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II SÉRIE — NÚMERO 82

COMISSÃO DE ASSUNTOS CONSTITUCIONAIS Parecer I

1—A Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, por ofício do seu presidente, datado de 16 de Novembro, solicitou à Comissão de Assuntos Constitucionais «um parecer sobre a constitucionalidade do projecto de lei n.° 46/I do Partido Socialista (incapacidades cívicas)».

2 — Este projecto de lei n.° 46/I teve uma primeira versão publicada no suplemento ao n.° 97 do Diário da Assembleia da República, a pp. 3282-(2) e 3282-(3), e uma nova versão publicada no suplemento ao n.° 113 daquele Diário, a pp. 3838-(3) e 3838-(4).

Enquanto na primeira versão do projecto se estendiam os efeitos atribuídos às incapacidades cívicas previstas no artigo 308.° da Constituição a todas as incapacidades eleitorais, activas e passivas, na nova versão pretende-se limitar esses efeitos apenas quanto às incapacidades cívicas que se traduzem em incapacidade eleitoral activa.

Além desta importante questão de fundo, divergem as duas versões só já quanto à justificação de motivos, ligeiramente modificada, e quanto ao prazo para a contestação e requerimento de produção de prova no processo de reabilitação judicial (artigo 2.°, n.° 3), que foi alargado de oito para quinze dias.

3 — Foi sobre a segunda versão do projecto de lei n.º 46/I que incidiu a discussão e votação, na generalidade, no Plenário da Assembleia da República, na sessão de 28 de Junho de 1977.

No decorrer dessa discussão, chegou a ser requerida, por parte do Grupo Parlamentar do CDS, a baixa do projecto à Comissão de Assuntos Constitucionais, para efeito de parecer sobre a sua constitucionalidade, que alguns Deputados puseram em causa, mas tal requerimento não ganhou vencimento, por votos contrários do PS e do PCP.

De novo é agora suscitada a questão da constitucionalidade, por parte da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, onde o projecto se encontra para discussão e votação na especialidade e é sobre o ponto de vista jurídico-constitucional que passaremos a apreciar o referido projecto de lei n.° 46/I.

II

1 —O projecto de lei n.° 46/I (segunda versão), que os seus subscritores designam por «incapacidades cívicas contempladas no artigo 308.° da Constituição», preceitua, no essencial, o seguinte:

a) Os cidadãos que estejam feridos de alguma

das incapacidades previstas no artigo 308.° da Constituição que se traduzam em incapacidade eleitoral activa e que sejam funcionários ou agentes do Estado ou demais entidades públicas serão suspensos das suas funções e inerentes direitos e obrigações (artigo 1.°);

b) Durante o período da suspensão, aqueles fun-

cionários ou agentes perdem, além do mais, o direito ao respectivo vencimento (artigos 1.° e 4.°, n.° 1);

c) A suspensão de funções e inerentes direitos

durará até ao fim da I Legislatura, salvo

se forem reabilitados ou aposentados a seu pedido, se para tal possuírem o necessário tempo de serviço (artigos 1.°, 2.° e 4.° do projecto e artigo 4.º do Decreto-Lei n.° 621-B/74, de 15 de Novembro); d) Não são consideradas, para os efeitos do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 621-B/74, de 15 de Novembro, as nomeações ali referidas desde que posteriores a 25 de Abril de 1976 (artigo 3.°).

2 — Convirá que se aluda, por forma resumida que seja, à exposição de motivos que precede a apresentação do projecto de lei n.° 46/I, já que entre eles se contam argumentos e princípios jurídicos cuja apreciação e valorização haverá de fazer-se mais adiante no presente parecer.

Assim, pondera-se que no artigo 308.° da Constituição não são consideradas as consequências das incapacidades eleitorais activas resultantes da aplicação do Decreto-Lei n.° 621-B/74, de 15 de Novembro, as quais apenas através de reabilitação judicial, com respeito dos princípios da publicidade e do contraditório, podem ser supridas.

Por outro lado, sustenta-se que as leis ordinárias que disciplinam o ingresso na função pública exigem como condição indispensável a tal ingresso e ao subsequente exercício de funções ao serviço do Estado e demais entidades públicas que os respectivos funcionários e agentes se encontrem no gozo pleno dos direitos civis e políticos, citando-se, como exemplos, o Código Administrativo (artigo 460.°, n.° 3), o Estatuto Judiciário (artigo 365.°) e o Código Penal (artigo 80.°).

Por último, acentua-se que o artigo 308.° da Constituição não foi ainda objecto de desenvolvimento por lei ordinária, o que tem conduzido a certa indefinição no seu alcance, a que pretende pôr-se termo com o projecto de lei apresentado.

III

1 — Sabido que a validade das leis depende da sua conformidade com a Constituição, sendo inconstitucionais as normas que infrinjam o que nela se dispõe ou os princípios nela consignados (artigos 115.° e 280.°, n.º 1), vejamos se o projecto de lei n.° 46/I se conforma com a Constituição ou se, pelo contrário, os seus preceitos infringem as normas ou os princípios constitucionais. Eis, em suma, o problema que nos é posto, ou seja, o da constitucionalidade ou inconstitucionalidade do projecto de lei n.° 46/I.

2 — Já deixamos acima notado que na exposição de motivos do projecto se lhe asinala o propósito de desenvolvimento, por via de lei ordinária, do artigo 308.º da Constituição, argumento este retomado aquando da sua discussão no Plenário da Assembleia da República, onde se acentuou que, embora aquele artigo 308.° tenha considerado nos seus n.os 3 e 4 as consequências das incapacidades eleitorais passivas, não considerou as consequências das incapacidades eleitorais activas, o que importaria fazer {Diário da Asembleia da República, n.° 122, p. 4169).

Tais afirmações parecem assentar na ideia de que o artigo 308.° da Constituição se deve interpretar como se fosse uma simples norma de «expectativa constitucional», uma norma «programática», com um