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1S88-(12)

II SÉRIE — NÚMERO 82

ginària do Decreto-Lei n.° 372-A/75). Todavia, e tanto quanto se pode colher dos respectivos debates parlamentares (cf. as intervenções dos deputados Marcelo Curto e Mário Pinto, Diário da Assembleia Constituinte, n.° 48, já citado, pp. 1388 e 1389), foi expresso o entendimento de que, recusando-se embora os despedimentos por motivo atendível, neles não se consideravam incluídos os despedimentos colectivos (cf. também Monteiro Fernandes, ob. cit., p. 324).

E assim não podia deixar de ser, por força da sua natureza especial que, como já se viu, é inspirada por uma lógica própria e diversa da que está subjacente aos despedimentos individuais.

Entretanto, logo no mês de Janeiro seguinte, o Decreto-Lei n.° 84/76, em coerência com o sentido daquela votação, veio suprimir a «matéria respeitante ao despedimento por motivo atendível, [... ] em virtude de a prática ter demonstrado que o referido tipo de despedimentos se revelou inadequado à defesa da estabilidade do emprego».

Supressão essa não contrariada no Decreto-Lei n.° 841-C/76 e na Lei n.° 48/77, que ainda hoje disciplinam esta matéria. E as tentativas que em sentido diverso foram empreendidas acabaram sempre por se saldar em insucesso (cf. o texto da proposta de lei n.° 70/11, Diário da Assembleia da República, 2.' série, n.° 8, de 31 de Outubro de 1981).

Na revisão constitucional de 1982, a norma do artigo 52.°, alínea b), da versão originária, foi recebida pelo actual artigo 53.°, se bem que se operassem então duas significativas alterações.

De um lado, e no plano sistemático, o preceito passou a integrar o capítulo ih («Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores») do título n («Direitos, liberdades e garantias»), de outro lado, e no plano da materialidade normativa, a segurança no emprego deixou de ser entendida como incumbência do Estado, para passar a constituir um dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, o que não pode deixar de significar um acrescido reforço da segurança no emprego como expressão directa do direito ao trabalho, como, aliás, foi unanimemente reconhecido pelo plenário da Assembleia da República, aquando da aprovação do texto da revisão constitucional (cf. Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 104, de 18 de Junho de 1982).

4 — 0 espaço de interpretação, e agora se retoma a lição de Gomes Canotilho (cf. ob. cit., pp. 158 e 159), ou, talvez melhor, «o âmbito de liberdade de interpretação do aplicador-concretizador das normas constitucionais, tem também o texto da norma como limite: só os programas normativos que se considerem compatíveis com o texto da norma constitucional podem ser admitidos como resultados constitucionalmente aceitáveis derivados de interpretação do texto da norma».

Qual então o exacto programa normativo contido no preceito do artigo 53.° da Constituição?

O conceito de justa causa já era, à data da aprovação do texto constitucional, um conceito suficientemente densificado sob o ponto de vista jurídico--dogmático.

Na última fase da sua evolução, como se extraiu do percurso cujo desenvolvimento se acompanhou, aquele conceito era informado por dois elementos principais: 1) uma conduta culposa do trabalhador; 2) cuja gravidade e consequências constituam infracção disciplinar que não comporte a aplicação de outra sanção.

Representam estes dois elementos o seu núcleo essencial, independentemente das precipitações legislativas concretas que o mesmo pode assumir quanto aos contornos e elenco das factualidades susceptíveis de se candidatarem à sua subsunção (cf. as diferentes versões que o artigo 10.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 372-A/75 conheceu, por força da sucessiva redacção que lhe foi concedida pelos Decretos-Leis n.os 84/76 e 841-C/76 e Lei n.° 48/77).

Não definindo a Constituição o que sejam despedimentos sem justa causa cabe apurar se, aquando do recebimento do conceito, este foi acolhido com o sentido que lhe vinha sendo dado na ordem jurídica interna anterior, ou se, porventura, foi transformado o seu significado e sentido, isto é, o seu espaço semântico.

Tratando doutrinalmente do tema da determinação do âmbito dos conceitos pré-constitucionais, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.° vol., 2.a ed., p. 47, sustentam parecer evidente «que, quando a Constituição recebe um determinado conceito legal com um certo sentido, este fica, por assim dizer, 'constitucionalizado', deixando de estar à disposição do legislador. Por exemplo, se o conceito de 'pena maior' foi recebido na Constituição [cf. artigo 27.°, n.° 3, alínea a)] com um certo sentido, não pode a lei vir a alterar o conceito, de modo a modificar significativamente o sentido do preceito constitucional; se o conceito de 'justa causa de despedimento' foi acolhido na Constituição com um sentido rigorosamente delimitado, não pode a lei vir depois modificá-lo, por forma a fazer dizer ao preceito constitucional coisas substancialmente diferentes do que originariamente dizia».

E, no campo jurisprudencial, bem pode dizer-se que tem havido um entendimento similar ao assim exposto, como há-de extrair-se, além de outros, dos Acórdãos do T. Const. n.m 70/85, 131/86 e 328/86, Diário da República, 2.a série, de 1 de Junho de 1985, 13 de Agosto de 1986 e 16 de Fevereiro de 1987, nos quais se colocou a questão conceituai de pena maior, e onde se reconheceu estar vedado ao legislador «atribuir a essa pena um conceito substancialmente diferente do que lhe era dado pela legislação anterior», da qual, aquando da sua cons-titucionalização, foi recebido aquele conceito.

Como em qualquer outro conceito constitucional, existe, é certo, uma determinada margem de liberdade de configuração legislativa concreta de justa causa. O que o legislador não pode, porém, é transfigurar o conceito, de modo a fazer com que ele cubra dimensões essenciais e qualitativamente distintas daquelas que caracterizam a sua intenção jurídico-normativa.

Tendo presente tudo quanto se observou no plano de evolução do conceito de justa causa, deve afirmar--se que o seu alargamento a factos, situações ou circunstâncias objectivas de todo alheias a qualquer comportamento culposo do trabalhador não deixará de envolver a sua transmutação substancial.

Não importa agora determinar — questão que se deixa em aberto — se à proibição constitucional do despedimento sem justa causa corresponde, necessariamente, a exclusiva legitimidade constitucional do despedimento com justa causa, ou se, pelo contrário, ainda seria igualmente lícita a previsão de despedimentos fundados em causas objectivas não imputáveis a culpa do empregador que, em cada caso concreto, tornem praticamente impossível a subsistência da relação ào trabalho.