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7 DE FEVEREIRO DE 1987

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A passagem por Lisboa do referido avião tem sido muito referida, nomeadamente nas audiências da comissão do Senado norte-americano que investiga o processo de fornecimento de armas ao Irão, que culminou, como se sabe, no já famoso caso «Irangate», enorme escândalo que se abateu sobre a Administração Reagan.

Um dos aspectos da questão refere-se ao caso português e à eventual utilização das nossas aerogares e do espaço aéreo nacional para o trânsito de tão incómodas mercadorias.

A versão oficial portuguesa, designadamente afirmada pelo Primeiro-Ministro, é que não foi dada autorização para que Lisboa servisse de plataforma para o envio dc armas para o Irão.

Entretanto, continuam a afluir informações de diversa proveniência sobre o caso das armas — negócio fabuloso, que nestes sete anos de guerra entre o Irão e o Iraque atingiu verbas inacreditáveis e que, segundo fontes árabes, já representou para Portugal um volume de transacções de 20 milhões de contos. Elas referem, em regra, o envolvimento de empresas portuguesas.

Assim, fontes citadas pela REUTER e identificadas com vendedores de armas e com meios da Defesa de Israel indicam que têm saído armas de Portugal com documentação que as destina à Grã-Bretanha, mas nunca chegam ao seu suposto destino, pois são transferidas no aeroporto de Lisboa de bordo de aviões de carga israelitas para outros sem marca, fretados para seguirem directamente para o Irão.

(Diário Popular, de 13-12-86)

EDITORIAL As armas

Uma investigação do Senado norte-americano, em Washington, a mais de 7000 km de Lisboa, informou os portugueses de que o nosso país é uma placa giratória no negócio de armas.

No processo para apuramento de responsabilidades da Administração Reagan num contrato de venda de armas ao Irão —reverso da medalha da política antiterrorista oficial e do financiamento dos «contras» da Nicarágua, ao arrepio da proibição do Congresso — apurou-se que subsiste e se renova uma ancestral vocação portuguesa para fazer do rectângulo um entreposto. A política de transporte, estudada por António Sérgio, caracteriza-nos em permanente actualização: dantes, as especiarias das índias, hoje, a droga e as armas.

Este negócio das armas é sabidamente dos mais sinistros, o que decorre da própria razão de ser das indústrias de guerra: ou alimentam os conflitos ou abrem falência. Considerações de ordem política ou humanitária sucumbem perante o imperativo do lucro, e nem sequer as empresas estatais da especialidade, que se diria estarem obrigadas a comportamentos condicionadores de puros objectivos comerciais, desafinam do conjunto da indústria mortífera.

Porém, quando os governos se cumpliciam com estas actividades desmorona-se a ilusão da inocência política ou impõe-se, dos acontecimentos, uma leitura

política. Do agora sucedido. extrai-se que o Governo dos EUA promoveu a venda de armas aos faustores do morticínio de americanos em Beirute e que os «contras» da Nicarágua combatem com armas soviéticas — notícia emparelhada com a reafirmação, pela URSS, do apoio ao Governo de Manágua. No primeiro caso, o Poder estado-unidense manobrou os trâmites; no segundo, tanto quanto a informação disponível permite concluir, são empresas privadas que em liberdade negoceiam, pondo de manifesto que a União Soviética lança ao mundo armas como outrora se lançavam crianças à roda; quem as adoptar chama-lhes suas.

Portugal não desdenha, pelos vistos, embrenhar-se neste tráfico. O ex-conselheiro nacional de Segurança do EUA, McFarlane, declarou perante o Senado que pelo nosso país passaram, em 1985, armas destinadas ao Irão e aos «contras» nicaraguenses, em aviões fretados pela CIA; o jornal Miami Herald assevera que as últimas eram soviéticas, compradas em Lisboa. No passado fim-de-semana fontes portuárias de Setúbal anunciaram a partida para Teerão de um carregamento de armas portuguesas num barco panamiano.

Que sabemos nós deste negócio, o qual envolve o País como placa giratória e a indústria estatal de armamentos? A substância da informação provém dos Estados Unidos, não do Governo português; e não consta que a Assembleia da República, a exemplo do Senado norte-americano, se empenhe decididamente em esclarecer e em esclarecer-nos. Ê certo que a opinião pública portuguesa não revela a saudável curiosidade de saber se este papel de intermediário que desempenhamos nos foi destinado ou por nós escolhido, mas os poderes públicos têm o dever de nos explicar se a moderna política de transporte é componente da nossa política externa ou se lavra à revelia dela, e porquê.

(Diário Popular, de 13-12-86)

Quatro perguntas a Cavaco

O comprometimento do Governo português nos negócios secretos de armas que neste momento abalam a Administração Reagan é muito mais grave do que inicialmente se supunha.

Quando pela primeira vez Portugal foi mencionado entre os países que forneciam armas ao Irão o Primeiro-Ministro cometeu um erro. Foi categórico nas suas declarações, tentando persuadir a opinião pública de que nada fora feito ilegalmente. Confirmou a venda de armamentos e munições à República chefiada pelo Khomeiny, mas apresentou essas transacções como legítimas no quadro do funcionamento da indústria bélica portuguesa.

Os factos mais graves foram ocultados.

Na semana passada começaram a chegar de Washington notícias reveladoras de cumplicidades do Governo Cavaco no «Irangate». Documentos da Secretaria de Estado dos Transportes dos EUA, divulgados pela imprensa norte-americana, esclareceram de uma vez por todas que parte das armas enviadas para os terroristas nicaraguenses foram embarcadas em Portugal. Ora, é sabido que o pivot do «Irangate» gira precisamente em torno do acordo secreto que regulamentou