I SÉRIE — NÚMERO 60
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aumento de tensões no seio familiar que o confinamento e a situação económica significaram para as vítimas
de violência doméstica significa estarem confinadas com os agressores. E sendo também mais difícil o pedido
de ajuda, a degradação da situação económica e social funciona como um preventivo adicional à rutura.
Sobre a violência doméstica já aqui se descreveu um pouco da situação e se falou de alguns dos
instrumentos utilizados, mas há questões em que gostaríamos de insistir, não por teimosia, mas porque são
mesmo cruciais para se ter uma boa resposta neste âmbito.
Como também já tivemos oportunidade de dizer, em 2020 o PCP fez aprovar no Orçamento do Estado um
balanço da situação, uma fotografia: para além de mais formação dos diversos intervenientes, ficou definido
que seria feito um levantamento de necessidades na esfera pública a nível de meios humanos em cada um
dos diversos serviços para que se percebesse como é que está a situação: como está a situação nos centros
de saúde e hospitais; como estão as equipas de prevenção da violência em adultos, quais as dificuldades com
que se confrontam e quantas estão operacionais; se têm profissionais dedicados exclusivamente a esta frente.
E nas escolas e nas universidades o que falta? A educação sexual, parte essencial da prevenção da
violência no namoro, por exemplo, que entraves encontra?
E nas forças de segurança? Existem 144 salas de atendimento e apoio às vítimas e 641 efetivos
preparados para estas situações. É este o retrato atualizado da situação? É preciso mais para haver trabalho
direcionado? Que balanço se pode, então, fazer?
Mesmo relativamente ao Ministério Público, aos tribunais ou à segurança social, quantas equipas
multidisciplinares de apoio nos tribunais existem, de facto, na rede? Que respostas faltam e que profissionais
estão em falta nessas diferentes respostas?
Era isso que era preciso saber e que o PCP considerou fundamental, continuando a insistir para que se
cumpra. É preciso perceber, em concreto, no terreno, como podemos melhorar a nossa resposta.
Como sabemos, os serviços públicos foram depauperados ao longo de anos, sendo essencial que agora se
cubram essas insuficiências.
Queria dizer ainda que a igualdade não é um desígnio abstrato nem pode ser apenas simbólico, estar no
campo da representação simbólica, tem de ser literal, tem de se começar pela base e verificar-se em cada
vida, em cada trabalho, em cada casa. E sempre que falham os apoios sociais, sempre que falham os direitos,
sempre que se falha no acesso à educação, à saúde e à saúde sexual e reprodutiva, sempre que se falha na
concretização de condições dignas de acesso à cultura, por exemplo, estamos a correr riscos de graves
retrocessos.
Por isso mesmo, não podemos esquecer que continua a haver desrespeito pelos direitos de maternidade,
pelo salário igual para trabalho igual, pela objetiva necessidade de regulação dos horários. E isso só é assim
porque existe uma total impunidade e a ACT não tem, objetivamente, dado resposta às necessidades. Há
atropelos tremendos todos os dias, à vista de todos e à vista do Governo, e não há consequências.
Milhares de mulheres estão a sentir entraves reais, com consequências diretas na igualdade, mas quanto a
isso não existe intervenção e mantêm-se os abusos e as arbitrariedades. Para mais, é a própria Administração
Pública que mantém trabalhadoras na precariedade, como acontece em cantinas do Estado e em setores
como a limpeza ao serviço das instituições públicas, tal como está a estimular o regresso a casa de
funcionárias públicas, com o teletrabalho.
No mesmo sentido e porque a igualdade só é efetiva se corresponder a concretas condições para o bem-
estar e igualdade de oportunidades, o que só se consegue com o desenvolvimento e o combate à pobreza e à
exploração, quero deixar ainda uma consideração sobre o Plano Nacional de Combate ao Racismo e à
Discriminação 2021-2025, que aponta diversos aspetos fundamentais no emprego, na habitação, no acesso à
saúde e à ação social e no desporto.
Aborda-se a habitação, muito bem, sendo uma dimensão imprescindível, mas falta um compromisso
concreto, como também já tivemos oportunidade de falar. Nessa, como noutras matérias, falta esse
compromisso e nesta frente resta saber se vamos ter habitação pública de qualidade, sem lógicas de
segregação, como, quanto e quando. Deixamos essa questão.
Da mesma forma, pretende-se atingir o respeito pelos direitos laborais de todos, mas não é com códigos de
conduta e com ferramentas que isto lá vai. Não é por explicar às empresas de trabalho temporário que a
exploração é má que isso vai deixar de ser uma prática, quando é, precisamente, o seu ramo de atividade.