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25 MAIO DE 1985

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O Sr. António Eloy (Amigos da Terra — Associação Portuguesa de Ecologistas): — Estava a ouvir, divertido, a intervenção anterior e gostava de, sem nenhuma ironia, fazer uma saudação aos jovens que em 1822 deram um impulso tremendo à revolução liberal.

De facto, continuar hoje a baralhar em conquistas e em reformas do 25 de Abril pode ser ligeiramente ridículo, quando, por exemplo, a Elizabete — aqui ao meu lado— vai votar este ano pela primeira vez, se quiser, e o 25 de Abril já será para ela um pouco como a pré-história. É a pré-história da juventude que hoje se está aqui a discutir.

Continuarmos a viver baseados em mitos, baseados num governo que foi tão mau depois de ter sido tão bom, como todos nós sabemos, naquele ano e meio, é evidente que só traz grãos de areia para os olhos das pessoas, que, se calhar, seriam bem mais úteis se os pusessem noutro lado, para construir alguma coisa de positivo.

Posto este meu pequeno aparte inicial em estilo de saudação ao espírito dos jovens, que sempre fizeram alguma coisa, que sempre souberam ultrapassar os tempos em que viveram dando respostas de futuro, queria levantar aqui duas ou três questões que são reivindicações, desde há um tempo, da Associação Portuguesa de Ecologistas — Amigos da Terra e que são respostas concretas a alguns problemas. Têm a ver com a participação e com o desenvolvimento que nós queremos. Algumas destas questões estão levemente sistematizadas num pequeno texto de reflexão que propusemos aqui aos participantes.

Nós entendemos que o estado em que nós vivemos é o estado social, que se baseia num contrato, contrato esse que tem essencialmente a ver com a restrição dos direitos individuais, o que é tanto mais grave quanto nós achamos que é através da iniciativa dos cidadãos, em espaços de autonomia, que se podem transformar e criar balizas para a transformação deste país.

Muito concretamente —nós temos aqui representantes dos quatro grandes partidos —, uma das reivin-divações que não é só dos ecologistas, mas também de outros sectores importantes da sociedade portuguesa, é a participação dos cidadãos nos diferentes níveis da vida política, participação esta, dos cidadãos, que é cada vez menor, e é-o porque não devemos usar os números conforme eles nos convêm.

De facto, a juventude está cada vez mais desiludida com as formas de intervenção política partidária, está cada vez mais desiludida com esta política, e não entremos em manobras dilatórios, fazendo de conta que a juventude está desiludida porque num partido um dia há um líder e noutro dia há outro, pois em nenhum partido há sempre o mesmo líder. Não baralhemos as questões. A juventude está desiludida com estes partidos políticos porque eles não dão resposta aos problemas nem atendem à dimensão da participação, que é fundamental.

Nós, nos Amigos da Terra, temos apoiado campanhas que vários grupos de cidadãos têm feito —alguns participando no governo das suas terras e das suas regiões— e achamos que esta Conferência é o sítio adequado para trazer este problema.

Ê fundamental a modificação de dados essenciais, tal como a participação de cidadãos em listas de independentes para as autarquias. Nós achamos que existem

espaços de vida que têm de ser devolvidos às populações e retirados aos partidos políticos, pois estes estão, neste momento, incapacitados de dar respostas adequadas a problemas essenciais da vida dos municípios e mesmo da vida nacional.

Ê uma reivindicação que tem a ver com a maior participação, que tem a ver com o alargamento do espaço de participação, que nós achamos essencial, e que aqui mais uma vez deve ser trazida.

Outra questão, que já há 2 anos nós apresentámos num questionário aos partidos políticos, tem a ver com a diminuição da idade de voto.

Nós achamos que, neste momento, em Portugal, não nos faria mal adequar a nossa idade de voto àquela que me parece que é a idade em que a generalidade das pessoas tem capacidade civil. Achamos que os 16 anos para idade de voto, juntamente com outra regulamentação específica, seria o modo adequado de dar uma maior participação à vida política.

Ê evidente, contudo, que, se uma legislação não estiver a par de outra, as insuficiências continuar-se-ão a manter.

Outro problema que, do nosso ponto de vista, tem a ver com a maior participação é o da regulamentação e da institucionalização de um sistema de representação democrática, é a institucionalização e a regulamentação do referendo.

Entendemos que o referendo deve ser institucionalizado a todos os níveis. Achamos absurdo que os cidadãos não se possam pronunciar sobre a sua Constituição, que os cidadãos não se possam pronunciar sobre a legislação que querem para o seu município e para o País. Achamos que existem questões demasiado importantes para que os partidos políticos se arroguem a representação dos cidadãos.

Achamos que o referendo deve ser institucionalizado e mais uma vez encontramos contra ele todos os partidos, que, nuns casos ou noutros, encaram o referendo como uma acção antidemocrática, e isto porque há hipóteses de 51 % da população não apoiar as suas políticas. Sabemos que existem conceitos ambíguos de democracia, mas entendemos que a democracia é a vontade da maioria e entendemos que, assim sendo, deve ser a maioria a ser consultada em relação aos principais problemas que enfrenta.

São, portanto, muito concretamente, três diferentes níveis de participação.

Entendemos que há outro nível de participação, que é a participação dos cidadãos em associações e, inclusivamente, nos partidos políticos. Infelizmente, há partidos políticos em que se participa mais e outros em que se participa menos, há uns em que se participa de baixo para cima, outros em que se participa de cima para baixo e noutros, ainda, nem se sabe como é que se participa.

Risos.

A nossa democracia tem partidos de todos os feitios e géneros, felizmente, mas talvez falte um partido de outro género. Falta, certamente! Não serão os Amigos da Terra a impulsioná-lo — posso garantir isso a pessoas mais curiosas— mas espero que talvez um dia haja um partido de outro género, um partido contra os partidos. Bom, isso são, talvez, voltas que o regime — se se aguentar— há-de dar.