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17 MAIO DE 1985

2949

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA GABINETE DO MINISTRO

Ex.mo Sr. Chefe do Gabinete de S. Ex.a o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares:

Assunto: Resposta ao requerimento n.° 1249/III (2.a), dos deputados José Manuel Mendes e José Magalhães (PCP), pedindo cópia da documentação sobre as conclusões das III Jornadas Latinas de Defesa Social, realizadas em Aix-en-Provence.

Em referência ao ofício de V. Ex.a acima indicado, tenho a honra de informar que já foi remetido o solicitado, através do ofício n.° 2815, de 2 do corrente mês, deste Gabinete.

Com os melhores cumprimentos.

Gabinete do Ministro da Justiça, 23 de Abril de 1985. — O Chefe do Gabinete, (Assinatura ilegível.)

1 — Introdução

O presente relatório baseia-se em apontamentos pessoais, colhidos no decurso das III Jornadas Latinas, realizadas em Aix-en-Provence, organizadas pelo Instituto de Ciências Penais e de Criminologia de Aix--Marselha, pela Faculdade de Direito e de Ciência Política da mesma cidade e pelo Centro de Investigação e de Política Criminal de Paris.

Não se pretende apresentar um relato exaustivo das comunicações apresentadas, que vão em anexo, mas sim algumas notas tomadas no decurso das discussões que as mesmas comunicações suscitaram.

A concentração exigida pela riqueza e profundidade dos debates não permitiu um apanhado extenso do que se disse e discutiu, pelo que o relato se limita a dar notícia dos aspectos mais significativos.

Para maior desenvolvimento é indispensável a leitura da documentação anexa.

2 — Intervenções

2.1 — O tema das Jornadas era, como se sabe, «Reforma penal e despenalização».

Os trabalhos, após os discursos protocolares, abriram com uma alocução do Dr. Mare Ancel, presidente da Sociedade Internacional de Defesa Social. O Dr. Mare Ancel começou por se referir ao novo Código Penal Português e felicitou o Prof. Eduardo Correia, considerado o seu grande inspirador. A seguir teceu considerações sobre a falência dos actuais sistemas punitivos que se baseiam exclusivamente no efeito repressivo das penas. Falência que respeita essencialmente à pena de prisão. Também sublinhou o insucesso das medidas de ressocialização impostas aos condenados. Estas algumas das razões que justificam o movimento da «despenalização». Eis por que se escolheu este assunto para tema das Jornadas.

A pena de prisão é nociva por destruir a personalidade do delinquente, endurecendo-o e revoltando-o. A sua execução pode contribuir para o reforço da criminalidade. A prisão pode devir uma «escola de crime». Daí que deva ser excepcional e uma ultima

ratio. A política criminal moderna deve procurar a substituição da prisão por novas medidas, de protecção das vítimas, de privação de certos direitos, em suma, pelo incremento das sanções de carácter patrimonial. Eis aí um vasto campo onde pode florescer o movimento da «despenalização».

Mas não será o sistema penal, em globo, que deve ser posto em discussão?

Devem explorar-se novos caminhos, designadamente o aprofundamento dos regimes de protecção e de indemnização das vítimas, ao lado da ideia de «castigo» dos delinquentes.

Dissertou a seguir sobre várias tentativas de «des-jurisdicionalização», citando as experiências canadianas recentes. Aludiu a uma justiça de concerto e de equidade, de conciliação, em lugar de uma justiça de retribuição.

Como conjugar, porém, esta nova política com o aumento da criminalidade, particularmente da criminalidade violenta, nos tempos que correm?

Mare Ancel, prudentemente, adverte que o movimento da «despenalização» não é para já, mas visa essencialmente o futuro. Apesar disso (ou por isso mesmo), devem depositar-se nele grandes esperanças.

2.2 — A seguir usou da palavra o senador italiano Mario Valiante, que apresentou a sua comunicação, intitulada «Aspetti penali e penitenziari delle modi-fiche al sistema penale» (documento n.° 1).

O orador comentou a recente lei italiana n.° 689, de 24 de Novembro de 1981, sobre a pequena delinquência, e focou os seus aspectos inovadores. O vigente Código Penal Italiano, de Alfredo Rocco, constitui um «tecido muito apertado» para a sociedade actual.

Fundado sobre o primado da pena detentiva, entrou em crise. Oferece notórios inconvenientes, v. g. no plano da chamada «criminalidade menor». A sua aplicação revelou-se ineficaz e cara.

A moderna política criminal orienta-se pela ideia de que só devem punir-se criminalmente os actos que efectivamente lesam interesses fundamentais, consagrando o velho aforismo nullum crimen sine iniuria.

Aliás, devem perfilhar-se critérios objectivos em matéria de incriminação. A pena deve funcionar como ultima ratio, ou seja quando estão em causa comportamentos que destroem ou ofendem valores fundamentais.

Esta política passa pela substituição das curtas penas detentivas e pelo desenvolvimento das penas pecuniárias.

A nova lei italiana é uma antecipação daquilo que virá a ser a reforma penal global em curso na Itália.

A despenalização envolve, entre outras coisas, a transformação de alguns crimes em ilícitos administrativos (em matéria de armas, alimentos, etc).

A lei visa institucionalizar um sistema unitário de infracções administrativas.

Algumas inovações da lei: exigência de queixa da pessoa ofendida; relevância privatística de certos valores — tudo formas de despenalização. Outro exemplo: a oblação, mesmo quando a lei estabelece a prisão e a multa em alternativa. Não se aplica aos reincidentes, habituais e «profissionais». O juiz pode indeferir a oblação em função da gravidade do facto.

Outra característica: o reforço das penas pecuniárias e sua adequação à situação económica do réu.