25 DE NOVEMBRO DE 2021
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O Sr. Miguel Arrobas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projeto de lei que discutimos prevê a gratuitidade da utilização dos transportes públicos para três categorias de pessoas, sendo elas pessoas
com deficiência, pessoas desempregadas e pessoas com idade igual ou inferior a 18 anos ou estudantes do
ensino obrigatório, isto é, até completarem o ensino secundário.
A primeira coisa que é relevante dizer é que, além do ar, não há nada grátis. Existe, sim, a diferença entre
fazer o utilizador pagar ou fazer a sociedade no seu todo pagar. Esta é uma opção política bem clara, que
importa discutir, ou, pelo menos, alertar para as suas consequências. Mas já lá irei.
A efetiva promoção do transporte público de passageiros não se consegue efetivar somente prevendo-se o
não pagamento direto pelos utilizadores dos mesmos, ou por uma redução de preços.
Com efeito, independentemente de uma medida como essa, é necessário o reforço do investimento em
frotas, material circulante, infraestruturas e recursos humanos. Só assim se conseguirá um aumento da oferta e
uma extensão das redes de transporte, que garantam aos seus utilizadores um transporte regular, pontual,
cómodo e seguro, assegurando-se, assim, uma melhoria da qualidade do serviço capaz de atrair mais
utilizadores.
Temos um bom exemplo do que não foi bem feito nos últimos anos, por exemplo, na Área Metropolitana de
Lisboa: reduziu-se o valor dos passes sociais, mas tal não foi acompanhado por um reforço da oferta de
transportes. Portanto, pessoas que, eventualmente, poderiam passar a utilizar os transportes públicos, podendo,
acabaram por não o fazer, por não verem um melhor serviço a ser prestado.
Relativamente à primeira categoria de pessoas, as pessoas portadoras de deficiência, o tema da mobilidade
para estas pessoas não se esgota na isenção do pagamento direto do serviço. Muito antes disso, importa
promover a acessibilidade. Só assim se contribui para o pleno exercício do direito, para o reforço de laços
sociais, para uma maior participação cívica e, consequentemente, para um crescente aprofundamento da
inclusão e da solidariedade. Cumpre ao Estado promover e realizar ações cuja finalidade seja a de garantir e
assegurar os direitos das pessoas com necessidades especiais, nomeadamente pessoas com mobilidade
condicionada.
O Decreto-Lei n.º 163/2006 estipulou um prazo de 10 anos para a adaptação de instalações, edifícios,
estabelecimentos e equipamentos públicos. Esse prazo acabou em 2017. Há ainda, no entanto, por esse País
fora, diversas infraestruturas de transporte e material circulante sem capacidade para oferecer a pessoas com
mobilidade reduzida condições para que utilizem o transporte público.
Pergunto: de que vale não cobrar diretamente o transporte às pessoas com deficiência se depois elas não
conseguem aceder ao mesmo? Por exemplo, uma pessoa com deficiência que viva em Penamacor e se queira
deslocar à Covilhã, passará a utilizar um transporte público, praticamente sem expressão e tantas vezes sem
condições, se não lhe for cobrado nada? Ou ainda uma pessoa que se queira deslocar entre duas das 16
estações do metro de Lisboa que não tem acessibilidades para pessoas com mobilidade condicionada, passará
a fazê-lo se não tiver de pagar? Provavelmente, não!
Uma reflexão semelhante é válida para a população no interior do País. Pergunto: como é que alguém que
mora no interior, onde quase não há transportes públicos, tem acesso à isenção de tarifa, seja por ser portador
de deficiência, desempregado, por ser menor ou por estar ainda a frequentar o ensino obrigatório?
Este projeto de lei que aqui discutimos parte da visão de que todo o País é igual, e poderá criar, por isso,
ainda mais uma desigualdade. Considerar que a isenção do custo de transporte para os utilizadores, ainda que
limitada a determinadas categorias, tem o mesmo efeito no interior e no litoral, pressupõe que exista alguma
semelhança entre a realidade da oferta de transportes públicos no litoral e a oferta de transportes públicos no
interior. Ora, tal não se verifica, de modo algum.
Ou seja, podendo ser esta uma medida positiva para os utilizadores de transportes públicos, onde eles
existem, constitui, ao mesmo tempo, uma medida incapaz de assegurar uma justiça territorial entre a população
nacional.
Com efeito, e porque, como dizia ao início, não há nada grátis, pressupomos — porque o projeto de lei não
especifica — que a compensação financeira sairia do Orçamento do Estado, ficando todos os portugueses,
tenham ou não acesso a uma boa rede de transportes, a pagar esta medida.
Um dos principais custos da interioridade passa pelos transportes, que são essenciais a quem precisa, de
forma muito acentuada, de se deslocar, sendo, como já tive oportunidade de referir, que o acesso das
populações do interior aos transportes públicos é reduzido, a oferta muito limitada e incapaz de solucionar as