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7 DE FEVEREIRO DE 1987

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revela os percursos secretos dos aviões envolvidos no «Irangate» insista nas escalas em Lisboa e nos «intermediários» portugueses.

Com efeito, esta semana, o Washington Post noticiou que carregamentos de armas para os «contras» da Nicarágua terão partido de Portugal no princípio deste ano. A notícia não é nova: foi dada, em primeira mão, pelo New York Times e depois desenvolvida pelo Miami Herald, posteriormente, seria recuperada por outros jornais, nomeadamente o madrileno El Pais, que chaga a intitular: «Lisboa, ponto-chave no tráfico secreto para Teerão e América Central.»

A despeito destas notícias, ninguém, até agora, conseguiu provar os factos apontados. O nome de Portugal está envolvido no comércio legal de armas para o Irão e para a América Central, bem como no tráfico ilegal (julgamento de portugueses nos EUA, acusados de traficarem componentes de mísseis para o Irão), mas não foram reveladas, até ao momento, a composição e as características de uma eventual «Lisboa connection» do «Irangate».

De acordo com a formação do Washington Post, a Southern Air Transport, companhia aérea que já esteve ligada à CIA e ultimamente cumpre contratos com Angola e Cuba, transportando armamento soviético para Luanda, terá efectuado, no princípio deste ano, 15 voes a partir de Portugal e dos Estados Unidos para a base de Ilopango, na América Central, que tem servido de transbordo ao abastecimento dos «contras».

O Miami Herald adiantou, por seu turno, que as armas embarcadas em Lisboa, com destino aos «contras», eram soviéticas — o que implica a sua existência em stock no nosso País.

Fontes militares contactadas por O Jornal afirmam ser muito pouco credível a existência, em Portugal, de um stock significativo de armas soviéticas capaz de encher um cargueiro Boeing 707.

As mesmas fontes referem não ser, no entanto, impossível uma transacção deste tipo, envolvendo armas soviéticas. Só que, nesse caso, para a operação ser «legal», a reexportação teria de ser autorizada pelo Governo português. Ora, o Governo nega que tenha metido «foice em seara alheia», isto é, que tenha pactuado com a «operação Irão» e seus prolongamentos colaterais.

E se o negócio tivesse ocorrido secretamente —é claro— e à revelia das autoridades portuguesas? Ilegal...

Armas soviéticas

Fontes portuguesas relacionadas com a produção e venda de armas adiantaram ao jornal A Capital, há duas semanas atrás, que as únicas armas soviéticas existentes em Portugal são as capturadas durante as guerras coloniais. Mesmo assim, e segundo as mesmas fontes, alguns milhares dessas armas foram vendidas «a peso de ouro», há vários anos, a coleccionadores americanos.

Mas se elas foram vendidas é porque alguém as vendeu. Em Portugal?

Mais do que a importância dos locais em que se efectuaram as transacções, importa reter que negociantes portugueses de armas podem ter acesso a armamento soviético.

Sabe-se hoje que o regime colonial português se serviu de armas soviéticas e «adereços» do Leste para

operações secretas de inteligência militar junto do «inimigo».

Há cerca de um mês, aquando do aniversário da invasão portuguesa de Conacry — episódio da guerra colonial do qual só agora se começam a conhecer pormenores—, Guilherme Alpoim Calvão, que comandou as tropas de elite que tentaram destruir a sede do PAIGC na Guiné-Conaory, revelou na RTP que armas então utilizadas foram, exclusivamente, soviéticas, bem como uniformes e até caixas de fósforos.

Isto implica que Alpoim Calvão tivesse conhecimento de um ou mais entrepostos de venda de armas soviéticas, provavelmente na Europa, ou mesmo —o que é mais verosímil — num país árabe.

O comandante Alpoim Calvão, que após o 25 de Abril surgiu a liderar o então chamado Exército de Libertação de Portugal (ELP) — movimento armado, de direita, que afirmava lutar «contra a ameaça comunista», é hoje um nome respeitado nos entrepostos de armamento.

Apesar de conhecer mercados legais e ilegais de venda de armas, e apesar do seu visceral anticomunismo, não há indícios seguros que Alpoim Calvão esteja envolvido na questão da exportação de armas soviéticas para os «contras» nicaraguenses.

Guilherme Alpoim Calvão é hoje um homem de idade e ex-presidente de uma empresa prestigiada que trabalha para o Estado: a Extra — Explosivos da Trafaria. Quando ocupou este posto conseguiu o maior contrato legal de venda de armas para o Irão: 80 milhões de contos.

A sua mais recente intervenção política foi também «legal»: aconselhou o voto no antigo candidato presidencial Soares Carneiro.

As notícias divulgadas pela imprensa internacional sobre os carregamentos, em Lisboa, de armas soviéticas para os «contras» da Nicarágua chamou-nos a atenção para este homem «lendário», hoje quase esquecido.

Mas, eis que se ergue um muro de silêncio à volta de figuras que negoceiam em armas. Apesar de várias tentativas, desde há algumas semanas, para falarmos com o comandante Alpoim Calvão, a resposta é que «o senhor comandante não dá entrevistas».

Um colega de Alpoim Calvão diz-nos que «ele não tem nada a ver com isto», que «está retirado e cansado» e que, «coitado, até está a convalescer de dois enfartes do miocárdio».

O «Irangate» assustou, naturalmente, os mercados de venda de armas que operam com o Irão e a América Central. Outro nome importante no comércio português de armas é o de José João Zoio, proprietário da Norte Importadora, empresa que o falecido Mota Pinto, enquanto ministro da Defesa do anterior Governo, autorizou a vender armas à Junta Governativa da Nicarágua, posterior a Somoza e anterior ao governo de Daniel Ortega.

José Zoio recebe-nos com cortesia, mas encaminha--nos imediatamente para «o departamento competente»: as relações públicas da Norte Importadora. Aqui somos informados de que as «precauções» dos negociantes portugueses têm a ver como uma atitude de defesa lace à concorrência estrangeira.

Até que ponto são «inocentes» as suspeições que recaem sobre Portugal? A quem interessa a «incrimi-