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A existência de um serviço público de cultura devidamente estruturado em todo o território é imprescindível à democracia, é um direito de todos e
é um fator de progresso que tem de ser valorizado.
O Estado, enquanto garante da livre criação artística e da fruição cultural, tem de assegurar uma forte
componente de financiamento público e de garantir a independência e a autonomia da criação dos interesses
privados ou das lógicas estritas de mercado. Tem, além disso, de encarar a cultura como trabalho, e o trabalho
tem de ser com direitos.
Todos os que hoje trabalham e vivem das artes e da cultura atravessam um momento de autêntico desafio
à própria sobrevivência. O desespero grassa entre muitos dos que já se encontram a resistir aos adiamentos,
cancelamentos e perda de trabalho, na dependência da solidariedade alheia. São forçados a vender, ao
desbarato, os seus materiais de trabalho para poderem alimentar as bocas que têm em casa. Com a
pandemia, demonstrou-se que a manta, que há muitos anos já era demasiado curta, está também
esfarrapada.
O prejuízo não é só dos criadores, das estruturas, dos trabalhadores da cultura, em geral, do tecido
artístico e cultural, é do País, é de cada um de nós. O valor social da arte e da cultura não pode continuar a
ser desprezado se queremos ser mais do que uma área mal ocupada.
Por isso, além de medidas urgentes, é preciso transformar radicalmente todo o fermento que possibilitou a
situação calamitosa atualmente vivida nas artes e na cultura, acorrer aos trabalhadores que ficaram sem
rendimentos e que ainda não conseguem aceder aos apoios previstos através da segurança social ou do
próprio Ministério da Cultura e combater a paragem das atividades artísticas, assegurando os meios
financeiros para que elas se possam até multiplicar e ocorrer com toda a segurança sanitária exigível e
adequada ao momento que atravessamos, conforme o PCP propôs para 2021 e tal como foi aprovado em
Orçamento do Estado.