O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

12 DE NOVEMBRO DE 2021

13

incompetência por não ter sido o próprio Governo a tomar a iniciativa de fazer cessar a vigência da lei após o

fim do estado de emergência ou a percentagem de vacinação suficiente.

A falta de uma cultura de responsabilização está na origem da profusão destes casos de incompetência, e

é também por isso que os dias deste Governo estão contados.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A lei que aqui hoje está em debate foi aprovada há ano e meio. O País lembra-se bem do alarmismo incendiário da extrema-direita que

gritava aos sete ventos que vinha aí uma onda do que chamou «bandidos postos na rua», homicidas,

violadores, agressores de todos os tipos — a violência bárbara ia tomar conta do País.

Ano e meio volvido, a mentira grosseira desse alarme está à vista de toda a gente. Dos cerca de 3000

reclusos que viram o seu tempo de encarceramento diminuído, e dos quais 2000 ficaram em prisão

domiciliária, foi inequivocamente residual o número de reincidências ou de desobediência às condições

impostas pelas autoridades — 1,8%.

Mas, mais do que tudo, a lei cumpriu o seu propósito essencial, humanitário e de saúde pública. Foi uma

medida sensata e prudente para, num tempo que começou quando a vacinação não estava sequer em curso,

prevenir contágios em larga escala, que teriam tido efeitos letais absolutamente catastróficos. Fizemos bem,

todas e todos aqueles que quisemos que esse passo fosse dado. Chegamos aqui de consciência tranquila por

termos protegido muitas vidas humanas.

Aplausos do BE e do PCP.

A razão de ser desta lei não foi só de saúde pública nem foi só de política penitenciária. Foi claramente de

cruzamento entre ambas. Ou seja, a emergência de saúde pública nas prisões causada pela COVID foi

dramática, porque as prisões são pouco mais do que mega armazéns onde a sociedade está a amontoar

gente, deixando-a ali a vegetar, sem projeto nem horizonte.

Podem os governos — este como os anteriores — martelar as estatísticas para demonstrar que não há

sobrelotação em sentido técnico. Mas, por mais que se martelem as estatísticas, não há como negar a

imensidão dos números. Como lembra a Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos, que foi galardoada com o

Prémio de Direitos Humanos desta Casa, nos últimos 20 anos a população prisional variou entre um mínimo

de 10 807 reclusos, em 2008, e um máximo de 14 284 em 2013, sendo o valor, em 2020, de 11 412 pessoas.

Por mais que se martelem as estatísticas, não há como negar as celas exíguas com três e mais reclusos ou

aquelas em que subsistem as camaratas.

Por mais que se martelem as estatísticas, não há como negar que Portugal é um dos países da União

Europeia com uma maior taxa de encarceramento e com um maior tempo médio de cumprimento de pena.

Mais, encarceramento e prisão longa para criminalidade menor acumulada de gente jovem e pobre, desde a

condução sem carta ou o não pagamento de multa, em contraste com a lassidão cúmplice com que se tratam

os banqueiros que fogem ou os autores de gestão criminosa de bancos, que ficam subitamente atacados por

amnésias e outras patologias cognitivas graves.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Foi por termos um sistema prisional assim, armazém de gente inerte e supérflua, por isto, que é uma vergonha para uma sociedade decente e para um Estado de direito que se leva

a sério, que o risco de contágio da COVID se tornou tão dramático em 2020. Foi a combinação destas duas

razões que tornou irrecusável a lei excecional que então aprovámos.

Uma sociedade que amontoa, longe da vista, pessoas privadas de liberdade e uma democracia que exibe

indiferença perante o incumprimento diário dos mais básicos direitos em ambiente prisional e perante o

definhamento de qualquer estratégia consistente de reinserção social, uma sociedade e uma democracia

assim são produtores de indignidade e de exclusão social.