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4 DE ABRIL DE 1986

1808-(11)

Tem-se assim em vista um sistema em que tudo conflui no sentido de restringir a aplicabilidade da prisão preventiva a casos determinados em que as outras medidas de coacção e patrimoniais se mostrem adequadas e suficientes.

32 — A articulação entre a liberdade e a respectiva privação merece no quadro do projecto alguma desenvolvida consideração.

Começa, porque no âmbito terminológico o articulado reserva o termo «prisão preventiva» para a privação total da liberdade individual emergente de decisão judicial interlocutória, generalizando o conceito de detenção para todos os casos restantes em que a privação da liberdade haja que ser confirmada pela intervenção judicial subsequente. E isto é feito precisamente para acentuar o carácter precário e condicional da detenção, sujeita à condição resolutiva da homologação judicial.

Permite-se pois a detenção, quer para assegurar a presença imediata do detido perante o juiz em acto processual, quer para o sujeitar ao julgamento sumário, quer ainda para que o detido seja presente ao magistrado competente para o primeiro interrogatório judicial ou para a aplicação de ume medida de coacção, impondo-sc que qualquer destas formas de intervenção do magistrado se efectue de imediato ou no prazo máximo de 48 horas.

Da detenção em flagrante delito se trata, nos termos tradicionais, agora ligeiramente precisados, mas também de detenção fora dele: em qualquer caso, porém, tendo o projecto introduzido na matéria algumas precisões relativamente ao regime vigente.

Em primeiro lugar, para restrigir, no que ao flagrante delito respeita, a possibilidade de detenção por qualquer pessoa do povo aos casos em que não esteja presente ou não possa ser chamada em tempo útil qualquer autoridade judiciária ou entidade policial.

Depois, para clarificar — precisando em parte aquilo que já era o entendimento maioritário no domínio da legislação anterior— que, fora de flagrante delito, a detenção pode ser efectuada, quer por mandado do juiz, quer — nos casos em que for admissível prisão preventiva— por ordem do Ministério Público, quer ainda por iniciativa das autoridades de polícia criminal quando se verificarem cumulativamente os seguintes requisitos: ser admissível para o caso a prisão preventiva, existirem elementos que tornem fundado o receio de fuga e não ser possível, dada a situação de urgência e de perigo na demora, esperar pela intervenção da autoridade judiciária.

Relativamente à prisão preventiva, permite-a o projecto quando, mostrando-se inadequadas ou insuficientes as restantes medidas de coacção e de garantia patrimonial, houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos ou se se tratar de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente em território nacional, ou contra a qual estiver em curso processo de extradição ou de expulsão.

Não estabelece o projecto a categoria dos crimes incaucionáveis —como se denominavam no direito anterior— nem de algum modo se impõe ao magistrado que tenha de decretar a prisão preventiva em alternativa a qualquer medida de liberdade provisória, como outrora soía designar-se.

Limita-se, relativamente a certas categorias de infracções — grosso modo aquelas que eram sancio-

nadas com a falada incaucionabilidade—, a estabelecer que o magistrado, no despacho sobre medidas de coacção que proferir, deva indicar os motivos que o tiveram levado a não aplicar ao arguido a medida de prisão preventiva, para que seja pensada a razão e motivado o raciocínio que levou à opção pela liberdade relativamente a crimes que, pela sua especial danosidade, o legislador deixa subentendido que seria de esperar que determinassem a prisão preventiva.

E de prazos de prisão convirá falar nesta sumária resenha, para análise daquilo que no projecto se contém em matéria de privação da liberdade.

Não eleva o projecto, em regra, além de dois anos a privação de liberdade sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado.

Abrem-se a esta norma algumas compreensíveis excepções.

Cobre a primeira certas categorias de crimes mais graves — aqueles relativamente aos quais o magistrado deve motivar a sua opção pelas medidas preventivas não detentivas—, para os quais se permite o máximo de prisão preventiva de 30 meses.

Admite-se que, verificando-se recurso para o Tribunal Constitucional, o máximo de dois anos mencionado seja elevado para dois anos e seis meses.

E prevê-se, sobretudo, que quaisquer prazos legalmente tarifados para a prisão preventiva fiquem suspensos em dois casos, sendo que no primeiro a suspensão não poderá exceder três meses: quando tiver sido ordenada perícia cujo resultado possa ser determinante, ou verificando-se doença do arguido que imponha internamento hospitalar, se a presença daquele for indispensável à continuação das investigações.

Confia o projecto na exequibilidade prática destas medidas para que as finalidades globais do sistema possam ser alcançadas.

E espera que eventuais abusos encontrem resposta adequada através do sistema que para tanto engendrou e no qual, ao lado dos tradicionais modos de impugnação da prisão ilegal, se perfila a possibilidade de indemnização por privação da liberdade ilegal ou injustificada.

Por tudo isso não faleceu legitimidade para, nesta matéria, haver restringido a um único grau de exame o recurso das medidas de liberdade admitidas e para haver dispensado a contraditoriedade que tem sido permitida por algumas reformas processuais penais estrangeiras e que aqui apenas é facultada quando da decisão sobre a prorrogação da prisão preventiva.

33 — Dotado de todos os princípios que ficaram equacionados, compreende-se que o processo penal desenhado no projecto tenha uma tramitação substancialmente diversa daquela que constitui o direito anteriormente vigente.

Variam naturalmente as coisas consoante a forma de processo concretamente em causa.

Vale quanto ao processo comum a totalidade das considerações anteriormente produzidas a propósito das fases processuais.

Constatado o crime —através do conhecimento oficioso das autoridades, da denúncia ou do auto de notícia —, efectuam-se as averiguações através de um inquérito dirigido pelo Ministério Público, que para o efeito dispõe —numa relação de dependência funcional— dos órgãdos de polícia criminal.